O controle ético da aranha-marrom é possível?

 

Bioética Ambiental

Por Caroline de Barros Rodrigues e Helena Coentro Wohlke

 

Buscando auxiliar estudantes de ensino médio na escolha de seu curso, o Planeta PUCPR é uma feira de cursos e profissões onde ocorre a integração entre alunos, professores e participantes. Normalmente, há um percurso entre escolas e cursos com estandes em que graduandos explicam mais sobre sua graduação e respondem a perguntas, havendo oficinas e visitas guiadas por laboratórios e museus utilizados no dia a dia da faculdade. Por meio do Planeta PUC, aqueles que estão decidindo sua futura carreira podem fazê-lo de maneira mais dinâmica e divertida.

Devido a pandemia do Covid-19, a feira de profissões de 2020 ocorreu através de uma plataforma online, onde as lives e oficinas foram transmitidas tanto no próprio website quanto no YouTube, permitindo também a interação entre alunos, professores e participantes. Visando explicar mais sobre o papel do biólogo no século XXI, as professoras Marta Luciane Fischer e Lays Cherobim Parolin debatem sobre biodiversidade, Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), e animais cosmopolitas. Pensando nas aranhas cosmopolitas, as professoras discutem sobre o controle biológico, podendo ser utilizado para o controle das aranhas-marrom, por exemplo, que são muito presentes na cidade de Curitiba.

O controle biológico é uma técnica que consiste na utilização de “inimigos” naturais da espécie danosa, evitando assim o uso de soluções possivelmente tóxicas, tanto em grande escala como nas lavouras, quanto no ambiente doméstico, dificultando o contato dos residentes com animais nocivos. Uma das pesquisas que atualmente está sendo realizada pelos membros do Núcleo de Estudos do Comportamento Animal vinculado ao Grupo de Pesquisa em Bioética Ambiental e ao Programa de Pós-Graduação em Bioética da PUCPR visa a criação de um protocolo de controle biológico de aranhas do gênero Loxosceles. (com enfoque principal em L laeta e L. intermedia), onde a manutenção de aranhas da espécie Pholcus phalangioides e suas teias possuem o potencial de dificultar a instalação da aranha-marrom nas edificações. Esse é um exemplo claro de como o controle ético é benéfico à sociedade já que, por apresentar comportamento araneofágico (alimentar-se de outras espécies de aranhas) e seu veneno ser completamente inofensivo ao ser humano, afetando apenas suas pequenas presas, a utilização desta técnica não afeta o nosso cotidiano, trazendo o benefício da redução de casos de loxoscelismo em todo o estado.

Assim, convidamos-vos a assistir o vídeo e deixar a sua opinião! Caso queira se certificar quais são as aranhas que você possui em sua casa, basta mandar a foto no insta @aranha.morrom que identificaremos para você! Assim como podemos ajudar em outras dúvidas!








Uso de recursos naturais e sua relação com pandemias


Ensaio: Bioética Ambiental 


Por Samuel Soares 

Graduando em Ciências biológicas 



A natureza e seus recursos são há muito tempo e amplamente utilizados pela humanidade para produção de tecnologias que aprimoram as habilidades do ser humano como espécie e nos revertem em vantagens evolutivas sobre demais animais. A exemplo da produção de alimentos, que no Brasil já é suficiente para alimentar toda a população, muito embora política e desigualdades sociais estejam relacionados à distribuição desigual de produtos alimentícios. Na natureza algumas espécies animais cultivam seu alimento, como as formigas cortadeiras que cultivam o fungo da espécie Leucoagaricus gongylophorus. Porém muitos procuram o alimento no ambiente, seja pastagem ou seja uma presa pastando. Estão sempre condicionados ao que tem disponível sendo obrigados a procurar por alimento, migrar, hibernar. 

Mas com a humanidade é diferente. A produção de alimento já não atende unicamente ao propósito de sobrevivência. Atende à uma indústria centenas de vezes ramificada que atende a diferentes interesses. Há uma variedade de produtos que podem ser consumidos em mercados, lanchonetes, restaurantes, fast-foods, cafeterias, bares, food-trucks, delivery entre outras opções. O alimento, quanto recurso, está sempre disponível em vários locais do centro urbano - desconsiderando desigualdades em termos de capital. 
O conforto que a indústria agro-pecuária trouxe com seus anos de inovação é sem igual. Hoje em dia ninguém precisa cultivar seus grãos, moê-los, torrá-los ou extrair seu óleo. Tudo isso já está feito. E quem consome pode se preocupar com outras coisas, pode se ocupar com outros afazeres. Isso pode em parte explicar o sucesso da espécie até os 7,8 bilhões de indivíduos atuais. 
Outras indústrias também promoveram o avanço de uma vida mais confortável e tecnológica. Como a mineração. A extração de minerais proporcionou a base material para o avanço tecnológico com smartphones e computadores. Usinas hidrelétrica produzem a energia necessária para que a vida continue mesmo a noite, prolongando o tempo de atividade humana. Sem contar os benefícios de máquinas movidas a eletricidade e toda tecnologia que dela depende. 

