Emergência Climática e Urgência Ética: Aportes da Bioética Ambiental sobre o autocuidado coletivo e interdependência da vida

 

Seminário Bioética e a Libertação do Futuro

por Marta Luciane Fischer

 

A temática abordada na minha fala de hoje representa a complexidade, pluralidade e amplitude das questões relativas à Bioética Ambiental. A Dualidade entre ações e impactos locais x globais, saúde física x mental e responsabilidade individual x coletiva. A fala será dividida assim em três momentos: a) A contextualização da emergência Climática; b) A sinergia entre a Bioética ambiental, ODS e urgência ética; c) As dualidades analisadas sob a perspectiva do autocuidado.

 

 A contextualização da emergência Climática

 

As questões de mudanças climáticas representam um problema ambiental que pode apresentar percepções e respostas dissonantes. Embora as alterações climáticas sejam um processo natural e foram responsáveis pela rica biodiversidade que temos na atualidade, foram intensificadas diante da intervenção antrópica. Durante os 4,5 bilhões de anos do planeta Terra, foram inúmeros eventos de resfriamento e aquecimento global, que juntamente com os movimentos das placas tectônicas possibilitaram diferentes impactos de diferentes fenômenos naturais como estiagem e enchente, furacões, tornados, tsunamis e até mesmo o maior ou menor impacto de agentes externos como os meteoros. Foram cinco grandes eventos que promoveram a extinção de 95% da fauna e flora, mas que a cada ciclo de restauração permitiam o surgimento de novas espécies. Neste momento estamos vivendo o sexto grande evento de extinção, mas diferente dos anteriores, esse é ocasionado por uma única espécie, e o mais drástico, uma espécie que sabe o que está fazendo e as consequências que sua ação poderá trazer para todo o planeta. A ação antrópica frequente e cada vez mais intensa não dá tempo para recuperação da natureza. A substituição de áreas verdes por área construída e o acúmulo de resíduos e poluição do ar, solo e água, minam a possibilidade das maiorias das espécies se reestabelecerem e não promovem um ressurgimento da vida. Pelo contrário, espécies generalistas e altamente resistentes se beneficiam de ambientes sem predadores e competidores, aumentando suas populações e dominando os ambientes alterados. Algumas dessas espécies possuem potencial de danos também para os seres humanos ou seus bens, passando a serem classificadas como “pragas urbanas” ou “pragas agrícolas” e são alvo de interesse midiático e da indústria do “controle de pragas”.

Porém estamos falando aqui de uma terminologia “emergência climática” com um viés político muito forte, a terminologia “emergência climática” foi adotada pelo Parlamento Europeu em 28 de novembro de 2019, incitando tanto a Comissão como todas as Nações à adoção de medidas urgentes para reduzir GEI considerando que o enfrentamento das mudanças climáticas demanda uma solução global e participação ativa de todos os membros da sociedade, economia, indústria de forma equilibrada e sustentável (Gonzales, 2020).  Os bastidores desse novo marco trazem uma mobilização histórica e inusitada de jovens e crianças no mundo inteiro que faltavam suas aulas as sextas-feiras para pedirem que seu futuro não fosse comprometido por decisões pautadas exclusivamente em interesses econômicos. 

A líder uma adolescente sueca de 16 anos portadora de síndrome de Asperger Greta Thunberg merecedora do prêmio de personalidade do ano de 2019. Greta toda sexta-feira protestava na frente do parlamento. Embora o alerta de pesquisadores não seja recente, os resultados do relatório do IPCC em 2018 que o planeta ficará 1,5oc mais quente transpôs o meio científico e as perspectivas das ONGs e chegou até o espaço público graças a mobilização dos jovens que se mostraram intolerantes às justificativas e medidas ineficazes tomadas nos últimos 30 anos, mesmo com tantos acordos internacionais assinados nas grandes convenções  mundiais como a conferência de Estocolmo em 72, a Rio-92 ou Eco-92 com sua agenda 21, a COPI em 1995 em Berlin, a COP2 em Genebra em 1996, a COP3 em Kyoto em 1997, a Rio+10 em 2002, a COP8 em Curitiba em 2006, a Rio+20 em 2012 .  Os fenômenos climáticos estão ficando mais extremos exemplos atuais como ciclones em Moçambique, ciclones bombas no sul do Brasil, Tufão no Japão, Onda de calor recorde na Europa, Secas na América Central, Incêndios na Austrália, Califórnia, Amazônia, nuvem de gafanhoto. O movimento dos jovens tem sinalizado mudanças na estrutura política a partir da compreensão que o comprometimento com o meio ambiente irá impactar também nas relações comerciais. Os partidos verdes têm se pronunciado na Europa.  Na ocasião Greta previu que 2020 seria o ano da ação que entraríamos em uma nova década que definirá nosso futuro. Contudo, a pandemia trouxe um novo foco, mas não totalmente destituído dessa questão.  

A pandemia da Covid-19 pode ser inserida no contexto do antropoceno (Gonçalvez 2020), Era geológica que se inicia com a industrialização e se intensifica com a capacidade humana de interferir nos sistemas ecológicos, sendo as mudanças climáticas uma das principais consequências. Neste contexto as pandemias são mais eminentes tendo em vista a interferência na natureza e a movimentação pelo planeta. Lembrando que temos muitos sinais anteriores como Ebola, Sars, Mers, H1N1 que não cumpriram com a esperada pandemia, que vivemos atualmente. No caso da Covid-19 além da ação direta na promoção do vírus transpor do animal para humano devido os impactos do manejo, tem a susceptibilidade das pessoas ao vírus em decorrência das suas vulnerabilidades físicas decorrentes da alteração ambiental. E talvez o que de mais positivo o distanciamento social trouxe foi presenciarmos como alguns dias de diminuição da atividade humana no planeta foi possível constatar uma melhorar da qualidade do ar, da qualidade sonora, da qualidade da água bem ilustrada nos canais de Veneza, e dos animais selvagens que passaram a interagir com as cidades. Não fazer nada diante dessas evidências pode ser sim uma grande imoralidade!

