“Panelinha” ou Estratégia de Sobrevivência? Uma Perspectiva Científica a Respeito da Formação de Grupos Sociais.


Por Cecília Oliveira de Aguiar, Maynara Cherobin Martins, Raphaella Fornazari e Tatiane Mie Arakaki Moraes da Silva

Formandas de Biologia



Posicionamento político, referência de carreira, espiritualidade, vício em substâncias, capacidades e dificuldades intelectuais e desordens psiquiátricas são algumas das diversas características que têm influência genética e moldam quem nos tornamos ao longo dos anos. São vários os genes que somados são capazes de interferir na herança da personalidade, mesmo que de forma mínima. No entanto, sabemos que as experiências vivenciadas e as situações encontradas no ambiente contribuem, e muito, para a formação da personalidade (Nerdologia, 2017).
Acredita-se que a influência seja de 50% dos genes e 50% do ambiente, desta segunda metade, segundo Harris (1995), a atuação é muito maior dos ambientes não compartilhados com aqueles que nos criam, como por exemplo a escola, do que o ambiente familiar. Isso porque, durante a formação de vínculos, a personalidade desenvolvida dependerá muito mais do papel que aquele indivíduo desempenha no grupo. Em outras palavras, no caso de uma criança em fase de desenvolvimento, ela precisará se adaptar aos ambientes em que se é inserida, não necessariamente parecidos com a realidade encontrada em casa, dessa forma ela cria a sua própria personalidade (Nerdologia, 2017).
Sendo assim, a personalidade ditará os grupos sociais que temos afinidade e que nos dê a sensação de pertencimento. São inúmeros os grupos sociais que se encontram em diversas esferas da sociedade e culturas, como, por exemplo, a música, na qual cada um consome estilos musicais que mais lhe agrada e se aproximam de pessoas que compartilham deste gosto. Instintivamente ou não, esse hábito de formação de grupos na sociedade ocorre a todo momento, nos unimos com quem nos é parecido ou nos adaptando para se associar a um determinado grupo.
Não muito diferente pode ser observado na natureza, na qual, animais também formam alianças como estratégia de sobrevivência. A exemplo tem-se, pássaros em formação “V”, grupos de suricatos vigias (SOUZA JUNIOR et al, 2018) e cardumes de peixes (SUZUKI et al. 2008). São comportamentos coletivos mas que buscam a sobrevivência individual. Outro exemplo interessante é o caso das larvas dos insetos do gênero Perreyia, que pertencem à ordem Hymenoptera, são larvas que andam em grupo e fazem isso para parecerem maiores e afugentar predadores, estratégia essa que não seria eficaz caso fossem solitárias.