Todo esse conforto promovido por anos de evolução tecnológica se apoia em um uso de recursos naturais que está chegando a níveis irreversíveis - exemplo é o desmatamento da Amazônia para estabelecimento de monoculturas e mineração. A extração e uso desses recursos que vai desde o espaço físico aos organismos em si desequilibra todo um ecossistema. 
Um ecossistema é um conjunto de interações onde organismos vivos interagem com o meio e têm o seu papel, desempenham uma função quando realizam seus nichos. Quando um componente importante é alterado nesse ecossistema alguns organismos podem sofrer consequência e desempenhar mal a sua função ou não conseguir desempenhar. E em efeito dominó as consequências se prolongam aos demais organismos. 

Um exemplo é o uso de agrotóxicos que nas plantações matam insetos, inclusive abelhas. Estes últimos são essenciais para a reprodução de dezenas de espécies vegetais que delas dependem para polinização. Estima-se que 70% das plantas que nos servem de alimentos são polinizadas por abelhas, sendo responsáveis por 90% da produção de alimentos em todo o planeta Terra. Os agrotóxicos ao eliminar as abelhas, refletem em um declínio em espécies que elas polinizam, sejam as que consumimos ou outras. Espécies que nos seus nichos têm um papel único, que filogenética e evolutivamente são únicas. Elas fazem parte de um ecossistema e quando são afetadas podem comprometer esse sistema. 
Além do uso de recursos, o avanço da humanidade demandou muita ocupação de espaço, que antes era local para outros organismos e agora contam com grandes cidades onde animais e outros seres vivos tiveram de se adaptar, onde se não são pragas urbanas são pelo menos indesejados ou potencial perigo à saúde pública. O uso de espaço também é um fator que desequilibra ecossistemas. Desmatamento para construção de ruas, cidades, campos de agricultura ou pecuária fragmentam hábitats, isso quando não extinguem. E todos os organismos daqueles locais precisam buscar novo ambiente ou se adaptar para não se extinguirem. Essa convivência egoísta da humanidade em todo o planeta desconsidera tudo que já existe antes do que é fabricado em máquinas altamente automatizadas. 

Em Nipah, quando perderam seu habitat para uma fazenda de criação de porcos, morcegos passaram a coabitar com os suínos. Seus nichos muito parecidos levaram um vírus do morcego para o porco e deste para os humanos. 
Morcegos consumiam frutos de uma mangueira, os frutos parcialmente consumidos que caíam entre os porcos eram consumidos por eles também e a contaminação acontecia. Em seu hábitat natural morcegos frugívoros dispersam sementes de frutos e são predados por outros animais, mas não mantêm relação direta com suínos. O spillover, efeito em que um vírus animal passa para um humano, é justificado nesse caso pela perda de hábitat. 
O meio ambiente como recurso é essencial para a sobrevida de uma espécie. Predadores felinos na Índia estão invadindo cidades a noite na busca por presas que podem ser cães, cabras ou porcos, porque a cidades indianas crescem cada vez mais. E essa exposição de pessoas a animais silvestres é uma bomba relógio para toda a humanidade. 
Dos vírus que mais dizimaram pessoas no planeta, a maioria se origina em animais selvagens, que podem ser reservatórios de para doenças desconhecidas e com potencial pandêmico, ou em animais cultivados para o consumo frenético de carne nos dias atuais . 
Mesmo animais selvagens acabam se tornando um recurso em mercados de carne, a exemplo de Wuhan, China, onde iniciou a explosão do Sars-CoV-2 (Covid-19). Neste local carne de animais são vendidas livremente sob condições sanitárias fora do protocolo e por isso o efeito spillover é facilitado. 
O efeito desse ‘pulo’ de um vírus ou bactéria de uma espécie animal para um humano é catastrófico haja visto o efeito dos vírus para H1N1, MERS, varíola e da bactéria para peste bubônica. Quando encontram condições em um hospedeiro esses micróbios se disseminam. Centros urbanos e cidades, assim como as instituições em geral facilitam o contágio uma vez que a população de hospedeiros se encontra concentrada. O cosmopolitismo desses locais favorece esses agentes. 
Pandemias, contágios e doenças novas não são estranhas à história humana. A ciência avançou muito em relação a forma de lidar com pandemias ou vírus, os avanços em terapias de eliminação do HIV e a chegada precoce de potenciais vacinas para a Covid-19, demonstram isso. Graças ao avanço tecnológico e científico que por séculos incorpora recursos naturais em produtos necessários em laboratórios, hospitais, universidades e até em casa. 