   A sinergia entre a Bioética ambiental, ODS e urgência ética

O impacto da industrialização e da globalização nas mudanças climáticas tem sido alvo de debates e opiniões divergentes, mesmo diante das consequências óbvias. Claro que devemos considerar que a própria alteração ambiental e o crescimento desordenado das cidades diminuem a resiliência a esses fatores e intensificam os danos.  Nas últimas décadas personalidades que variaram de Algor a Greta mobilizou diferentes segmentos sociais a conclamarem por uma agenda comunitária global. As consequências das drásticas e intensas mudanças climáticas são difíceis se imputarem um culpado e uma vítima, todos assumimos os dois papéis e isso caracteriza a pauta da Bioética ambiental: mediar o diálogo entre os atores de uma questão complexa, global e plural. Os papeis de agente moral e paciente moral se alternam dependendo da perspectiva hierarquia em que se processa a esfera decisória, e justamente a multiplicidade de agentes morais subsidiados por valores e interesses próprios retroalimentam as vulnerabilidades em um ciclo contínuo de sofrimento moral. Essa concepção já percorre os corredores da academia há quase 50 anos. Na década de 1970 muito se discutiu sobre os excessos cometidos ao ambiente em nome da promoção da revolução industrial. O término das grandes Guerras deixou lacunas de tecnologia e processos de produção da indústria bélica que se voltaram para os bens de consumo munindo o capitalismo e tornando o foco da maioria das nações.  A Educação ambiental e a Bioética emergiram nessa época, justamente alertando ao mundo científico de que se algo não fosse feito, se novos valores, paradigmas, perspectivas não fossem incorporados a sobrevivência planetária seria severamente comprometida. Potter cunhou a terminologia Bioética como a ética da sobrevivência! O diálogo entre as ciências biomédicas e humanas em busca de valores comuns! Se por um lado essa perspectiva ambiental não se sustentou na Bioética (que acabou se fortalecendo no segmento médico), as práticas de educação ambiental foram prontamente incorporadas em grandes eventos e acordos internacionais e em diretrizes e políticas públicas, legislações foram construídas em prol da sustentabilidade. Na década de 2000 o mundo se mobiliza em um acordo internacional sendo instituídos 8 objetivos para serem alcançado em uma agenda até 2015. Contudo, a constatação que a ausência da perspectiva de sustentabilidade não promoveu alcançar as metas, foram propostos 17 novos objetivos que devem ser alcançados até 2030.  Esses objetivos são mais do que acordo entre nações, são posturas individuais que se alcançam com a educação e inclusão. O ponto mais notável é a redução das desigualdades entre as nações, povos e pessoas que não têm as mesmas oportunidades de superarem seus desafios.  Especificamente o Objetivo no 13 versa sobre a questão das mudanças climáticas, mas é necessário fazer a ressalva que serão impactados por outras demandas como a pobreza e desigualdades socais. Em 2018 a ação o Caminho do diálogo, que visa promover a conexão entre academia e ensino básico discutiu os ods e existe um capítulo especialmente para essa questão de Ana Laura Diniz Furlan, Fernanda Schneider e Lays Cherobim Parolin “Mudanças climáticas: Que climão, hein?” que recomendo!



A globalização, o rápido desenvolvimento tecnológico e o capitalismo imputaram nas sociedades problemas novos e desafiadores, pois não possuem referenciais biológicos ou morais para qual a decisão mais sensata. É justamente buscando remediar essa lacuna que a Bioética Ambiental se insere, na busca de ouvir o outro e confluir interesses e valores em prol de uma solução consensual e justa para todos. Nesse caminho a ferramenta é a comunicação, alteridade, solidariedade. A urgência ética está justamente na compreensão da necessidade de mudança de paradigma. Não é apenas compreender o problema e se sensibilizar com as consequências, mas compreender racionalmente e emotivamente como ator da questão e se posicionar criticamente com autonomia para que as mudanças ocorram.

A Urgência Ética é inserida no princípio da responsabilidade de Hans Jonas (valverde, 2017) e remete a mudanças de condutas que já não são optativas ou realidades de alguns grupos sociais, são sim emergenciais, condicionais para superação de um problema global. Ética pois remete a valores utilizados nas decisões (em todos os níveis hierárquicos) de como, por que e quanto consumir, diz respeito a sacrificar benefícios e interesses pessoais em prol de um bem-comum, de uma coletividade. Logo, demanda de uma mudança de paradigmas de toda uma sociedade, alcançado com somente com a reformulação em todos os níveis!

 

As dualidades analisadas sob a perspectiva do autocuidado

         

       Pode parecer estranho inserir o autocuidado nessa narrativa, uma vez que o mesmo é compreendido na perspectiva individual e física no gerenciamento das necessidades para manutenção do organismo biológico. Todos os seres vivos praticam o autocuidado, e a maturidade traz a expectativa de cada sujeito seja hábil de cuidar de si e do outro. Contudo, sabemos que da perspectiva da saúde global não há existência isolada, que a saúde depende de conexões entre corpo/mente/espirito  entre individuo/sociedade/ambiente, em escalas locais/globais e que cuidar de si é não atribuir essa responsabilidade pro outro, que cuidar do social é proporcionar para si e para o outro um ambiente social acolhedor, que cuidar do ambiente é proporcionar um ambiente saudável para todos aqueles que se conectam, tudo aquilo que Edwarda Wilson na teoria da biofilia, Capra na perspectiva da “teia da vida” e  atualmente Harari com as 21 lições para sec XXI que nos brinda com a reflexão de que a ausência de presença tem colocado o ser humano vulnerável. Nessa nova realidade ter clareza dos fatos, condutas e consequência é o poder. As pessoas estão preocupadas demais em resolver suas urgências pessoais. Harari observa as grandes forças que dão forma às sociedades em todo o mundo, e que provavelmente vão influenciar o futuro do planeta como um todo. Para o autor, a mudança climática pode estar muito além das preocupações de quem está em meio a uma emergência de vida ou morte, mas pode futuramente tornar as favelas de Mumbai inabitáveis, enviar novas e enormes levas de refugiados através do Mediterrâneo, e levar a uma crise mundial dos serviços de saúde. Mudar a perspectiva de valores, interesses e cuidados do individual para o coletivo é transpor de indivíduo para sujeito, o cidadão autônomo e protagonista e sabe das suas responsabilidades e gerencia as responsabilidades dos gestores nomeados para essa função, que liberta o futuro de uma tragédia anunciada ou de um sonho encantado, mas que vislumbra na ação comunitária, consciente, solidária, comprometida e presente a única forma de alcançar um futuro factível para todos. 


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Referências

 

GONZÁLEZ, Karla Zambrano. La Unión Europea ante la emergencia climática. Anuario Español de Derecho Internacional, v. 36, p. 429-447, 2020.

