segunda-feira, 28 de novembro de 2022

A Felicidade Temporária ao Nível do Mar

Série Ensaios: Bioética Ambiental


Por Manuela Truiti e  Shadya Koffke do Amaral
mestrandas em Bioética






A reportagem reforça a necessidade de atenção dos países em relação as alterações climáticas, principalmente, aqueles em regiões costeiras que serão os primeiros a precisarem se adaptar aos primeiros resultados da ação humana sobre a natureza. É o que a Climate Central, expõe em pesquisa sobre a temática.

A água sempre foi um elemento chave na questão do impacto das mudanças climáticas. Dentro deste contexto, muito tem se falado e se preocupado com a elevação do nível do mar, que é um fenômeno físico consequente ao aumento da temperatura global em decorrência do acúmulo de gases do efeito estufa na atmosfera.

As consequências desse aumento do nível marítimo tem gerado grande debate e preocupação, conforme ilustrado pela reportagem “Futuro debaixo d’água: como será a elevação do nível do mar no mundo todo”, publicada no site da CNN em 12/10/2021. Segundo a reportagem, cerca de 600 milhões de pessoas estarão em risco caso a previsão de aumento em 3 graus da temperatura mundial aconteça, sendo que 385 milhões vivem atualmente em terras que serão inundadas pela maré alta, mesmo se as emissões de gases de efeito estufa forem reduzidas. Isso nos trás a grande questão: como deixamos chegar a este ponto?

É fato o desequilíbrio natural causado pela ação humana, guiada e desgovernada pela ambição de “sobreviver com qualidade", muitas vezes priorizando o lucro à sustentabilidade. O homem busca a felicidade e a sobrevivência, e dentro de uma visão antropocêntrica, utilitarista e porque não dizer “ignorante”, acaba por tê-las a curto prazo, sem pesar as consequências a longo prazo. O homem usufruiu dos recursos naturais para sua felicidade, mas agora depende da conservação dessa fonte para sua sobrevivência.

Apesar das mudanças climáticas afetarem a população do mundo todo, sempre há aqueles mais vulneráveis e que sofrem piores consequências. No caso do aumento do nível marítimo, é a população costeira, principalmente da região Asiática. O prejuízo é social, com necessidade de abandono de suas casas e de tudo que construíram ao longo da vida e também econômico, relacionado à perda da pesca, turismo, comércio, entre outros.

Mas felizmente há uma luz no fim do túnel… recentemente vem acontecendo uma mobilização social e de organizações, como a ONU, para discussão e busca de estratégias para atenuar estes desfechos. E assim vemos na prática o princípio bioético da compaixão, movido pelo movimento social de avaliar e identificar os problemas globais, buscando alternativas para proteger tanto o meio ambiente quanto a população exposta à degradação desse meio natural.

Diante dessa discussão, vamos centrar dois tópicos: a “felicidade temporária do homem” e “sobreviver com qualidade”; e reforçar a visão antropocentrista e utilitarista presente e que de certa forma, até mantém ou podem ajudar no equilíbrio ambiental.

Vamos traduzir os tópicos. Primeiramente discutindo o que é “sobreviver com qualidade”. O homem vive dentro de suas limitações lutando em busca de qualidade de vida e felicidade, e por isso “sobrevive”. É uma felicidade temporária, pois senão não estaríamos discutindo desastres ambientais e prejuízos à saúde humana e animal. E por sua “ignorância”, no sentido de não ter o conhecimento sobre a causa, da necessidade de proteção e do reconhecimento da natureza como fonte ao invés de recurso, a felicidade de usufruir a natureza e manter qualidade de vida, é de curto prazo.

Sobre ser utilitarista e antropocêntrica. É utilitarista sim, pois não temos como negar a necessidade do homem em explorar a natureza para sua sobrevivência e felicidade. E antropocentrista também, pois, mesmo que o homem entenda a natureza como fonte e não recurso, só a protege porque depende dela para a sobrevivência e felicidade. E como alcançar a justiça ética dentro desse cenário? Como a ética pode proteger a saúde global; prevenir desastres ambientais, promover à saúde única?


A resposta pode estar associada ao princípio da compaixão que por hora se apresenta ausente quando analisamos o papel do homem e sua “irresponsabilidade” frente ao meio ambiente, ao contribuir para o aumento do nível do mar por conta da emissão e aumento do efeito estufa, prejudicando seu próprio semelhante. E em outro momento, esse mesmo agente moral, pela compaixão, se preocupando com a situação global, estudando a atividade humana que impacta positiva e negativamente na vida do próximo, principalmente, aos mais vulneráveis.

Se o homem na luta por sua vida acaba por prejudicá-la e por isso, uma felicidade temporária; concluímos então que ela segue o nível do mar; quanto mais elevado o nível da água maior é a felicidade temporária.

Nós como futuras bioeticistas acreditamos que a mesma mão humana que trouxe até hoje a realidade triste e preocupante de um futuro saudável incerto pode trazer momentos de “pausa e reflexão” para as próximas ações mais conscientes e sustentáveis. O mesmo homem que por hora se apresenta utilitarista precisará enxergar a natureza como fonte e protetor dela. Que o mesmo homem que se vê no centro do universo, irá se entender no contexto com o meio natural e operante e receptor de toda e qualquer mudança que faça sobre esse meio. Não há mais como separar o homem e colocá-lo no topo da cadeia, pois ele se afunda no mesmo mar que ele próprio fez crescer. A compaixão é um princípio necessário, assim como outros valores humanos que buscam a justiça ética de um globo e de tudo que nele pertence de forma indissociável.



Este ensaio foi elaborado para a disciplina de Bioética Ambiental e teve como referência os seguinte material:
FISCHER M.L.; MOLINARI, R. B. Bioética ambiental: a retomada do cunho ecológico da bioética. in SGANZERLA, A. SCHRAMM F.R. (Org). Fundamentos da Bioética. Série Bioética vol. 3 Curitiba: CRV, 2016 p. 233-253.
SGANZERLA, A.; ZANELLA, D. C.; GRAESER, V. Potter e o equilíbrio do ecossistema como fundamento da moral e da bioética. Revista Ibero-americana de Bioética, Vol. 17, 2021, p. 01- 13
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