Por que o espanto? O King Kong sempre morre no final


Marta Luciane Fischer

O mundo presenciou na última semana em tempo real a morte de Harambe um gorila de 17 anos nascido e criado no Zoológico de Cincinnati, EUA. A difícil e lastimável decisão de abater o animal se deu em decorrência de uma criança ultrapassar barreiras e cair de uma altura de cerca de 3m em um recinto que abrigava três gorilas. A inacreditável, inverossímil e imprevisível cena de uma criança de quatro anos arrastada por um gorila de 181kg foi presenciada por um público atônito por cerca de 10 min. Os vídeos expressivamente compartilhados e analisados por primatólogos atestam Harambe não mostrava indicativos de que iria atacar, corroborando com outros casos similares. Os gorilas estão ameaçados de extinção, estimativas indicam que existam cerca de 4.000 indivíduos em vida livre. É um animal lindo, forte, imponente, não deixando dúvidas de que foi uma difícil decisão para equipe do zoológico, e embora o questionamento mais frequente tenha sido o fato de não ser utilizado tranquilizantes, os profissionais atestam que a anestesia demora para fazer efeito, além do susto aumentar o estresse e poder acarretar em uma situação ainda mais trágica. Imediatamente após a morte de Harambe o meio digital e televisivo presenciou uma exorbitante mobilização social atestando o luto pelo primata e divulgando uma petição, que já consta com milhares de assinaturas, solicitando que os pais da criança sejam responsabilizados criminalmente pelo fato de não supervisionarem seu filho, que expressou o desejo de entrar no poço. Por mais incrível e cinematográfica que a situação possa parecer, não é rara, no Paraná tivemos o caso do menino que teve seu braço arrancado por um tigre. Mas será que é possível apontar um culpado apenas? Ou assim como qualquer tragédia existem uma sequência de erros negligenciados? Obviamente que os pais têm uma parcela de responsabilidade aditivada pelas novas concepções intrínsecas à sociedade liquida, cada vez mais afastada da natureza e do comunitário. Obviamente que o zoológico tem uma parcela de culpa ao expor um animal perigoso sem se precaver de meios mais seguros e menos invasivos já adotado por zoológicos modernos que dispõem de barreiras de vidro unidirecionais. Obviamente que os aspectos culturais têm uma parcela de culpa ao reivindicar centros de entretimento que oportunize o convívio com a natureza cada vez mais distante do dia-a-dia. Obviamente que a sociedade tem sua parcela de culpa ao não se inserir no contexto como protagonista de uma situação que diz respeito a todos os cidadãos. O que não deve ocorrer é a reflexão parar no caso específico, mas que traga à tona questões que há muito tempo demandam de uma a ação mais efetiva. Os limites éticos na utilização dos animais para entretenimento é uma questão complexa, global e plural que requer a construção de uma ponte promotora de um diálogo, no qual os argumentos de todos os atores sejam ouvidos e uma solução justa seja alcançada. Os princípios éticos na relação do homem/animal, ainda embasam uma ética utilitarista, na qual aceita-se o uso de animais para finalidades fundamentais para sobrevivência humana e para as quais não existem alternativas, e ainda, buscando desenvolver tecnologias que permita atestar, monitorar e promover as melhores condições possíveis de bem-estar animal, eximindo-o de qualquer procedimento que cause dor ou sofrimento.  Olhando por essa ótica, a exposição de animais em zoológicos, pelo menos da forma que a maioria das instituições estão estruturadas, estão mais de acordo com uma ética antropocêntrica, que coloca o interesse das pessoas em presenciar e interagir com animais selvagens, como mais importante do que o direito do que a liberdade e o bem-estar do animal.