GONÇALVES, Verônica Korber. Covid-19 e a emergência climática: conexões e desafios. Le monde diplomatique Brasil. São Paulo, SP.(17 abr. 2020), online., 2020.

VALVERDE, Antonio. Hans Jonas e o princípio responsabilidade. Revista Dissertatio de Filosofia, p. 137-150, 2018.

https://www.crmpr.org.br/uploadAddress/O-Caminho-do-Dialogo-2[4100].pdf

 

ABORTO E BIOÉTICA: TIRE AS SANDÁLIAS



por Mário Antônio Sanches 


Retomo aqui o que é conhecido em Bioética: diante de uma gravidez fruto de estupro temos um conflito ético e para ele não há ótima solução, as soluções são sempre precárias e dolorosas. Há os que alardeiam que interromper tal gravidez é o certo a fazer, ignorando o valor e a dignidade do feto; outros afirmam que o certo é manter a vida das duas pessoas envolvidas a qualquer preço, ignorando totalmente a angústia que ser abusada pode significar e quão insuportável pode ser vivenciar uma gravidez imposta.

Como teólogo, ouço uma voz que soa 'tire as sandálias dos teus pés, pois o lugar é santo'. Sim a vida é santa, precisamos desnudar nossos pés para senti-la e andar lentamente para não a esmagar. É necessário sacar fora as botas das certezas, pois do alto de nossas firmes convicções podemos ferir quando precisávamos curar, podemos açoitar quando precisávamos acalentar.

Sem certezas, mas com reverência, passamos a palavra para quem vivencia o drama, para quem é vítima e precisa fazer algo para continuar sua saga. Só a mulher que foi abusada poderá dizer algo, só ela pode decidir. Ela não está onde gostaria, ela não optou por ser a vítima, isto lhe foi imposto. E as opções à sua frente é entre dor ou dor. Só ela pode dizer que dor ela tem condições de suportar.

Alguém disse que o direito brasileiro opta pela morte. Para este caso, eu digo que o direito é altivo, pois opta por respeitar a consciência da vítima e diz para a mulher: ‘não colocarei nas tuas costas fardos ainda mais pesados, escolha teu caminho e não serás punida’. Para certas coisas é necessário tomar posição: eu gosto de viver em um país onde uma mulher estuprada que aborta não é punida. Considero um absurdo imaginar que esta mulher mereceria prisão. É necessário desnudar nossos pés, caso contrário corremos o risco de sair do estábulo com nossas botas fétidas, direto para os tapetes brancos de um santuário e, ao invés de venerar, profanar o que é santo."


Entrevista com Itiberê Piaia Bernardi

 

Série Ensaios: Bioética Ambiental

Por Caroline de Barros Rodrigues 


A fim de compreender melhor sobre os morcegos e um pouco mais sobre sua possível relação com a transmissão do COVID-19, entrevistamos o biólogo mestre e doutor em ecologia e conservação e especialista em morcegos Itiberê Piaia Bernardi. Acompanhe a entrevista abaixo:

Qual a importância dos morcegos para o ecossistema?

- “A maior parte dos morcegos do mundo tem hábito alimentar insetívoro, então atuam intensamente no controle de populações de insetos. Algumas grandes colônias de morcegos consomem algumas toneladas de insetos por noite, consomem muitos insetos mesmo, inclusive várias mariposas que são de lagartas de pragas de lavoura. Alguns estados dos Estados Unidos que adotaram programas para conservação de morcegos insetívoros economizam por ano na casa de alguns bilhões de dólares usando menos defensores químicos, economizando com veneno. Sem contar que nós temos os morcegos frugívoros, que se alimentam de frutos e aí dispersam essas sementes longe da planta mãe, então atuam como plantadores de floresta, são regeneradores de área degradada. Temos os morcegos polinizadores (nectarívoros), só para a Amazônia brasileira por exemplo são conhecidas mais de 300 espécies de plantas que só são polinizadas por morcegos, dependem de morcegos nos seus ciclos reprodutivos. O caso mais emblemático de morcegos polinizadores seria no México, que é um morcego que está envolvido em um ciclo econômico muito importante no México que é a tequila. O agave, do qual é produzido a tequila só é polinizado por uma espécie de morcego beija flor, então se desaparecer esse morcego quebra um ciclo econômico gigantesco em volta da tequila.”

- “Os morcegos na América do Sul chegam a compor 50% da riqueza e da abundância de espécies de mamíferos nas comunidades, então são um componente muito grande em termos de biomassa e de serviços ecossistêmicos.”

Qual o impacto causado pela morte ou a redução da população de morcegos?

- “A perda da diversidade por si só já é um grande problema, perder espécies, uma espécie extinta não tem como ser trazida de volta, seu papel ecológico não tem como ser reposto, e a perda de dispersores de sementes, polinizadores e controladores de insetos pode trazer prejuízos econômicos incalculáveis. Na década de 70 um programa de controle da raiva de herbívoros e de controle de morcegos hematófagos muito mal conduzido no Caribe levou a uma crise econômica absurda porque acabaram com os polinizadores das espécies frutíferas produzidas pelo Caribe, então eles entraram em uma crise econômica muito grande porque perderam os polinizadores das plantas que produziam os frutos que mantem a economia do Caribe.”

Seriam os morcegos realmente os culpados pela transmissão do vírus?

- “Não, até o momento nenhum estudo comprovou que o novo coronavírus pertença a uma cepa oriunda de morcegos. Essa associação foi feita pelo seguinte: morcegos são naturalmente reservatórios de muitos vírus, só de alfa e beta coronavírus são mais ou menos 2700 conhecidos em morcegos. Os morcegos têm uma resistência absurda aos coronavírus. Eles também são reservatórios de outros tipos de vírus dos quais eles não são imunes, por exemplo o vírus rábico. Eles portam ainda vírus de hantavirose e uma serie de outro vírus, mas a prevalência desses vírus, tanto do alfa e beta coronavírus como desses outros vírus em morcegos é tão grande quanto em qualquer outro mamífero, então atribuir a culpa do coronavírus aos morcegos é um tanto quanto leviana visto que a análise do genoma do novo coronavírus com a análise do genoma de coronavírus de morcegos do gênero Hipposideros lá da China revelou uma similaridade de 96% (similaridade genômica). Nós temos mais de 98% da nossa genética compartilhada com chimpanzés, e quando você olha para um humano e para um chimpanzé você não diz que eles são iguais, então dizer que 96% de similaridade seja uma prova de que sim, o novo coronavírus veio dos morcegos é uma especulação. Suspeita-se que pode ter havido esse spillover, esse salto na barreira das espécies, mas as análises genéticas mostram que se foi de um morcego que saiu o coronavírus, isso deve ter acontecido entre 40 e 70 anos atrás e foi passando por diversas espécies até chegar ao coronavírus que causa o COVID-19.”


