Preconceito por pessoas com maior potencial de contágio de COVID-19


Série Ensaios: Sociobiologia



Por: Bruna Karoline, Giovanna Krepel, Jennifer Zdepski e Milene Taufer

Graduandos de Biologia e Psicologia





O ano é 2020, mais de 100 mil mortes foram registradas mundialmente em um curto período de tempo. Uma crise ambiental!? Guerras!? Não. A razão por trás deste número de óbitos tão expressivo é o que a OMS declarou como pandemia. O assunto mais comentado nos últimos meses em todos os países é o vírus Sars-Cov-2, também conhecido como novo coronavírus. Certamente esse ano ficará marcado na história como um período turbulento vários países com diferentes esferas sociais, pois o cenário atual é catastrófico e, segundo pesquisas, está longe de acabar.

Devido ao alto grau de contágio do vírus, se fez necessário o distanciamento social e a paralisação de comércios e estabelecimentos de consumo, fato que divide opiniões em todo o território nacional. Enquanto parte da população ressalta a importância da quarentena para o achatamento da curva entre a quantidade de leitos hospitalares e pacientes com casos graves da doença, outra parte defende que o distanciamento não é necessário e que existem outras formas de se conter a propagação do vírus, de modo a não afetar a economia mundial. Considerando estes métodos, um apresentador de uma emissora Brasileira sugeriu, ao vivo em rede nacional, a construção de campos de concentração para o tratamento de infectados pelo coronavírus. Segundo ele, as pessoas receberiam um tratamento adequado nestes locais e poderiam ser realocadas na sociedade após a recuperação, de modo que o comércio poderia voltar a funcionar normalmente. É importante ressaltar que os campos de concentração, termo empregado pelo jornalista, eram utilizados para o extermínio de pessoas judaicas durante a Alemanha nazista.

Conquanto, viver em sociedade não é algo exclusivo do ser humano, outras espécies de animais também adotam esse comportamento. A seleção natural, em conjunto com as necessidades de sobrevivência, indicam congruências entre o comportamento dos indivíduos e a transferência genética para gerações futuras (Alcock, 2010), considerando o que for mais benéfico. Deve-se entender que isso não ocorre de um dia para outro, pois a evolução não é algo instantâneo e muito menos pensado. Os indivíduos alteram seu comportamento apenas para fins homeostáticos, buscando sempre o que for mais agradável para si, mesmo que isso remeta conviver com o outro. Apesar das vantagens de se viver em sociedade, associadas principalmente ao aumento de proteção e facilidade na busca por alimento e reprodução, o contato entre os indivíduos também facilita a propagação de vírus e outros microorganismos, situação essa bastante visível no cenário atual.

O distanciamento social é evidente em muitas espécies, mas algumas apresentam atitudes mais agressivas, relacionadas até mesmo a expulsão do indivíduo infectado. Segundo uma matéria publicada pela National Geographic (2020), estudos demonstram que quando membros de colônias de abelhas são infectadas por doenças bacterianas, que acometem principalmente larvas, os indivíduos liberam substâncias químicas (ácido oleico e β-ocimeno) possíveis de serem percebidas pelos demais membro da colônia, que os removem fisicamente da colmeia a fim de evitar mais contaminação. Outro exemplo dessa situação é o que acontece com a rã-touro-americana, pois devido a liberação de feromônios, os girinos desta espécie conseguem identificar doenças fúngicas e evitar contato com os infectados.

O mesmo ocorre quando trata-se de acasalamento, pois os indivíduos fazem seleções, buscando por parceiros saudáveis. Essa ação pode ser induzido sem o conhecimento do organismo ou guiada pela aparência. Segundo Alcock (2010), estudos com aves demonstraram que certos ornamentos e exibições durante o cortejo atuam na seleção das fêmeas ao escolher seu parceiro reprodutivo. Um exemplo disso é a coloração das penas, visto que, uma ave com alto índice de parasitas tem seu sistema imunológico afetado, e portanto, não possui cores tão chamativas comparado aos machos da mesma espécie que estão saudáveis, desse modo as fêmeas têm preferência sexual aos machos com coloração mais viva. Outro exemplo de  seleção, desta vez inconscientemente, é o que acontece em grilos da espécie Teleogryllus oceanicus, cujas fêmeas têm mais propensão de serem atraídas por cantos de machos com sistema imunológico forte, em comparação com a de cantos com sistema imunológico fraco. 

Analisando a perspectiva etológica, o preconceito com pessoas de maior potencial de contágio está presente dentro das interações dos indivíduos, mais especificamente no comportamento social em que há  formações de grupos movidas pelos mesmos ‘’ideais’’, neste caso o elemento segregador, ou seja, o que separa o grupo dos demais é a enfermidade. Do ponto de vista biológico, uma série de fatores são responsáveis por esse distanciamento e preconceito, dentre eles, fatores hormonais como a liberação da adrenalina e noradrenalina, que tendem a ser liberados em momentos de medo e fuga. Outro fator está relacionado com o sistema imunológico dos indivíduos dentro de uma população, em um momento de desequilíbrio em resposta de uma doença, terá soluções diferentes para a situação, e nesse sentido, se isolar da comunidade voluntariamente é um ato de respeito e altruísmo pelo próximo. Do ponto de vista genético o chimpanzé é o principal elo dos seres humanos com os outros animais, mesmo os chimpanzés que possuem características muitas vezes hostis, dentro do seu grupo social zelam pela comunidade, tendo maiores cuidados com os filhotes e parentes doentes (AMORIM, 2000).

 Nós como quase biólogos, identificamos que dentro da espécie humana não é aceitável, sob hipótese alguma, excluir os membros integrantes da sociedade, e muito menos deixá-los reclusos em locais como os campos de concentração - que remetem todo o sofrimento de uma população. A vulnerabilidade causada pela doença só ressalta a necessidade de atenção e cuidado que os infectados devem receber, pois em tempos como esses, precisamos ser mais mutualísticos e menos segregadores.



O presente ensaio foi elaborado para a disciplina de etologia, se baseando nas obras:



ALCOCK, John. Comportamento animal: uma abordagem evolutiva. Artmed editora, 2010.

COMBS, S. Animais selvagens também praticam o distanciamento social para evitar adoecer, 2020. Disponível em: . Acesso em: 28 abr. 2020

Amorim, A. R. F. Aspectos do comportamento dos chimpanzés (Pan troglodytes), 2000.