Série Ensaios: Sociobiologia
por Flávia Camargo Cabral, Gabriela Meissner, Letícia Correa Marcondes, Maria Thereza Terras Pinto, Mariana Volpi Pospissil, Wilian Felipe Bugnhaki;
Acadêmicos dos cursos de Biologia e Enfermagem.
No dia 6 de fevereiro de 2022, foi publicado no site g1.globo.com uma matéria com o título “Pessoas com deficiência são vítimas de ataques de ódio nas redes sociais”. Nessa reportagem sobre preconceito, foram relatadas três histórias sobre ataques virtuais contra pessoas portadoras de deficiência. Uma delas foi contra um menino de três anos, com Síndrome de Down. A segunda é de duas irmãs, onde uma delas tem uma síndrome rara que altera a formação dos ossos da face. Por fim, a terceira história relatada é de uma mulher cadeirante.
O Preconceito é um comportamento que está cada vez mais sendo noticiado e podemos observar esse comportamento não somente nas pessoas como também na natureza, onde os animais tendem a se agrupar com os indivíduos semelhantes e afastar aqueles que são diferentes. Isso ocorre na tentativa de manter a integridade do próprio grupo, seja por um indivíduo deficiente deixar o grupo mais vulnerável ou por poder transmitir alguma doença aos outros componentes do grupo.
Os exemplos de preconceito na natureza são vários, mas vamos demonstrar alguns desses comportamentos já observados em animais sociais, como os humanos. Um dos casos trata do preconceito e aversão a indivíduos doentes em colônias de abelhas. Infecções como a cria pútrida americana em larvas geram a liberação de substâncias químicas, como ácido oleico e β-ocimeno, que são detectadas por abelhas que retiram as larvas da colônia, segundo Alison McAfee, pós-doutoranda do departamento de Entomologia e Patologia Vegetal da Universidade Estadual da Carolina do Norte.
Outro exemplo de preconceito com doentes foi observado por Jane Goodall em 1966 quando estudava chimpanzés no Parque Nacional Gombe Stream. Um dos chimpanzés, chamado McGregor, apresentava poliomielite e foi atacado e expulso do grupo por outros chimpanzés, além de ter sido rejeitado em tentativas de contato com membros do grupo. Foram observados outros indivíduos doentes que foram excluídos, mas alguns indivíduos infectados com poliomielite eram aceitos novamente no grupo. Algumas pesquisas afirmam que os chimpanzés demonstram medo e nojo pela desfiguração causada pela poliomielite, sendo, então, a visão é o sentido responsável por detectar a presença da doença nos chimpanzés.
Outro caso de preconceito é o infanticídio de um filhote de chimpanzé na reserva florestal Budongo, na Uganda, relatado por cientistas suecos da Universidade de Zurique. O motivo do assassinato foi o albinismo apresentado pelo filhote. Não havia deformações, o grupo de chimpanzés não estava em disputa com grupos rivais e o jovem não demandava maiores cuidados pela mãe, além do que já é esperado para um filhote saudável. Sendo, portanto, apenas um preconceito racial e estético, como visto em humanos. O infanticídio pode ter sido causado por simples estranheza na aparência do filhote ou por terem confundido o mesmo com indivíduos da espécie Colobus guereza, de coloração preta e branca.
Assim, nos componentes biológicos desse comportamento, é possível observar que morfologicamente os indivíduos de um grupo expressam uma reação de espanto, ao ver algum organismo da mesma espécie que seja diferente dele, esse comportamento pode ser devido ao medo do diferente, gerando uma cascata metabólica que altera fisiologicamente o animal, gerando seu afastamento e repulsa sobre o indivíduo estranho do grupo, sendo uma reação selecionada pela evolução, dificultando por exemplo a contaminação com agentes infecciosos. Outra explicação seria a sensação de ameaça, visto que o cérebro do animal pode entender que o outro indivíduo não é da mesma espécie ou possui alguma característica que pode trazer risco a saúde e integridade do animal. Quando o animal se sente ameaçado sabemos que diversas reações acontecem em seu sistema nervoso. Já a visão e o olfato são sentidos muito envolvidos no desencadeamento do comportamento de preconceito, visto que o cheiro de um animal doente ou a aparência deformada ou diferente de algum indivíduo do grupo pode levar a aversão, nojo, expulsão do indivíduo do grupo e até agressão e assassinato.