Mesmo se fossem, os morcegos do Peru e outras regiões carregariam o mesmo vírus?

- “Não. Os morcegos do Peru e os morcegos de vários outros lugares carregam vários tipos de coronavírus, mas não foi identificado esse coronavírus que causa o COVID em nenhuma espécie silvestre até agora. Não tem, o que há é especulação sobre o assunto, dado o fato de serem reservatórios naturais de muitos tipos de coronavírus.”

Fomos informados que o Ibama recentemente interrompeu as pesquisas com morcegos no Brasil. Isso é verdade? Caso seja, você poderia falar um pouco sobre o impacto causado por esta decisão?

- “Não, o Ibama não proibiu as atividades. Novas licenças solicitadas, novas autorizações de pesquisa vêm com uma observação de que o pesquisador só realizará a atividade de campo quando passar a pandemia, mas isso relacionado as normas de distanciamento social e de isolamento, e não necessariamente do trabalho com os morcegos. Então não há uma proibição para se trabalhar com morcegos, há uma recomendação de que o pesquisador respeite os órgãos de saúde no que diz respeito a quarentena, isolamento, não sair de casa e tal. A Sociedade Brasileira para o Estudo de Quirópteros lançou um protocolo de biossegurança e boas práticas durante a pandemia, instituindo então um protocolo de atividades, dizendo como deve ser feita a higienização dos equipamentos, o tipo de mascara com respiradores de nível P3 para agentes biológicos, a substituição de luvas e aventais, quais devem ser os procedimentos... mas são recomendações, não há nenhum dispositivo legal em relação a isso.”

- “A possível confusão gerada em relação ao Ibama ter proibido ou não é que o ICMBio, que é o órgão do governo responsável pelas unidades de conservação federais e alguns órgãos estaduais responsáveis por unidades de conservação como aqui no Paraná o Instituto Água e Terra, o ex IAP, fecharam as unidades de conservação por tempo indeterminado enquanto durar a pandemia. Então os projetos, TCC, dissertações de mestrado e teses de doutorado que são realizadas nessas áreas tiveram que ser interrompidas, mas essa foi a interrupção, não foi a interrupção em relação ao trabalho com morcegos, foi o fechamento das unidades de conservação.”

Comentários adicionais do entrevistado:

- “Para complementar, não é só no Peru que iniciou uma morte indiscriminada de morcegos. Nós temos fortes evidências de que muitas colônias mesmo dentro de Curitiba passaram a ser desalojadas de maneira inadequada. Existem métodos para desalojar morcegos de residências. Morcegos são protegidos por lei, são fauna silvestre. Empresas de dedetização, desratização e tal não podem, são proibidas de fazer remoção de morcegos. A gente acompanha os dados da secretaria de saúde, que recebe morcegos doentes que acabam adentrando residências ou são encontrados em comportamento atípico. Um morcego encontrado durante o dia pendurado em um muro não é um comportamento típico então já se suspeita que esteja doente. É super comum surgirem morcegos doentes, morcegos que são positivos para o vírus rábico ou para doenças até que a gente nem conhece ainda, mas esse ano especialmente aumentou muito o numero de morcegos recebidos na saúde, morcegos saudáveis, que entraram nas residências ou que foram desalojados de seus abrigos de maneira incorreta, então acabaram se perdendo e foram parar dentro de residências. Isso é uma forte evidencia de que não só no Peru mas provavelmente no mundo todo os morcegos estão sendo mortos de uma maneira indiscriminada, e isso é um prejuízo muito grande porque, veja bem, são quase 3000 tipos de coronavírus que os morcegos carregam, e eles não são afetados por esses coronavírus, então estudar as capacidades, as condições de imunidade desses morcegos pode nos dar grandes pistas no rumo de uma vacina ou de uma medicação. Ao contrário de se exterminar os morcegos deveria se dar mais atenção, e usá-los como modelo de alguém que possui muitos tipos de coronavírus e não é afetado. Isso pode ajudar a compreender a nossa biologia e as nossas reações biológicas em relação ao coronavírus.”


Entrevista realizada via WhatsApp no dia 12/08.

Uso de imagem e publicação da entrevista autorizados pelo entrevistado.

Medo gerado pelo COVID-19 passa a prejudicar a sobrevivência de morcegos da região do Peru

 Série Ensaios: Bioética Ambienta

 Por Caroline de Barros Rodrigues

Graduanda de Biologia


Os morcegos peruanos têm grande importância ecológica, sendo destacado seu papel na preservação dos parques e controle de pragas da agricultura. Mesmo com tal função, diversos casos de morcegos sendo mortos por pessoas no Peru tem sido reportados, como é retratado no artigo publicado pela ISTOÉ. Moradores tomaram tais atitudes com objetivo de controlar a transmissão do vírus SARS-Cov-2, e acreditam que estes pequenos mamíferos tenham ligação direta com o ocorrido.


Após a repercussão de que o novo coronavírus possa ser uma mutação de um vírus encontrado em morcegos da região de Wuhan, na China, a consequente associação dos morcegos locais com a dissipação do vírus resultou em certo estigma em torno dos Chiroptera. Podendo carregar diversas cepas de coronavírus e apresentando alta resistência aos mesmos, além de sua associação com a transmissão do SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave) e MERS (Síndrome Respiratória do Oriente Médio), foram rapidamente linkados a nova pandemia. Os morcegos são considerados uma iguaria chinesa e são frequentemente comercializados e consumidos pela população local, fator que poderia ter desencadeado a propagação do vírus.

