O pedido de socorro dos Ipês

 Série Ensaios: Bioética Ambiental

Por Mariana Grassi

Docente da Escola de Ciências da Vida/PUCPR



Respostas da natureza: as respostas estão na nossa cara e ninguém está vendo

Hoje choveu..., mas não adiantou

Uma chuva apenas, um dia de sol, algumas horas de luz: isso não basta

Para as plantas o ciclo é outro, a espera é outra, e é demorada

 

Para florescer, o ciclo pode levar um ano e dentro desse período tudo é organizado para que as folhas, que são a fonte, enviem tudo o que conseguiram produzir para as flores e frutos, que são drenos.

 Os ritmos circadianos, as estratégias, os mecanismos são outros

As plantas, sabiamente, sabem evoluir, lidar com o escasso

Usar somente os recursos que elas próprias criam

 Mas, aí, chegaram os seres humanos, a urbanização, a modernidade...

Poderia ser tudo muito bom, mas não é

Se houvesse equilíbrio, seria lindo

 O que eu quero dizer com isso:

As árvores das cidades estão florescendo muito antes dos seus ritmos

Muito antes do término das suas jornadas internas fisiológicas

Muito antes de entender e aceitar suas novas condições de vida

 Ansiedade? Não! Barbaridade e caos: Socorro

 O clima mudou muito rápido, a pior seca da cidade

Calor fora da estação, distúrbios, pólen fora de hora

Sementes serão formadas?

Pássaros terão comida?

Novas plantas nascerão?


A Laudável Diversidade



por Mário Antonio Sanches

Professor titular da PUCPR – atualmente coordenador do Programa de Pós-graduação em Bioética




A humanidade, como um todo, as vezes nos parece um ébrio que avança cambaleante, incerto da percepção de si mesmo, titubeia à esquerda, deambula à direta, retrocede meio passo e aos poucos avança imprecisamente. Talvez se assemelhe melhor a um infante, quiçá a um bebê, que inseguro busca firmar seus passos e a queda se apresenta, não como mandatária, mas como experiência.

Todos nós, relutantes e amedrontados, transformamos a nossa realidade em um lar, onde nos aconchegamos, repousamos e alardeamos ser este o nosso espaço possível, o único seguro. Fora deste ‘nosso lar’ nada existe e se existir é perigoso, é uma ameaça que precisa ser eliminada.

Mas, entre quedas e vai-e-vens nos inquietamos: Será que para trombetear que nosso lar é acolhedor, precisamos exorcizar os lares alheios? Quando guturalmente explicitamos que nosso espaço é possível, estamos negando que outros existam? Assim, cada pessoa se depara com algo que gostaria de negar, tem que ver o que não gostaria de reconhecer, é colocada próxima daquilo que gostaria de manter distância: o outro, a outra.

O ‘outro’, a ‘outra’, impõem suas existências, estão às vistas, circulam na proximidade. Como vamos lidar com isto? Ou ainda, como estamos percebendo este outro, esta outra? A realidade do outro e da outra não é mono, mas polissêmica; não é rotina, mas festejo; não é única, mas diversa. Assim a diversidade se introduz como hóspede inoportuna, com galhardia imprópria. Desfila a si mesma, desarticulando nossa insegura e medrosa rotina.

O momento exige que o infante ébrio firme seus passos, encare o percurso, sorria desafiante e acalente um sonho: festejar a diversidade, não apenas suportar sua presença; torná-la laudável, não um infortúnio imposto; anunciá-la abertamente, não a tratando como hóspede indesejada. Mas para isso uma transformação se impõe e é preciso pôr em prática um vasto e generoso escambo e ir para a vida disposto a trocar: o resultado pela paz interior, o falo pelo afeto, o linear pelo cíclico, a lógica pelo fenômeno, a colheita pelo plantio, a certeza pela dúvida, a razão pela vivência.

A diversidade elogiada se revela sorrateira e cativante, nas suas múltiplas dobras, em um convite claro para que a humanidade visualize a si mesma, encare-se como totalidade e não exclua de si a sua essência: o diverso. Negar a diversidade é impossível, por isso as pessoas e povos com projetos de dominação forjam teorias - com alcunha de ciência ou nome de algum deus - que classificam a si mesmo e o outro como ‘superiores’ e ‘inferiores’. Assim, o modo de lidar com diversidade se torna sutil e perverso. Seria, por acaso, tão difícil perceber que afirmar ‘o outro não tem direito a existir’ ou dizer ‘o outro é inferior’ carrega a mesma lógica de dominação?

O relato sobre a diversidade laudável se torna extenso, mas também pode ser suscintamente apresentado, desde que se abandone esquemas mentais que quer negar o/a outro/a, ou classificá-los como ‘inferiores’. Se este passo for dado a diversidade surge resplandecente, como joia desejada, que quanto mais acumulada mais contabiliza para o tesouro da humanidade.

Invertendo este sonho a pobreza torna-se nosso legado, pois concretamente:

· Quando uma cultura desaparece, junto some uma maneira de interpretar a realidade.

· Quando um idioma cessa de ser falado, cessa junto um jeito de expressar a palavra ‘mundo’.

· Quando uma religião finda, empobrecem as sendas da humanidade buscar o transcendente e o sagrado.

· Quando uma etnia é ocultada, é o olhar de todos que fica embaçado.

· Quando uma expressão de gênero é perseguida, a humanidade revela sua própria infelicidade.

· Por fim, quando um humano é discriminado por aqueles que detém o poder, todos os humanos correm risco, pois, o poder muda de mãos, mas a sua lógica nunca.