Série Ensaios: Sociobiologia
Por Adrielly Kucek
Freitas, Caynã Nicholas Souza, Gabriele Ferreira Moro, Henrique Wuicik Franco e
João Batista dos Santos Neto, Leandro Taborda da
Rocha.
Formandos em Ciências
Biológicas
No
mês de fevereiro de 2019, um rapaz de 19 anos foi morto
por um segurança de um Supermercado Extra, localizado na Barra da
Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Segundo a equipe de vigilância do mercado, o jovem teria tentado roubar
a arma do segurança e, por isso, o funcionário do estabelecimento aplicou um
golpe no rapaz conhecido como “mata-leão”, a fim de imobilizá-lo.
Vários
clientes do supermercado ficaram ao redor do segurança que estava em cima do
jovem, alertando-o que estava sufocando o rapaz e pedindo para interromper o
golpe. Contudo, outros funcionários da segurança apareceram no local, com um
objetivo maior de impedir gravações do caso, enquanto o vigilante continuou
sufocando o jovem, que morreu posteriormente no Hospital Lourenço Jorge, após
duas paradas cardiorrespiratórias.
Esse
episódio repercutiu por diversos meios de comunicação, sendo pauta de
reportagem em grandes jornais, como o G1,
Folha
de São Paulo e R7
. O Extra declarou em uma nota que os seguranças envolvidos no caso foram
imediatamente afastados e que repudia quaisquer atos de violência em seus
mercados.
Dessa
forma, a atitude do segurança do mercado Extra demonstra uma reação agressiva,
já que, conforme Niehoff (1999),
a agressão é definida como o comportamento que se utiliza de força física ou
verbal em resposta a uma percepção de ameaça. Assim, pode-se notar que o
funcionário reagiu de forma agressiva porque o jovem tentou pegar a sua arma,
tornando-se uma ameaça para o vigilante.
Segundo
Queiroz
(2009), pesquisas acerca do comportamento agressivo são divergentes
quanta a crença de que a agressão possui influência inata ou instintiva, ou se
é simplesmente um comportamento aprendido. Além disso, o fenômeno da agressão é
estudado por diferentes perspectivas teóricas, tendo contribuições de maior
destaque para esse comportamento nas áreas do behaviorismo,
da aprendizagem social e, por fim, da etologia (Kristensen et. al, 2003).
Uma
das principais abordagens etológicas refere-se ao “instinto
da agressão”, proposto por Lorenz (1966),
o qual esclarece que esse instinto não pode ser considerado um princípio
diabólico que tem como intuito a destruição e a morte, porém deve ser analisado
como um contribuinte da preservação e organização da vida (Kristensen
et. al, 2003). Além disso,
a agressividade poder variar de acordo com a escassez de recursos, sendo que há
maior cooperação entre indivíduos se há uma quantidade maior de recursos em
determinado ambiente (Câmara,
2018). Ainda há outra contribuição da etologia que se diz respeito à
definição de diferentes classes de comportamento agressivo, como a apresentada
por Moyer
(1976).
Condicionantes
biológicos, por sua vez, também podem colaborar na compreensão do comportamento
agressivo, já que para ocorrer esse fenômeno é necessário um substrato
neurobiológico para conciliar os diversos componentes neuronais e motores dos
atos agressivos (Saver
et al., 1996, Kristensen
et. al, 2003).
Características biológicas, como instintos, impulsos ou forças inatas (drives),
predisposições genéticas, luta reflexa,
hormônios e mecanismos de neurotransmissão estão relacionados ao comportamento
agressivo (Kristensen et. al, 2003). Além disso, há
outros fatores que influenciam a ação agressiva, como o sexo do indivíduo,
temperamento da pessoa, experiência prévia de ação agressiva, condicionamento
ideológico (político, religioso, etc.), ambiente de desenvolvimento, padrões de
interação familiar, entre outros (Câmara,
2018).