Além dos morcegos, outros animais foram associados a possível transmissão do COVID-19, estando entre eles o Pangolim, considerado o animal mais traficado do mundo e em alto risco de extinção, estando na red list da IUCN (CR). Como relatado pelo artigo da ISTOÉ, mesmo que o vírus mutado seja advindo de morcegos, as espécies existentes no Peru provavelmente não apresentariam a mesma mutação, não sendo considerados vetores, como retratado pelos especialistas do Serviço Nacional de Florestas e Fauna Silvestre do Peru. O Doutor em ecologia e especialista em quirópteros Itiberê Piaia Bernardi foi entrevistado (entrevista na íntegra aqui )para nos ajudar a entender mais sobre o assunto, afirmando que mesmo que diversos coronavírus possam ser encontrados em morcegos, o SARS-Cov-2 ainda não foi detectado em espécies silvestres, sendo que até o momento são existentes somente especulações ao redor do tema. Pelo risco causado aos animais do local, as autoridades afirmaram a retirada de mais de 200 morcegos da região, temendo que moradores viessem a tomar atitudes antiéticas, prejudicando os animais. Embora a rápida dissipação e gravidade da pandemia atual tenha trazido consigo uma onda de novas preocupações, é importante lembrar que a sua causa e origem não é comprovada.
A principal espécie relacionada a dispersão do SARS-Cov-2 é a Rhinolophus ferrumequinum, popularmente conhecida como morcego-de-ferradura-grande chinês. Estes animais noturnos apresentam hábito sedentário e são insetívoros, podendo chegar a 35 cm de comprimento. Embora sejam frequentemente associados a ataques e até mesmo a vampiros, a maior parte destes mamíferos voadores são frugívoros ou insetívoros. Como afirmado pelo especialista Itiberê P. Bernardi, a maior parte dos morcegos são insetívoros, os quais podem consumir larvas e lagartas de pragas da agricultura, trazendo benefícios a produção e evitando ou reduzindo o uso de inseticidas e químicos. No mundo todo, são encontradas mais de 1400 espécies de morcegos (182 no Brasil), sendo apenas três delas hematófagas (Desmodus rotundus, Diaemus youngi, Diphylla ecaudata), as quais obtém sua principal fonte de nutrientes pelo sangue, e da mesma forma não atacam o ser humano com frequência. Morcegos são animais de grande importância ecológica, sendo polinizadores, dispersores de sementes, atuando no controle de pragas, e tendo suas fezes como ricos fertilizantes. Além disso, morcegos nectarívoros contribuem largamente para a polinização de florestas, onde algumas plantas dependem exclusivamente destes animais para sua reprodução, como explica o Dr. Itiberê Piaia Bernardi.
Os morcegos são vítimas de ataques frequentes, causados principalmente pelo medo e desinformação. Embora sua aparência seja um pouco peculiar, são animais muito interessantes, e apresentam alta capacidade de adaptação. A crescente invasão de florestas e crescimento dos grandes centros levam a redução do hábitat de diversos animais, entre os quais se incluem os Quirópteros. Pela diminuição de áreas verdes, ocorre também a queda de fontes alimentares para tais mamíferos, que muitas vezes buscam alimento e abrigo nas cidades, ficando cada vez mais próximos aos seres humanos. No caso de morcegos hematófagos, estes podem passar a predar bovinos e pequenos animais em fazendas, porém, a pequena quantia consumida não causa impacto significativo na pecuária. A redução das populações de morcegos afetaria a biodiversidade, sendo o papel ecológico destes animais insubstituível, trazendo consigo ainda um imenso prejuízo econômico. Morcegos frugívoros atuam ainda na regeneração de áreas degradadas, sendo nossos aliados na conservação das florestas – Itiberê P. Bernardi.
Após analisar tudo o que estes pequenos mamíferos trazem de benefício, e o grande impacto que as metrópoles têm em seu modo de vida, é importante ressaltar que podem contribuem também para regularizar o clima, além de entende-lo, e que, por todos estes motivos devem ser protegidos, e não atacados.

A partir da necessidade de novos cuidados por conta da pandemia, foram adotadas novas medidas quanto as pesquisas de quirópteros, aonde é recomendada a prática de todas as medidas preventivas básicas, como o isolamento social, sendo aconselhado que novas pesquisas sejam iniciadas somente após o encerramento da quarentena. Visando a segurança dos pesquisadores foi publicado um protocolo pela Sociedade Brasileira para o Estudo de Quirópteros, o qual estabelece ações e providências a serem executadas em campo.
O ataque aos quirópteros não tem ocorrido somente no Peru, mas provavelmente no mundo todo, como afirma o Dr. Itibere Bernardi. O especialista ressalta que os mamíferos voadores são protegidos por lei, e que tem grande importância também para a área da saúde, já que a partir do estudo de seu sistema imune poderíamos conhecer e combater diferentes patógenos.
A morte dos morcegos faz parte de um conflito ético, ferindo a ética ambiental e animal e indo contra as próprias leis peruanas, as quais prezam pela conservação e proteção da vida animal, e condena qualquer ato que vá contra o bem estar e proteção destes, incluindo os animais silvestres. A “Ley de Protección y Bienestar Animal” ainda prevê que é um dever do cidadão zelar pelos animais, qualquer seja sua espécie, e evitar ao máximo que estes sejam feridos, sofram, sejam maltratados ou mortos.
Eu como estudante de Ciências Biológicas acredito que o ato praticado por tais cidadãos peruanos, além de prejudicar radicalmente os animais, acaba por afetar também o homem. Reduzir a população de morcegos na área poderia trazer grandes consequências para a economia local e agricultura, além de danos inestimáveis para o ecossistema.

O presente ensaio foi elaborado para o estágio em Bioética, tendo como base as obras:

ISTO É. Moradores no Peru estão matando morcegos por medo do coronavírus. 26 mar. 2020. Disponível em: https://istoe.com.br/moradores-no-peru-estao-matando-morcegos-por-medo-do-novo-coronavirus/. Acesso em: 10 ago. 2020.
POL, André et al. Morcegos do Brasil. Disponível em: http://morcegosdobrasil.blogspot.com/. Acesso em: 10 ago. 2020.
SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O ESTUDO DE QUIRÓPTEROS. Morcegos. Disponível em: https://www.sbeq.net/morcegos. Acesso em: 10 ago. 2020.
SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O ESTUDO DE QUIRÓPTEROS. Notícias. Disponível em: https://www.sbeq.net/noticias. Acesso em: 10 ago. 2020.

Estudos sustentam diferentes hipóteses a fim de identificar a origem da Covid-19.

 

Série Ensaios: Bioética

Por: Jaqueline Kliemke Carneiro

Graduanda em Ciências Biológicas.

