Experimentação Animal? O que eu tenho a ver com isso?


Série Ensaios: Ética no Uso de Animais e Bem-estar-Animal



Por Marina Kobai

Graduanda do Curso de Ciências Biológicas, Aluna do Programa de Iniciação Científica, Estagiária no NEC-PUCPR – Grupo de Pesquisa Bioética Ambiental



No ano de 2013 ativistas invadiram um centro de pesquisas denominado Instituto Royal que utilizava animais em experimentos e testes de fármacos. O motivo da invasão segundo os manifestantes era de que ali eram cometidos maus tratos aos animais utilizados nos experimentos científicos, entre eles cães da raça Beagle, coelhos e camundongos. Na época o instituto afirmou que todas as pesquisas seguiam as normas da agencia de vigilância sanitária (ANVISA)(G1.2014). Segundo noticia divulgada no jornal Estadão em 23 de outubro de 2016, o fechamento do instituto deixou uma lacuna no sistema de pesquisa e desenvolvimento de fármacos no Brasil e que persiste até os dias atuais, comprometendo assim as pesquisas realizadas no país (Estadão,2016). (Veja aqui uma análise da repercussão da noticia)




O uso de animais em pesquisas deve ser tomado por atitudes éticas que favoreçam o bem estar dos mesmos, neste âmbito a Bioética é uma importante ferramenta para garantia dos direitos dos animais utilizados em pesquisas. A Bioética teve como principal protagonista na história do seu surgimento o norte – americano Van Rensselaer Potter, o qual defendia a idéia de que a bioética é uma ponte entre a ciência biológica e a ética, considera também que para a sobrevivência de uma sociedade decente e sustentável depende do desenvolvimento e manutenção de um sistema ético (Chagas & Agostini, 2012) .Os livros “Bioethics, science of survival”, e posteriormente, na obra Bioethics: bridge to the future (1971) demonstra sua preocupação com o planeta, principalmente na questão do aumento populacional, os impactos causados ao ambiente e trás a tona uma preocupação  mundial com a ecologia ético (Pessini, 2013).

Surgiram no sec. XIX as primeiras sociedades protetoras dos animais, e em 1978 foi proclamada a Declaração Universal dos direitos dos animais, cujo objetivo foi mostrar o valor da vida destes ( Fischer & Oliveira, 2012), esse novo passo em prol dos animais, tem como alvo central a garantia do direito dos animais. Em 1985 o Conselho das Organizações Internacionais de Ciências Médicas (Council for International Organizations of Medical Sciences – CIOMS) definiu princípios internacionais para servirem de base para países que não possuíam legislação animal, de forma que possam desenvolver seus mecanismos de controle (Azevêdo, 2006). Como forma de regulação foi intitulada na década de 80 o primeiro comitê de ética no uso de animais localizado na Suécia.

Atualmente cada Instituição de Pesquisa  que realiza experimentos com animais deve ter instaurado um Comitê de Ética no uso de Animais cujo objetivo primordial segundo Fischer e colaboradores(2014) “deve prezar pela minimização da dor e do sofrimento e promover o bem-estar dos animais, a questão ética fundamental coloca em questão a necessidade do experimento e o status moral do animal, o que torna imprescindível uma avaliação do mérito da pesquisa”. As CEUAs que são as comissões realizadas pelo Comitê para análise dos projetos submetidos, utilizam das legislações como norte para a liberação das pesquisas.

A criação das CEUAS inicialmente possuía a preocupação de que a sociedade exercesse um papel fundamental nas decisões envolvendo animais em pesquisas (Fischer et al, 2014). A sociedade possui papel fundamental na experimentação a qual traz para os experimentos uma visão mais humana e menos científica na utilização de animais em pesquisas assim se preocupando mais com a vida do animal e seus direitos como ser vivo. Atualmente com o advento das novas tecnologias e a importância da divulgação científica a sociedade se distanciou desta área transformando a experimentação animal em cunho totalmente científico.

Atualmente as pesquisas envolvendo animais vão muito além de experimentos realizados em laboratórios, e as medidas adotadas pela área jurídica tornam a submissão e desenvolvimento de tais projetos da área ambiental dificultada, uma vez que claramente estas leis estão voltadas para a pesquisa científica em laboratório. Os pesquisadores de campo, que buscam em seus objetivos a preservação e conservação dos animais presentes nos ecossistemas e já devem a se submeter a inúmeros instrumentos burocráticos para validarem suas pesquisas, se deparam com inúmeras dificuldades na hora de submeter pesquisas, uma vez que não existe legislação específica para eles e assim se vêem obrigados a se adaptar a medidas impostas a experimentação em laboratório.  Devido a essa grande dificuldade encontrada por pesquisadores de campo na submissão e desenvolvimento de projetos enviados a CEUA, se faz necessário uma identificação dos fatos que impedem ou dificultam a realização da pesquisa, de forma a melhorar o diálogo entre as partes sem prejudicar o direito dos animais envolvidos e assim favorecer a ética e a integridade tanto na pesquisa quanto em relação ao animal.

Assim, eu como formanda em Biologia e como pesquisadora da Área da Bioética acredito que a sociedade tem papel fundamental na aprovação de projetos envolvendo animais, somente esta visão que não possui um cunho cientifico pode trazer maior garantia de direito para estes animais uma vez que estas pessoas não estão sendo influenciadas pela sociedade científica que visa em muitas vezes o avanço tecnológico independente de métodos utilizados com estes seres que possuem senciencia e que não devem ser tratados como inferiores pelos primatas mais evoluídos, no caso nós humanos.



O Presente Ensaio foi elaborado baseando-se nas obras:



AZEVÊDO, Danielle Maria Machado R. Experimentação animal: aspectos bioéticos e normativos. 2006.

CHAGAS, Flávia Bernardo; DAGOSTINI, Fernanda Maurer. Considerações sobre a experimentação animal: Conhecendo as implicações éticas do uso de animais em pesquisas Considerations for animal experimentation: Knowing the ethical use of animals in research. Revista Redbioética/UNESCO, p. 35, 2012.

Fischer, M. L., Peters, V. M., Gimpel, J., Molinari, R., Maria, G., Oliveira, D. A., … Quintana, L. G. (2014). Workshop : “ Sucessos e Vicissitudes das Ambiente e Diversidade, (April 2016), 0–12. http://doi.org/10.7213/estud.biol.36.SE.01.disponivel em < https://www.researchgate.net/publication/268211663_Workshop_Sucessos_e_Vicissitudes_das_CEUAs_CEUAs_Regimento_e_protocolo> acesso em 02/08/2016.

FISCHER, Marta L.; OLIVEIRA, G. M. D. Ética no uso de animais: a experiência do comitê de ética no uso de animais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Estudos de Biologia, Ambiente Diversidade, v. 34, n. 83, p. 247-260, 2012.disponível em < http://www2.pucpr.br/reol/index.php/BS?dd1=7337&dd99=view> acesso em 02/08/2016

Pessini, L. (2013). As origens da bioética : do credo bioético de Potter ao imperativo bioético de Fritz Jahr

http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2013/10/ativistas-invadem-e-levam-caes-de-laboratorio-suspeito-de-maus-tratos.html