Marta
Luciane Fischer, Douglas Rocha e Renata Bicudo Molinari
Há seis meses o mundo presenciava,
em tempo real, um dos maiores desastres ambientais do Brasil. A apropriação de
um rio por um tsunami de 2 milhões de metros cúbicos de lama e rejeitos de
mineração, que devastou comunidades humanas e ecossistemas, deixando centenas
de moradores desabrigados, 19 vítimas humanas fatais e milhões de vítimas florais
e faunísticas. Conforme o mar de lama seguia até o mar, nossos gestores
pareciam torcer para que fosse comprovado um precedente abalo sísmico, para que
toda a lama se diluísse antes de chegar aos manguezais, para que a infalível medida
mitigatória desse certo ou ainda, para que outro acontecimento impactante
invadisse os noticiários e enaltecesse o estarrecimento da população. A lama
invadiu o mar, se pavimentou o fundo do rio matando organismos bentônicos e
desoxigenou a água, asfixiando os planctônicos. Ambientalistas e simpatizantes
choraram genuinamente por um acidente que denunciava a morte de um Rio ou, com
muito otimismo, um estado de coma que poderia durar décadas. O Posicionamento
quase que indiferente do Governo, a atitude apática da Empresa e a acomodação
da população foram tão doloridas e revoltantes quanto o acidente em si.
Personalidades nacionais foram ofuscadas por celebridades internacionais que
clamaram pela punição chegando a doarem seus caches.
O impactante desastre de
Mariana não deve ser visto como um fato isolado, é apenas um termômetro, um
indicativo da idoneidade de nossas condutas com relação à natureza. Como toda
questão bioética, se constitui de um problema complexo, que envolve muitos
agentes morais que tomam decisões pautados em valores e princípios que não
refletem a totalidade dos seres vivos. Há mais de 40 anos, cientistas como Van
Rensselaer Potter veem alertando a humanidade que ela precisa olhar a natureza
com mais cuidado, precação, responsabilidade, alteridade, e principalmente, se
compreendendo como apenas mais um desses elementos.
Parece que quando os
acontecimentos são noticiados na TV ganham um ar de virtualidade ou irrealidade
e, em uma sociedade líquida, a necessidade de notícias novas diluem a
indignação e o ímpeto de justiça. Além disso, a paradoxal distância entre o
cidadão e os fatos dificultam a sua inserção na problemática e obviamente a compreensão
dos culpados. Contudo não devemos nos eximir de nossas responsabilidades, seja
ao consumirmos de maneira inconsciente e irresponsável, alimentando a
exploração dos recursos naturais como se fossem infinitos, ou clamando por
produtos cada vez mais baratos, estimulando que as empresas procurem compensar
o custo no manejo ambiental. A população ainda detém uma atitude compassiva com
relação à gestão do bem-comum pelo Estado. Obviamente que, em uma sociedade,
dividimos as tarefas e endossamos, por meio de nossos impostos, que o governo
se responsabilize por algumas delas. Porém se nos omitimos das decisões,
consequentemente, seremos corresponsáveis. Como devemos fazer isso? Devemos
trabalhar em consonância com a gestão pública, participar das decisões e tomar
parte da nossa responsabilidade, sair do comodismo e ter um protagonismo
crítico. Nos parece que cada vez mais o mundo precisa de uma nova ferramenta
que subsidie a resolução dessas questões complexas, plurais e globais, que intermedeie
o diálogo entre os inúmeros agentes, que hora são pacientes morais, hora se veem
extremamente vulneráveis. A Bioética Ambiental e seu caráter deliberativo,
inserida em Comitês que congreguem todos os setores da sociedade envolvidos,
traz uma esperança de retomar o equilíbrio e a harmonia na relação entre os
homens e a natureza, como era no início.