Uma notícia divulgada no site de jornalismo online Olhar Digital no dia 3 de março de 2020 “Estudo sugere que coronavírus pode estar nos humanos há anos.”, traz como principais pontos de abordagem os estudos e as principais hipóteses de origem e transmissão do vírus para humanos com foco principalmente em objetivos biocêntricos e ambientais ao tentar compreender a atuação e importância de cada espécie envolvida na origem do vírus. Assim como foi possível também constatar um conflito ético presente em diferentes cenários propostos e como estes podem afetar o paciente moral e vulnerável em relação ao agente moral.

A origem do novo coronavírus (Covid-19), propagada entre humanos, causa muitas dúvidas e incertezas. Neste âmbito os estudos científicos entram com o objetivo de solucionar e compreender a fonte originária do vírus apresentando diferentes hipóteses, como a possível origem em animais ou a mutação do vírus já em humanos. No início da pandemia teorias apontavam a possibilidade do vírus corona ter sido manipulado e eventualmente originado o Sars-CoV-2 em laboratório. No entanto em um artigo publicado na Nature Medicine, um jornal de pesquisa biomédica, foi assegurado à improbabilidade de uma criação artificial do vírus ao mostrar fortes evidências que sua evolução ocorreu de forma natural. O estudo foi realizado por um grupo de pesquisadores Andersen et al. (2020) e a hipótese que trata da possível origem do vírus em animais trás indícios que teria ocorrido à seleção natural de um hospedeiro antes de ocorrer à transmissão zoonótica. Sendo assim foram analisados quais animais poderiam carregar o vírus como um reservatório, os morcegos e o pangolim-malaio, presentes no comercio e mercado local de Huanan (denominado marco zero da pandemia), exibiram a presença de um tipo de Sars-CoV com muitas similaridades ao Sars-CoV-2 efetivo em humanos. No entanto apesar das grandes semelhanças o vírus hospedado sugere ainda que não seria capaz de ligar-se de forma eficiente a humanos pela ausência de uma proteína otimizada para a ligação, que provavelmente foi adquirida a partir de uma mutação e seleção natural. A segunda hipótese, também por Andersen et al. (2020), aborda a transferência zoonótica após a seleção natural já em humanos, nesta possibilidade teria ocorrido uma transmissão inofensiva não detectada entre pessoas, assim o vírus seria capaz de adquirir novos potenciais gênicos. Então, como resultado de mudanças evolutivas graduais ao longo de anos ou talvez décadas, o vírus eventualmente ganhou a capacidade de se espalhar de pessoa para pessoa e causar doenças graves, e muitas vezes fatais (COLLINS, 2020).


O principal conflito ético identificado durante as análises foi originado pelas decisões do próprio Agente moral a partir de valores pessoais ocasionando consequências ao Paciente moral e Vulneráveis; o consumo alimentar de animais exóticos por agentes leigos às suas consequências pode ter auxiliado a transmissão do vírus entre humanos assim causando um grande estopim de efeitos (Pandemia da Covid-19) causando efeitos negativos aos vulneráveis à decisão como o meio ambiente, a saúde pública, a economia geral e as pessoas que precisam enfrentar as complicações do vírus.

A importância do estudo e da pesquisa de origem da doença em humanos possui grandes vantagens e valores políticos que estão atrelados à formação das hipóteses com objetivo de compreender melhor o vírus e como suas características de evolução e comportamentos infecciosos a fim de controlar de maneira mais eficiente esta e futuras possíveis pandemias que atinjam os seres humanos. Novos estudos estão surgindo e ganhando destaque a cada nova informação e circunstância descoberta sobre o vírus; uma análise feita por pesquisadores de pelo menos quatro diferentes países apresentou que a cronologia e data de inicio da infeção do vírus ainda não pôde ser definida “Ainda não esta claro como e quando o vírus Sars-CoV-2 passou infectar a espécie humana.” esta afirmação se deu após a descoberta de casos de Covid-19 registrados meses antes das primeiras explosões localizadas, sendo o primeiro caso identificado em um idoso de Wuhan, mas que não havia nenhuma ligação com o Mercado Publico local, e o primeiro caso de Covid-19 no Brasil onde um homem de 61 anos que retornava da Itália registrou o caso entre 19 e 25 de janeiro. E ainda em estudos mais recentes divulgados pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) foram detectadas a presença do vírus em amostras coletadas nos esgotos de Florianópolis ainda em novembro de 2019, publicado como “SARS-CoV-2 in human sewage in Santa Catalina, Brazil, November 2019” o estudo foi baseado em coletas realizadas entre outubro de 2019 a março de 2020; As amostras do final de outubro até o inicio de novembro não apresentaram vestígios do Sars-CoV-2, no entanto na data do dia 27 de novembro os primeiros traços do vírus foram detectados, e a partir de então as quantidades só aumentaram nas analises seguintes feitas com base nas amostras de dezembro, fevereiro e março. A presença do vírus no sistema de esgoto de Santa Catarina, dois meses antes do primeiro caso de Covid-19 ser confirmado no Brasil, abre muita discussão e alerta sobre a presença e circulação do vírus antes mesmo do conhecimento sobre ele, principalmente pela excreção do vírus acontecer em pacientes com 15 a 20 dias de infecção, e apesar da importante descoberta segue ainda a incógnita de quando exatamente o vírus manifestou-se nos países, desde quando esta ocorrendo à infecção por ele sem dados e qual sua principal origem.
Eu como graduanda em Ciências Biológicas acredito que em tempos de pandemia com milhares de números de óbitos e casos confirmados a pesquisa não pode ser parada nem descartada, mas sim extremamente valorizada, pois os benefícios presentes na pesquisa científica trazem inúmeros esclarecimentos que são capazes de auxiliar na produção de recursos médicos, de tratamento e apresentar resultados para melhores soluções e desenvolvimento futuro, nos tornando cada vez mais preparados para cenários como este. E cada novo estudo realizado é um passo mais próximo de responder diversas questões como a própria origem de determinadas doenças e como nós e todas as outras espécies possuímos a capacidade de impactar um ao outro ao decorrer de nossas vidas.



O presente ensaio foi elaborado para o estágio em Bioética, tendo como base as obras:

ANDERSEN, Kristian et al. The proximal origin of SARS-CoV-2. Nature Medicine, 17 mar. 2020.

PETRA, Guilherme. Estudo sugere que coronavírus pode estar nos humanos há anos: nocivo às pessoa. Olhar Digital, 30 mar. 2020.