Eu como estudante de biologia acredito que é inevitável transformar a natureza e seus recursos, ocupar espaço, impactar na vida de outros organismos, mas é urgente fazer isso de forma planejada. Toneladas de plástico estão sendo ingeridas por baleias e tartarugas mas ainda sim muitos produtos de plástico precisam ser produzidos. Todavia há como se evitar essa consequência produzindo esses produtos com uso de fibras (como de bambu) ou outras fontes materiais, repensando as medidas de proteção a esses animais. Medidas que não envolvem ou dependem de um órgão específico, mas de todas as pessoas. Parte da educação ambiental em escolas, para conscientização em massa, fiscalização por autoridades, prática de hábitos de proteção pelas pessoas, produção e consumo planejado dos produtos possivelmente poluentes entre outras atitudes. O conforto de toda a estrutura urbana que cada vez cresce mais tem seu impacto na natureza e planejar esse impacto é um dever de todos. 



O presente ensaio foi elaborado para o estágio em Bioética, tendo como base as obras:


BARBOSA, Vanessa. Vídeo mostra ataque de leopardo em escola na Índia: Com as cidades indianas invadindo cada vez mais os habitats desses animais, a tendência é que ocorram mais encontros entre grandes felinos e seres humanos. Exame. 08 fev de 2016. Disponível em: https://exame.com/mundo/video-mostra-ataque-de-leopardo-em-escola-na-india/. Acesso em 03/08/2020.

ESTRADA, C, et al. Fungal endophyte effects on leaf chemistry alter the in vitro growth rates of leaf-cutting ants’ fungal mutualist, Leucocoprinus gongylophorus, 2014. Disponível em: https://vanbaellab.wp.tulane.edu/wp-content/uploads/sites/66/2015/08/Estrada-et-al.-Fungal-Ecology-2014.pdf. Acesso em: 03/08/2020.

FIBERCARE. Linha Ecológica para Substituir o Plástico. Techmelt. 11 set de 2018. Disponível em: https://techmelt.com/pt-br/blog/2018/09/11/linha-ecologica-para-substituir-o-plastico/. Acesso em: 03/08/2020.

Folha informativa – COVID-19 (doença causada pelo novo coronavírus). OPAS/OMS Brasil. 31 jul de 2020. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875. Acesso em 03/08/2020.

Formigas cortadeiras: o alimento. Cursos CPT. Disponível em: https://www.cpt.com.br/dicas-cursos-cpt/formigas-cortadeiras-o-alimento#:~:text=As%20formigas%20cortadeiras%20s%C3%A3o%20diferentes,alimentam%20das%20folhas%20que%20cortam.. Acesso em: 03/08/2020.

GRAGNANI, Juliana. Do nipah ao coronavírus: destruição da natureza expõe ser humano a doenças do mundo animal. Da BBC News Brasil em Londres - 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52161309. Acesso em: 03/08/2020.

HANBURRY, Shanna.Cientistas alertam: devastação da Amazônia está próxima de um ponto irreversível. Amazônia: notícia e informação. 13 de fevereiro de 2020. Disponível em: https://amazonia.org.br/2020/02/cientistas-alertam-devastacao-da-amazonia-esta-proxima-de-um-ponto-irreversivel/#:~:text=Cientistas%20alertam%3A%20devasta%C3%A7%C3%A3o%20da%20Amaz%C3%B4nia%20est%C3%A1%20pr%C3%B3xima%20de%20um%20ponto%20irrevers%C3%ADvel,-13%20de%20fevereiro&text=Cientistas%20que%20estudam%20a%20Amaz%C3%B4nia,fogo%2C%20mais%20propensa%20a%20inc%C3%AAndios.. Acesso em: 03/08/2020.

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