Nos humanos isso não é diferente pois ao nos sentirmos ameaçado, em situação de risco, medo ou estresse nosso organismo ativa um mecanismo que se chama reação de luta e fuga e na presença de estímulos ameaçadores há uma ativação do sistema nervoso simpático que é responsável pela liberação de substâncias importantes para que nosso organismo escolha entre a luta ou a fuga. E essa resposta ao estresse é responsável pela manutenção da vida e é extremamente essencial ao nosso organismo.
E para nós os componentes psicológico, cultural e o aprendizado têm mais importância com relação ao preconceito, visto que atitudes ensinadas e reforçadas durante a infância se tornam normais na vida adulta. Isso ocorre porque temos o contexto social, que têm grande interferência na prática do preconceito, então nos é ensinado, se não pelos pais, pela sociedade, que praticar preconceito é errado, e que em uma sociedade diversificada nós devemos aceitar as diferenças dos outros indivíduos. A moral, presente nas sociedades humanas, não é vista na natureza. Quando um indivíduo é expulso do grupo por ser diferente ou estar doente não existe empatia pelos outros membros, não se tem a noção do que seria certo ou errado, mas sim o que é instintivo e o que beneficia o grupo como um todo, independente dos males causados a um ou alguns membros desse bando.
Como contexto etológico, é possível observar que em outras espécies o preconceito também ocorre para garantir a integridade do grupo. Isso ocorre em colmeias de abelhas, onde os indivíduos que estão contaminados com uma doença bacteriana são removidos da colônia para não contaminarem os outros indivíduos. Nós, quando pegamos poliomielite, também desenvolvemos deficiências físicas devido ao comprometimento de neurônios motores. Esse comprometimento acometido por uma doença pode ser uma das explicações para o preconceito associado a pessoas com deficiência física.
Outro fator evolutivo, é que animais no ambiente natural ficam expostos à predadores, mas em grupo eles conseguem garantir a sua sobrevivência. Porém, grupos que possuem indivíduos com deficiência física, precisam depositar um cuidado maior sobre esse indivíduo que é mais vulnerável, fazendo com que o grupo todo se torne mais vulnerável, então é muito comum no reino animal o sacrifício ou abandono de filhotes mais fracos ou com deficiência. Essa pode ser mais uma explicação para o preconceito e isolamento contra os indivíduos portadores de deficiência física na nossa sociedade atual.
Nós como futuros Biólogos e Enfermeiros acreditamos que o comportamento animal é moldado por instinto, reflexo e aprendizagem. A aversão a certas aparências, por exemplo, foi muito importante para a sobrevivência das espécies, evitando a contaminação de todos os membros do grupo com alguma deficiência e que possuíam sentidos mais aguçados para essas situações, foi perpetuado pelas gerações e é mantido até hoje em várias espécies de animais, até invertebrados, como no caso das abelhas já citadas no texto. Entretanto, os humanos instituíram a moral e possuem consciência dos seus atos, sabendo quando suas atitudes prejudicam outras pessoas.
Logo, apesar do preconceito ser natural e estar presente em várias espécies, nas sociedades humanas ele deve ser repreendido, devido aos prejuízos que causa nos indivíduos que sofrem preconceito. Além disso, diferente de outros animais, possuímos tecnologias capazes de resolver certos problemas, como a criação de vacinas e medicamentos para evitar determinadas doenças e tratar certas patologias, evitando que elas se espalhem pela população.
Além disso, atualmente sabe-se que possuir uma deficiência não é algo que representa perigo a vida das outras pessoas, algo que, séculos atrás era tido como verdade, e, por isso muitas sociedades humanas da antiguidade excluíam ou sacrificavam pessoas portadoras de deficiência, acreditando que estas poderiam transmitir a deficiência, ou que simbolizavam azar ou trariam energias negativas. Pensamento que hoje não faz sentido, e que deve ser punido, pois a diversidade de cada um deve ser respeitada para que possamos viver harmoniosamente em sociedade.
O Presente ensaio foi elaborado para disciplina Biologia e Evolução do Comportamento Animal tendo como base as obras:
Chimpanzé albino é linchado e morto em infanticídio inédito; veja vídeo. Disponível em: <https://etosocio.com/comportamento-animal/infanticidio/>. Acesso em: 18 out. 2022
Disciplinas Fisiologia Veterinária I e II Universidade Federal Fluminense. Disponível em: <http://fisiovet.uff.br/sistema-nervoso/>.
O que é síndrome de Down. Disponível em: <http://www.movimentodown.org.br/sindrome-de-down/o-que-e/>.
Preconceito: o que é, quais os tipos, como existe no Brasil e mais! Disponível em: <https://www.stoodi.com.br/blog/portugues/preconceito/#:~:text=tipos%20de%20preconceito.->. Acesso em: 1 nov. 2022.
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