Ministério da Saúde. O que é COVID-19. Gov.br,. 2020.

Jornal da Usp. A origem do Sars-CoV-2. Pfarma.com.br, 16 abr. 2020.

PINHEIRO, Dr. Pedro. Zoonoses – Doenças Transmitidas Por Animais. Mdsaude, 10 Maio 2020.

Época. MARCO ZERO DE CORONAVÍRUS PODE SER MERCADO QUE VENDIA COBRAS E RATOS: Centro comercial de alimentos, que oferecia animais selvagens na cidade de Wuhan, está sob investigação das autoridades chinesas. Época, 23 jan. 2020.

COLLINS, Dr. Francis. Genomic Study Points to Natural Origin of COVID-19. NIH Director's Blog, 26 mar. 2020.

MAGENTA, Matheus. Coronavírus em esgoto de 4 países antes de surto na China aumenta mistério sobre origem do vírus. BBC News Brasil, 9 jul. 2020.

FRAZÃO, Felipe; VARGAS, Mateus. Homem que voltou da Itália para SP é o 1º caso de coronavírus no Brasil. UOL, 26 fev. 2020.

FONGARO, Gislaine. SARS-CoV-2 in human sewage in Santa Catalina, Brazil, November 2019. MedRxiv, 26 jun. 2020.

Você sabe como está a situação dos pets na pandemia?


Série Ensaios: Bioética Ambiental 

Por Andressa Cordeiro Riceto. 
Graduanda de Biologia 



O Blog Canal do Pet veiculou a notícia: “Jovem salva animais deixados para trás na quarentena em Wuhan”, que foi publicada no dia 03/04/2020 e retrata sobre casos de abandono de pets durante a pandemia.

A pandemia do COVID-19 revelou que há diferentes perspectivas em que os animais estão inseridos quando estão em convívio com o ser humano. Dessa forma, é possível verificar condições prejudiciais a esses seres vivos tão dependentes, gerando um aumento no abandono dos animais de estimação. No entanto, também foi possível visualizar que os pets também estão envolvidos em condições benéficas, como por exemplo, os pets servindo de companhia nesse período de isolamento, além de situações em que são usados como cães de serviço como terapeutas ou agentes tranquilizantes aos médicos ou pessoas doentes e, por último, foi observado uma situação em que os pets foram salvos a beira da morte durante a quarentena.

Sabe-se que o convívio do homem com os animais já existe a um bom tempo, principalmente com os animais de estimação, como por exemplo, cães e gatos, estes estão presentes no cotidiano do ser humano propiciando companhia e descontração (LAMPERT, 2014). Por isso, os pets estão sendo agentes importante para muitas pessoas, diminuindo a solidão além de ser um passatempo nessa fase de isolamento e distanciamento em que a maioria das pessoas está passando boa parte do tempo em casa.

Além disso, os animais estimulam positivamente na saúde mental através da capacidade de transformar um ambiente conturbado em um momento tranquilizante, proporcionando auxílio para pessoas em tratamentos na área médica, por exemplo, como cooterapeutas ou em procedimento médicos (LAMPERT, 2014). No contexto clínico, recentemente, surgiram estão estudos para utilizar cães farejadores para detectar a presença do COVID-19 em pessoas infectadas, procedimento que já é utilizado para a detecção de outras doenças tais como a Malária e o Câncer de próstata. A pesquisa ainda está análise para comprovar a eficácia e iniciar os treinamentos dos cães, no entanto, tudo indica que será um método rápido podendo detectar qualquer pessoa que esteja com o vírus presente no organismo. Além disso, a notícia: Labrador leva conforto para médicos durante combate ao corona vírus relata que um cachorro está levando um pouco de alegria e descontração para os médicos que estão na linha de frente no combate ao COVID-19, demonstrando que os cães podem auxiliar nesse momento de tensão, dando apoio emocional aos humanos. Nesse sentido, a comunicação homem-animal cria um vínculo afetivo, proporcionando o bem-estar e leveza no ambiente e dia-a-dia das pessoas e do animal em diferentes situações.

No entanto, situações fora de controle geram um desequilíbrio nessa relação humano-animal, causando condições negativas (maléficas) aos vulneráveis, que neste caso, são os animais domésticos, como por exemplo, o abandono de pets devido a diferentes motivos. Nesta perspectiva, como relatado na notícia: Jovem salva animais deixados para trás na quarentena em Wuhan a pandemia de COVID-19 gerou uma situação inusitada em que pessoas da cidade Wuhan, na China precisaram sair de suas casas por motivos de evacuação, evitando a disseminação do vírus ou até mesmo por estarem internadas em hospitais devido ao contágio com a doença. Essa circunstância ocasionou uma situação prejudicial aos animais de estimação, pois com os donos fora de casa os pets foram abandonados em suas casas passando por situações de fome, adoecimento e descuidado.

Contudo, para amenizar essa situação de abandono um jovem oferece-se voluntariamente a se deslocar até as residências para alimentar e realizar cuidados de higiene e dar um pouco de carinho aos animais que estavam perecendo, como uma atitude de cuidado e ética com esses seres que são tão inerentes ao homem atualmente. Segundo BARATELA (2014), no biocentrismo o homem deixa de ser o centro do Universo ao se deparar com limites ao utilizar os outros seres vivos. Assim, o biocentrismo desenvolveu-se a partir do conceito da ética da vida, na qual todo ser vivo, animal ou vegetal, está incluído(NOGUEIRA, 2012 apud BARATELA, 2014). Portanto, ao realizar essa atitude, o jovem aplicou o conceito biocêntrico arriscando sua vida, expondo-se ao vírus para cuidar dos animais vulneráveis nesse período de isolamento social.

Eu como estudante de biologia e estagiária do grupo de bioética ambiental creio que situações pandêmicas como a que estamos vivendo geram diversas situações maléficas, porém, ao contrário do que se pensa, também é possível observar situações positivas para ambos os lados na relação humano-animal, em que os animais são extremamente essenciais para vida humana, auxiliando os em momentos difíceis de desgaste mental, demonstrando que o convívio com os pets proporciona o bem-estar e descontração à vida humana e que também os humanos são fundamentais para o bem estar dos animais, pois estes são dependentes de nós para sobreviver.

