terça-feira, 1 de abril de 2014

Para Sermos Humanos


Série Ensaios: Aplicação da Etologia

Por MAÍSA SOUZA E RENATA HALILA

Acadêmicas do curso de Ciências Biológicas

As diferentes espécies de animais comunicam-se através da linguagem corporal, verbal entre outras. O ser humano, no entanto, à medida que aprimorou sua capacidade de se comunicar parece ter adquirido consciência não apenas de si, mas também do grupo. A sociedade humana se estabeleceu a partir do uso e aprimoramento dos meios de comunicação (Araújo, 2002). Palavra derivada do latim communicare que significa ‘pôr em comum’ (Andrade, 2006), ou seja, expor ideias, o que determina o comportamento de um animal é o meio onde esse está inserido. Tais padrões de comportamento tem relação com as características físicas de cada espécie, assim cada espécie se expressa de acordo com suas capacidades, determinadas durante um processo de seleção natural, esta deletou ou manteve formas de comportamento, geneticamente fixadas, que dessem ao animal capacidade de adaptar-se ao meio. A ciência responsável pelo estudo do comportamento animal e seus padrões, é a Etologia, a qual é pode ser um sinônimo de Evolução (Araújo, 2002). Quando comparamos o homem a outros animais, tendemos a acreditar que as formas de comunicação humana tem uma origem exclusivamente cultural, mas os diferentes tipos de comportamento podem ser também hereditários- genéticos. A comunicação entre dois animais ou mais indivíduos pode ser definida como um comportamento de um indivíduo que tem efeito sobre outro(s), que pode ser da mesma espécie (intraespecífica) ou não (interespecífica). A comunicação entre os animais é fundamental para a sobrevivência, sendo impossível qualquer animal viver isoladamente. Por isso, quase sempre existe uma interação social entre pelo menos dois indivíduos. Um exemplo da importância da comunicação entre os animais está no fato de que, graças a esta, é possível que se haja o processo de aprendizado, outra característica humana indiscutivelmente aprimorada (Araújo, 2002). Em alguns animais determinados comportamentos são ensinados utilizando-se signos, de qualquer natureza que sejam capazes de servir como canal de comunicação (Andrade, 2006), em que cada geração com o objetivo de mantê-lo permanente e em constante melhoramento os utiliza, mesmo que este esteja ligado apenas à observação ou á maturação orgânica do individuo e seu próprio organismo. Ou seja, muitas formas de comportamento ocorrem apenas no citoplasma celular, sem que possam sequer ser detectados com uma simples observação (Araújo, 2002). Sendo assim, conclui-se que diversos fatores interferem nos comportamentos ligados a comunicação, entre outros,  que nem sempre são observáveis, a olho nu, ou sequer audíveis, mas encontram justificativa em sua genética/metabolismo celular.
Outro importante exemplo de comportamento humano é o afeto (do latim affectu), este se caracteriza, como um sentimento de inclinação para alguém, uma amizade, uma simpatia, uma paixão. Do ponto de vista evolutivo e biológico acredita-se que o estabelecimento da postura bípede tenha sido um dos fatores fundamentais para o desenvolvimento desse comportamento, pois ao se tornar bípede, as alterações pélvicas e anatômicas, principalmente nas fêmeas, fizeram com que apenas filhotes prematuros, consequentemente menores e mais frágeis, pudessem ultrapassar a barreira recente- fato que os faziam mais sensíveis aos perigos/condições do meio ambiente. Essa fragilidade provocou mudanças no comportamento dos pais com relação à forma e a maneira como precisariam despender maior cuidado parental bem como o aumento de sua duração. Ao mesmo tempo a neotenia apresentada pelos filhotes incitava ainda mais o apego por parte de seus progenitores. A importância da figura paternal, também sofre modificação, por exemplo: quando comparado com os demais mamíferos que tinham gestações mais longas e neonatos mais resistentes é visível, pois estes passam a ter maior envolvimento na criação dos filhotes, cujo aumento é significativo em comparação a outras espécies de mamíferos (De Toni, 2004). 
Pode-se notar também que o nascimento de um filhote não implica não apenas em um investimento entre mãe e pai, mas também do grupo todo. Nesse momento o apego ao filhote ocorre com mais força a medida que o mesmo apresenta características cada vez mais semelhantes a seus progenitores, esta é uma estratégia da seleção natural para garantir o apego aos pequenos. É curioso notar que comportamentos atuais como a necessidade do macho em garantir sua paternidade, foram estabelecidos nos primórdios da espécie onde o mesmo se mantinha próximo a fêmea antes, durante e depois da gestação, para garantir que seus genes seriam passados aos descendentes e que estes estariam hábeis pra se reproduzir. Tal proximidade fez com que cuidar do filhote lhe fosse vantajoso. Para que essa proximidade fosse garantida as fêmeas foram aos poucos perdendo as características que indicassem seu período fértil (De Toni, 2004). Por fim, o apego proporciona ao filhote àquilo que talvez, seja o item mais fundamental as espécies que dividem espaço com outros indivíduos da mesma: a sociabilidade. Isso graças ao fato de que ao dispender tal cuidado a prole, esta pode manter-se em contato com os demais indivíduos deste grupo a ao meio ambiente onde está inserido, o que leva, futuramente, a capacidade de sentir carinho e apego á outros além de seus progenitores, mantendo assim a estrutura social do grupo, importante para sua sobrevivência.
Do ponto de vista histórico, acadêmico e etológico, a compreensão das formas como os animais se comunicam, aprendem e desenvolvem apego aos demais, tem sido avaliada a séculos, os primeiros “estudos” datam de observações de Pitágoras (500 a.C), estudos de Hipócrates (450 a.C)por exemplo, traçavam comparações entre órgãos humanos e dos animais, já século 17 Descartes, atribuiu características como pensamento, sensibilidade e dor apenas a humanos pois estes eram os únicos a terem almas, o que justificava o uso cruel dos demais animais. A realização de estudos com animais de diferentes grupos, servia tanto para se compreender de forma comparativa o comportamento humano, quanto para entender o dos próprios animais, como nos estudos de psicologia experimental. Piaget e Lev Semenovitch Vygotsky, pesquisadores que contribuíram para a compreensão do aprendizado elaborando estudos (década 1970) que avaliavam a capacidade cognitiva –utilizando principalmente testes numéricos- de bebês, crianças e adultos, a partir destes estudos, pode-se traçar algo como uma “linha do tempo”, para as etapas do aprendizado de acordo com a idade do indivíduo e como este aprende de acordo com esta. A. R. Luria, na década de 1970 o pai da neuropsicologia, também colaborador dos acima citados, deu continuidade a tais estudos, que sugeriram que aprender é um processo que atribui significado ao que se é percebido, podendo ser transmitido através da linguagem, que surge da necessidade da criança em estabelecer comunicação com seu grupo. Com o avanço da neurociência e da tecnologia, descobriu-se, na década de 1990, que aprender e comunicar-se provoca alterações físicas e bioquímicas e até morfológicas no cérebro (Buonomano & Merzenich, 1998). Considerando sempre que nossas características biológicas, heranças de nossa história evolutiva, estabelecem limites físicos para tais comportamentos (limite de percepção do espectro luminoso, audição, olfato etc). Atualmente o foco das pesquisas relacionadas aos temas tanto de aprendizado quanto, comunicação trabalham lado a lado, onde a tecnologia, etologia e biologia (zoologia, evolutiva, comparativa) estabelecem ganchos a fim de esclarecer a fonte e a expressão de tais comportamentos, em humanos, em diversos outros grupos animais e em semelhanças entre estes. Estudos cuja principal aplicação se dá no ensino regular, especial, na psicologia e nos estudos das ciências sociais. Mas onde entra o afeto nessa história? O afeto oferece a base necessária para que um indivíduo cresça de forma saudável e seja capaz de se desenvolver individual e socialmente, propiciando a segurança que este necessita para tal, durante sua passagem entre a vida imatura até sua maturidade.
Por fim, nós formandas em Biologia podemos notar que assim como as demais espécies, os seres humanos possuem características biológicas únicas e/ou superdesenvolvidas que moldam nossos comportamentos e nossas maneiras de administrar nossas necessidades dentro do meio ambiente e dentro de uma sociedade. Para isso utilizamos de vários mecanismos dentre eles a comunicação, o aprendizado o afeto entre outros, que nos auxiliam a desempenhar tais tarefas.