Existem
pontos muito conflitantes nesse caso. Condicionantes biológicos podem ser
usados para justificar ou amenizar a situação, tendo em vista que
neurotransmissores e até mesmo o instinto agressivo frente a uma situação de
descontrole estão ligados em casos semelhantes. Mas até que ponto esse tipo de
comportamento é aceitável na sociedade em que vivemos? É mesmo possível
amenizar a situação levando em consideração esses fatores biológicos? Seria
compreensível se ainda fossemos uma espécie inconsciente de próprios atos, em que o instinto predomina e
não soubéssemos aprender a controlá-los?
É
fato que a intenção do segurança não fosse o óbito da vítima, e que naquele
momento fatores biológicos e do meio (como a pressão das pessoas que estavam em
volta) estavam envolvidos, mas a partir do momento em que se sabe que o dever
dele não era matar, somente acalmar a situação de forma racional, é
inadmissível que se perdesse o controle dessa maneira, tendo o segurança que
arcar com as consequências de seus atos e tendo a punição merecida.
No
debate realizado em sala foram levantadas algumas questões relacionando os
fatores biológicos – hormônios principalmente – que em situação de estresse
podem se tornar um fator determinante para a tomada de decisões. Trabalhos com
segurança envolvem atenção constante a qualquer situação que possa representar
risco aos que o profissional deve proteger, bem como a si mesmo. A versão
vinculada pela imprensa relata que o jovem teria tentado pegar a arma do
segurança. Tal situação deixa o corpo em alerta, descarga de adrenalina, junto
ao cortisol acumulado no sangue pelo exercício da profissão e ainda a
testosterona podem ter levado o segurança a uma tomada de decisões equivocada.
Contudo
ainda existem versões menos difundidas que o rapaz poderia na verdade estar
tendo um princípio de ataque epilético, que foi mal interpretado pelo segurança
quando o jovem foi lhe pedir auxílio e o segurança acabou entrando em confronto
agonístico com o jovem.
É
sabido que a agressão não está diretamente relacionada ao ataque físico em si e
sim à ameaça. Uma disputa física é muito dispendiosa de energia e pode ainda
deixar sequelas, portanto, as coisas tendem a ser resolvidas antes do combate
físico, seja por comparação de tamanho, rugidos para mostrar vitalidade, e
somente em último caso, a luta de fato. Um cachorro que rosna antes de atacar
somente rosna pois não tem certeza se dá conta do confrontado, primeiro, ameaça
e mostra sua vitalidade, para somente em último caso atacar, se tivesse certeza
que pode vencer no combate atacaria sem hesitar. Mesmo quando há luta, ela é
breve, justamente por ser dispendiosa. Sendo assim, é possível afirmar que a
seleção natural atua sobre as espécies fazendo com que os indivíduos que
reconhecem uma derrota rapidamente continuem propagando seus genes. Isso pois a
energia que seria gasta tentando vencer um competidor mais apto pode sem
empregada na busca de recursos ou pares sexuais menos disputados.
Remontando
os primórdios da vida em sociedade humana, as fêmeas – como acontece em muitos
outros grupos animais – ficava responsável pelos cuidados com a prole, enquanto
os machos faziam trabalhos “braçais”, como a caça, principalmente. Logo, ao
longo do tempo enquanto os homens dependiam de sua força, vigor e estratégias
de luta, as mulheres dependiam de sua sensibilidade, atenção e cuidado. Juntos
se mantiveram, por milhares de anos, dando continuidade à espécie humana, sendo
selecionados ao longo do tempo. Mesmo que hoje haja uma discussão com relação à
equidade de direitos entre os sexos, que não necessariamente uma mulher precise
cuidar da prole enquanto o homem provém recursos para a criação dos filhos,
essas qualidades de acordo com o sexo selecionadas ao longo de milhões de anos
ainda se mantêm entre os humanos atuais.