Quando nos sentimos pertencentes ou acolhidos por alguém, uma série de reações biológicas, mentais e fisiológicas podem ocorrer no nosso corpo:
1. Liberação de hormônios de bem-estar: Ser agregado em um grupo social pode desencadear a liberação de hormônios como a oxitocina, conhecida como o "hormônio do amor" ou "hormônio do apego". Esse hormônio está associado à promoção de sentimentos de confiança, empatia e conexão social.
2. Redução do estresse: O sentimento de pertencimento pode reduzir os níveis de cortisol, o hormônio do estresse, no organismo. Isso pode levar a uma diminuição da ansiedade e da sensação de ameaça, contribuindo para uma sensação geral de calma e segurança. Isso pode influenciar positivamente o sistema nervoso autônomo, levando a uma redução na atividade do sistema nervoso simpático, responsável pela resposta de "luta ou fuga". Isso resulta em um estado mais relaxado e menos ansioso. A interação social positiva e o apoio emocional proporcionados pelo grupo também podem modular a liberação de outros neurotransmissores, como a dopamina e a serotonina, que estão associados ao prazer e ao bem-estar emocional.
3. Fortalecimento do sistema imunológico: Relacionamentos positivos e sentimentos de pertencimento podem fortalecer o sistema imunológico. A redução do estresse e a liberação de hormônios associados ao bem-estar podem contribuir para uma melhor resposta imunológica.
4. Melhora no humor e na saúde mental: Sentir-se pertencente ou acolhido por alguém está associado a uma melhora no humor e na saúde mental. Relacionamentos positivos podem promover uma sensação de felicidade, satisfação e apoio emocional, reduzindo os sintomas de depressão e ansiedade.
5. Aumento da autoestima e autoconfiança: Quando nos sentimos aceitos e valorizados por outros, é mais provável que tenhamos uma visão mais positiva de nós mesmos.
6. Melhora na regulação emocional: Relacionamentos saudáveis fornecem um espaço seguro para expressar emoções, o que pode contribuir para uma melhor compreensão e gestão das mesmas.
Essas são algumas das maneiras pelas quais a sensação de fazer parte de um grupo social pode influenciar positivamente nosso corpo, mente e saúde em geral. Ter relações interpessoais saudáveis e significativas é essencial para o bem-estar. Em contrapartida, a rejeição pode, em alguns casos, aumentar a busca por afiliação e aceitação em outros grupos ou relações. Isso pode ser comparado a animais que, quando excluídos de um grupo, procuram novas associações sociais para satisfazer suas necessidades sociais. Do ponto de vista etológico, o sentimento de rejeição pode desencadear respostas comportamentais e emocionais que, em muitos aspectos, refletem adaptações evolutivas para lidar com situações sociais desafiadoras. As respostas à rejeição podem variar amplamente entre os indivíduos, mas muitas delas podem ser entendidas dentro do contexto da evolução e sobrevivência social.
A formação de grupos é um fenômeno fundamental para a sobrevivência e a evolução de diversas espécies, incluindo os seres humanos. Este processo amplamente estudado e documentado em campos como a biologia, psicologia e sociologia, apresenta inúmeras vantagens que corroboram a necessidade intrínseca de se agrupar.
Em primeiro lugar, a formação de grupos proporciona uma maior proteção contra ameaças externas. Nos reinos animal e humano, a coesão grupal aumenta a capacidade de defesa contra predadores. Esta proteção é resultante da força coletiva, onde indivíduos agem de forma colaborativa para assegurar a segurança do grupo como um todo.
Além disso, a formação de grupos está associada à otimização de recursos. A cooperação entre os membros permite a partilha de conhecimentos e habilidades, por exemplo, entre os primatas, a formação de grupos facilita a obtenção de alimentos, proteção de território e cuidado com os filhotes.
Do ponto de vista evolutivo, a formação de grupos desempenha um papel crucial na seleção natural. A tendência de se agrupar e cooperar entre indivíduos de uma mesma espécie é um traço evolutivo vantajoso, selecionado ao longo do tempo devido aos benefícios oferecidos em termos de sobrevivência e reprodução.
É importante ressaltar que estudos científicos indicam que até mesmo em sociedades humanas modernas, a formação de grupos continua sendo uma parte integral do nosso comportamento social. Desde comunidades locais até organizações globais, a capacidade de nos agruparmos e colaborarmos é a base para avanços tecnológicos, desenvolvimento econômico e inovação.
Em síntese, a formação de grupos é um fenômeno profundamente enraizado na história evolutiva das espécies, incluindo a nossa própria. Seja no reino animal ou humano, a coesão grupal representa uma estratégia adaptativa essencial para a sobrevivência, oferecendo vantagens em termos de proteção, cooperação, desenvolvimento social e evolução.
Como formandas em biologia pontuamos pelo texto a influência genética e ambiental na formação da personalidade, destacando a importância das experiências vivenciadas e do ambiente na moldagem do indivíduo. A discussão se aprofunda na ideia de que, embora os genes desempenham um papel significativo, a metade restante da formação da personalidade é fortemente influenciada por ambientes sociais. A personalidade, por sua vez, orienta a escolha de grupos sociais, evidenciando um padrão instintivo de busca por semelhanças e adaptação a diferentes ambientes. A comparação com comportamentos coletivos na natureza, como a formação de grupos de animais, reforça a ideia de que a formação de grupos é fundamental para a sobrevivência e evolução. O texto argumenta que a coesão grupal proporciona proteção, otimização de recursos, desenvolvimento social e emocional, destacando a importância contínua da formação de grupos na sociedade humana, desde comunidades locais até organizações globais, como uma parte integral do nosso comportamento social e evolutivo.


O presente ensaio foi elaborado para disciplina Biologia e Evolução do Comportamento Animal e teve como base as obras:

HARRIS, J. R. Where is the child’s environment? A group socialization theory of development. Psychological Review, v. 102, n. 3, p. 458–489, 1995. Disponível em: https://psycnet.apa.org/doi/10.1037/0033-295X.102.3.458 Acesso em: 18 nov. 2023.

NERDOLOGIA. O que dá nossa personalidade?, 2017 Youtube Disponível em: https://youtu.be/fiXPdWAmFyI?si=P6pzuGdJUBEX3pQG Acesso em: 18 nov. 2023.

SOUZA JÚNIOR et al. Osteologia do membro torácico de Lycalopex gymnocercus Fischer, 1814 (Carnivora, Mammalia): abordagens comparada, radiográfica e osteométrica. Pesquisa Veterinaria Brasileira, v. 38, n. 1, p. 195–221, 1 jan. 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1678-5150-PVB-5270 Acesso em: 19 nov. 2023.

SUZUKI, Fábio M. e Orsi, Mário L.. Formação de cardumes por Astyanax altiparanae (Teleostei: Characidae) no Rio Congonhas, Paraná, Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, 2008, v. 25, n. 3, pp. 566-569. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-81752008000300026 Acesso em: 19 nov. 2023.