Série Ensaios? Bioética Ambiental
Por Jaqueline
Stramantino
Nutricionista e
mestranda em bioética
A matéria intitulada “Cientistas buscam animal "cobaia perfeita" para remédios contra coronavírus”, noticiada pelo portal UOL, citava que “os cientistas devem testar os medicamentos em ratos, furões, hamsters e até macacos para minimizar os riscos de testes em humanos. No mundo todo, diversos laboratórios estão criando "estoques" de ratos geneticamente modificados e estão testando a suscetibilidade de outros animais, que tendam a ter os mesmos sintomas que os humanos. ” E em outro ponto “Os laboratórios não têm à mão espécimes vivos de cada tipo de animal. Eles congelam esperma ou embriões, e quando há necessidade usam essas amostras para construir novas colônias. ”
Notícia de caráter emblemático, uma vez que, não se sabe ao certo qual o risco que esses animais geneticamente modificados causam. Seus defensores acreditam que podem ser a solução para problemas como fome, clima e tratamento de doenças, já quem é contra, destaca que os impactos sobre alimentos, saúde, agricultura, meio-ambiente e sociedade podem ser piorados com esses animais.
O fato é que o uso de animais geneticamente modificados é uma realidade, o Jackson Laboratory tem 11 mil linhagens de camundongos geneticamente modificados em seus tanques de criopreservação, algumas dessas linhagens para estudos de tratamento de câncer outros de diabetes e outros de doenças raras.
Existem dois tipos de animais geneticamente modificados, no primeiro grupo, conhecido como animal transgênico um segmento do DNA é introduzido ao seu genoma o que induzirá a expressão de novos genes. No segundo grupo, chamado de animal knockin, ocorre uma inativação ou modificação de um gene.
Nesse sentindo, encontra-se exposto falhas em alguns princípios, como o da igual consideração de interesses, pois os animais estão sendo usados para beneficiar os humanos, partindo de uma visão totalmente antropocentrista. Além disso, o princípio da não-interferência, pois descreve que não se deve manipular, controlar, modificar, manejar ou intervir ecossistemas naturais em seu funcionamento normal, também viola o princípio da fidelidade. Uma vez que, existe uma total quebra de confiança na relação animal-humano, quando esse animal é confinado e submetido a vários testes genéticos. Outro princípio para destacar é o princípio da senciência.
A senciência nada mais é do que a capacidade de sentir dor, sendo ela um mecanismo de defesa, que quando não observada pode causar sofrimento, sendo que um animal não possui interesse em sofrer. Peter Singer, filósofo utilitarista, do século XX, adota um posicionamento sencioncêntrico, frente essa questão, relatando nas suas obras que não temos o direito de explorar os animais o fato deles pertencerem a outra etnia e possuírem menos inteligência que os seres humanos, não nos dá o direito de superioridade sobre eles.
Com a ascensão das doenças, o uso de “cobaias perfeitas” demostra avanço nos tratamentos e medicamentos mais eficazes e seguros, como, por exemplo, o uso de camundongos geneticamente modificados para o Covid-19. A ideia para o coronavírus surgiu de um pesquisador da China, assustado com a proporção do vírus e como os camundongos sem ser geneticamente modificados morriam ao serem infectados com o vírus desenvolveu um animal resistente ao Covid-19. Todavia, estamos no século XXI, com todos os avanços tecnológicos ainda existem animais sofrendo, morrendo e sendo descartados em laboratório como objetivos em prol do bem-estar humano.
Além disso, caso os animais humanos sofrerem um dano maior por sua morte. Seria moralmente justificável escolher a vida de um ser humano sobre a vida de um animal, pois a perda da vida do animal geraria menos danos. Como é o caso da pandemia do Covid-19 que até o atual momento matou 1.338.100 no mundo e 168.141 no Brasil. Porém, um meio termo nesse debate para não causar sofrimento animal e não impedir o avanço da ciência seria utilizar os animais para fins de pesquisa, desde que haja impedimento de sofrimento e dor desnecessário.
Assim, caso a manipulação genética animal gere resultados positivos, beneficiando grande parte da população, a mesma seria considerada justificável sob a visão sensiocêntrica de Peter Singer, desde que, sejam tomadas medidas para reduzir o sofrimento animal ao máximo e proporcionar condições boas de vida e manutenção para esses seres. Porém, um dilema ético é levantado, será que se o Covid-19 estivesse afetando os animais como está afetando os seres humanos, nós tomaríamos medidas para proporcionarmos condições que não agredissem sua senciência?
Essa pergunta, apresenta um tom negativo, quando é pensando que o governo da Dinarmarca anunciou no começo desse mês, novembro/2020, que iria sacrificar milhões de visions para evitar as mutações do coronavírus, pois segundo o governo do país, seria necessário sacrificar esses animais em prol do tratamento para a doença, uma vez que, a mutação através dos visions poderia reduzir os anticorpos reduzindo a eficácia da vacina em humanos. Além disso, esses animais viviam em ambientes superlotados e contaminaram 12 pessoas. Parece não haver respostas realmente positivas para isso, posto que, os moradores da região em que os visions foram mortos, estão pedindo para as autoridades os cremarem, pois há relatos que eles estão se mexendo nas covas, quando o que na verdade ocorre é que os gases da decomposição são liberados os animais podem ser empurrados para fora do chão.
Nesse cenário, a senciência desses animais é colocada à prova, já que, esses animais, não possuem intenção de sofrer, mesmo sendo justificado que haja interferência com a vacina para humanos contra a Covid 19.
Outras tecnologias e recursos adaptados para os visions poderiam ser utilizados e pesquisados, com tecnologias “mais humanas”, afim de evitar a morte de milhões de animais, dado que na declaração universal dos diretos dos animais, se proíbe sofrimento físico ou psicológico, mesmo quando existe interesse humano.
Por fim, como nutricionista e futura bioeticista, acredito que para a construção de um mundo mais justo e igualitário, o caminho será reeducar a sociedade para que com o avanço da tecnologia, não seja preciso invisibilizar e explorar os animais, porque enquanto a raça humana, prevalecer como soberana, seres sencientes serão maltratados, violentados e suas escolhas não serão respeitadas. Os direitos dos animais devem ser considerados equivalentes ao dos seres humanos.
O presente ensino foi elaborado para disciplina de Bioética ambiental, se baseando nos textos:
COSTA, T.E.M.M et al. Avaliação de risco dos organismos geneticamente modificados. Ciênc. saúde coletiva. Rio de Janeiro, volume 16, n. 01, 2011.
FAGUNDEZ, G.T. Abordagem ético-legal dos direitos dos animais transgênicos. Universidade federal de Santa Catarina centro de ciências jurídicas departamento de direito. Trabalho de conclusão de curso: Florianópolis. 2016. 67p.
LUNA, S.P.L. Dor, senciência e bem-estar em animais. Ciênc. vet. tróp. Recife, volume 11, n. 01, p.17-21, 2008.
MEDEIROS C.A. DO ANTROPOCENTRISMO AO ECOCENTRISMO: subjugando o dilema da (não) atributividade de direitos fundamentais aos animais em decorrência do princípio da senciência. Fundação escola superior do ministério público. Dissertação: Porto Alegre. 136p.
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