O presente ensaio foi elaborado para o estágio em Bioética, tendo como base as obras:

BARATELA, Daiane Fernandes. Ética Ambiental e proteção do Direito dos Animais. Ética Animal, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 73-93, jul. 2014. Disponível em: https://cienciasmedicasbiologicas.ufba.br/index.php/RBDA/article/viewFile/12119/8661. Acesso em: 08 ago. 2020.

ET, Canal do (org.). Jovem salva animais deixados para trás na quarentena. Disponível em: Jovem salva animais deixados para trás na quarentena em Wuhan Fonte: https://canaldopet.ig.com.br/curiosidades/especiais/2020-04-03/jovem-salva-animais-deixados-para-tras-na-quarentena-em-wuhan.html. Acesso em: 08 ago. 2020.

FRAGMAQ (org.). Entenda o que é biocentrismo e a importância do conceito para o futuro do planeta. Disponível em: https://www.fragmaq.com.br/blog/entenda-biocentrismo-importancia-conceito-futuro-planeta/. Acesso em: 08 ago. 2020.

LAMPERT, Manoela. Benefícios da relação homem-animal. 2014. 24 f. TCC (Graduação) - Curso de Medicina Veterinária, Veterinária, Ufrg, Porto Alegre, 2014. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/104881. Acesso em: 08 ago. 2020.

VOGUE, Redação (org.). Labrador leva conforto para médicos durante combate ao coronavírus. Disponível em: https://vogue.globo.com/atualidades/noticia/2020/03/labrador-leva-conforto-para-medicos-durante-combate-ao-coronavirus.html. Acesso em: 08 ago. 2020.

A relação de convivência entre pets e tutores durante a pandemia de COVID-19

 

Série Ensaios: Bioética Ambiental

 

Por: Helena Coentro Wohlke

Graduanda em Ciências biológicas

 

            A BBB Brasil pulicou uma matéria sobre a  'epidemia de abandono' dos animais de estimação na crise do coronavírus alertando que se por um lado a pandemia de coronavírus mudou a paisagem urbana das grandes cidades, deixando ruas de todo o país vazias, por outro aumentou o número de animais domésticos abandonados.

 

            A interação do homem com outras espécies de animais é relatada desde a pré história, inicialmente tratando-se da predação e, com o passar do tempo, desenvolvendo-se então a domesticação. Atualmente é comum a todas as culturas a criação de animais de companhia, visto que esta relação é conhecida por, além de ser fonte de apego e afeição, facilitar algumas ações da vida humana como pastoreio, caça, guarda, investigações policiais e prestação de auxílio a deficientes visuais.

           


Durante a pandemia do novo coronavírus em 2020 o isolamento social tornou-se uma necessidade, fazendo com que as pessoas passassem mais tempo do que o normal dentro de suas casas, o que intensifica a sensação de stress, ansiedade, exaustão emocional e tristeza. A interação com um animais de estimação, entretanto, contribui para a redução dos nível de cortisol no organismo e aumento da a liberação de ocitocina e endorfina, o que resulta no aumento do sentimento de bem-estar e disposição. Por esse motivo algumas organizações de amparo e proteção animal, que trabalham recolhendo e promovendo a adoção de animais de rua, registraram aumento no número de adoções durante este período, demonstrando que os animais domésticos tem sido um refúgio em meio ao afastamento.

            Infelizmente este não tem sido o cenário em todas as situações, já que ao mesmo tempo em que alguns animais têm encontrado novos lares e famílias, outros tiveram que enfrentar um destino muito mais doloroso: a negligência. A confirmação pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária do aumento de casos em que famílias se desfazem de seus animais condiz com as circunstâncias atuais de muitos abrigos em todo o Brasil, que se encontram muitas vezes lotados, sem condições de suportar a alta demanda causada pelo abandono.

           

Outra situação a ser notada é que, com a volta da normalidade em alguns países, tutores que inicialmente adotaram os animais a fim de amenizar o sentimento de solidão, agora estão “devolvendo” seus pets por motivos diversos. É possível que a motivação inicial das adoções tenha sido a busca por uma razão para sair de casa, já que os animais, principalmente cães, necessitam de contato regular com o mundo externo, feito por meio de passeios frequentes. Após o afrouxamento da quarentena em outros países, a rotina de cuidados somada às demais responsabilidades fez com que os tutores começassem a notar que animais de estimação requerem cuidados específicos, tanto por parte da atenção e dedicação de seus donos, como um investimento financeiro, já que independente da espécie, todo animal exige uma manutenção regular por alguns anos. No Brasil, estima-se que o gasto mensal com um cão de porte médio seja de aproximadamente R$300,00, incluindo alimentação, higiene, médico veterinário, entre outros. Tal fato, somado ao aumento das taxas de desemprego no país, fez com que a posse de um animal de estimação não fosse considerada uma prioridade em muitos lares.

            No início da pandemia de COVID-19 pouco se sabia sobre a transmissão da doença, e essa falta de informações afetou também a relação de convivência entre pets e tutores. Em países mais afetados, como a China, por exemplo, além do abandono e devolução, também foram registrados casos mais graves, onde a morte intencional de animais (tanto de rua, quanto aqueles que moravam com seus donos) foi utilizada como resposta ao medo da contaminação.

            É difícil julgar o comportamento humano à luz da ética em situações tão adversas como o surgimento de uma pandemia, se por um lado temor e a falta de informações levam às pessoas a atos extremos em nome da preservação de suas vidas e de outros familiares (muitos convivendo com indivíduos pertencentes ao grupo de risco), acreditando que a melhor escolha seria “se livrar” dos animais, por outro o valor à vida de cães e gatos é drasticamente reduzido, fazendo com que todas as partes positivas da relação entre estes e os humanos seja deixada de lado, se tornando apenas uma questão de controle de vetores. Há ainda as situações do “empréstimo” de pets, ou seja, as adoções seguidas por devolução, que são extremamente prejudiciais, visto que já existem pesquisas que apontam a resposta positiva dos cachorros quanto ao contato com pessoas, descrevendo que as áreas ativadas no cérebro dos animais são semelhantes às do amor em humanos.

           

Como estudante de biologia, acredito que o cenário originado após a pandemia demonstra a importância da divulgação do conhecimento científico já que, em muitos casos, o pânico e falta de informações confiáveis foi o principal motivo do descarte. Além disso também é necessária uma conscientização geral da população, para que animais não sejam tratados como objetos de pouco valor, e sim como seres que sentem afeto, precisam de atenção, responsabilidade e não devem ser descartados quando não são mais “convenientes”.