Com
isso é possível afirmar que etologicamente, homens são mais agressivos. Foi
discutido que haveriam outras maneiras de lidar com a situação sem a aplicação
do golpe, visto que o segurança apresenta certa autoridade sobre cidadãos
comuns, estava armado e ainda apresentava um porte maior que a do jovem que
faleceu. Ou seja, em todos os quesitos aqui postos o segurança apresentava
vantagem sobre o jovem. Isso pode justificar o porquê do ataque, não hesitou,
pois, sabia que era mais forte. Além de que o segurança ainda contava com o
amparo de outro colega de profissão, que estava, por assim dizer dando
cobertura, logo o indivíduo não somente se sentiu seguro para efetuar a
agressão mas também sentiu que estava executando sua função como funcionário.
Infelizmente
todos os atos que aconteceram convergiram na morte de um jovem, o fato é que
tem um ponto importante a se abordar na questão da técnica que foi empregada
pelo segurança. No caso, o agressor derrubou o jovem no chão, que acabou
batendo a cabeça bruscamente, técnica que não é usual e responsável para a
neutralização da possível ameaça, após isso o segurança foi ao chão para
“conter” a ameaça aplicando um golpe do Jiu-Jitsu conhecido como Mata-Leão, que
foi a técnica que acabou sendo letal, visto que foi aplicada de uma forma
errônea, pois o segurança ao invés de manter suas costas no solo, aplicando a
técnica correta cortando a circulação da jugular, ele se apoiou sobre as costas
do rapaz fazendo com que o mesmo ficasse pressionado contra o chão, fato que
impediu que o jovem pudesse mexer sua caixa torácica e logo, respirar. Fato que
culminou na morte do rapaz devido à falta de oxigenação do cérebro e outros
órgãos visto que a oxigenação do pulmão do indivíduo fo suspendida com o golpe
sem técnica, sendo ainda que o segurança permaneceu sobre o corpo do jovem por
muito tempo além do que poderia, culminando no óbito do agredido
Entretanto, a discussão que se forma a partir da
argumentação biológica dos atos do segurança é: “ Então ele estava certo? ”.
Não, esses profissionais com a função de nos proteger, apesar de estarem
expostos ao estresse constante, devem estar preparados para tomar decisões
difíceis e agir em situação de risco sem pôr a sua nem a vida dos outros em
risco. O caso é apenas mais um capítulo do extenso livro de abusos contra a
população, seja da polícia, guarda municipal ou até mesmo seguranças de
supermercados.
O presente ensaio foi elaborado para disciplina de
Etologia, tendo como base as obras....
Câmara,
F. P. (2018). Comportamento agressivo. Psychiatry on line Brasil. Disponível
em: https://www.polbr.med.br/2018/03/02/comportamento-agressivo/.
Kristensen, C. H., Lima, J. S., Ferlin, M., Flores, R. Z., &
Hackmann, P. H. (2003). Fatores
etiológicos da agressão física: uma revisão teórica. Estudos de psicologia
(Natal). Vol.
8, n. 1 (jan./abr. 2003), p. 175-184.
Lorenz, K. (1966). On aggression. Nova York: Hartcourt, Brace &
World.
Moyer, K. E. (1976). The psychobiology of aggression. Nova York: Harper
& Row.
Niehoff, D. (1999). The biology of violence. Nova York: Free Press.
Queiroz, R. da S
(2009). Agressividade humana: contribuições da Psicologia Evolucionista e da Antropologia.
OTTA, E; YAMAMOTO, M. E. Psicologia Evolucionista. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, p. 127-132.
Saver, J. L., Salloway, S. P., Devinsky, O., & Bear, D. M. (1996).
Neuropsychiatry of aggression. In B. S. Fogel, R. B. Schiffer & S. M. Rao
(Orgs.), Neuropsychiatry (pp. 523-548). Baltimore:
Williams & Wilkins.
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