O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia baseando-se nas obras:

Contribuições da etologia comparada para uma nova percepção da comunicação humana.  ARAÚJO, R. & PINHEIRO, R, L. 2002; Disponível em:
Etologia humana: o exemplo do apego. TONI, P,M. SALVO, C,G. et al. 2004
Comunicação e língua portuguesa, ANDRADE, M,M. 2006, 4ª edição.
Cortical plasticity: From synapses to maps. Buonomano, D. V. & Merzenich, M. M. (1998). The American Physiological Society,  VOL.80: 1765-1774
Teoria e prática na psicologia experimental a partir do estudo da  aprendizagem  Silva,J.A &  Barbosa, K.A, et. Al. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes/Departamento de Psicologia/MONITORIA.  
Psicologia e Neurociência cognitivas: Alguns avanços recentes e implicações para a educação. Andrade, P. E. Prado, T.S.P, Universidade Estadual Paulista
VIDEOS RELACIONADOS
Sobre o desenvolvimento da postura bípede, características sociais, comunicação e aprendizado:
Sobre as etapas do desenvolvimento da fala nas crianças: https://www.youtube.com/watch?v=vutQyXg0duo
Sobre as diferentes formas de aprendizado em humanos e aves: https://www.youtube.com/watch?v=QKSvu3mj-14

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