Série Ensaios: Ética no Uso animal
Por Natalia Pineda de Paula
Bióloga e discente do curso de Especialização em Conservação da Natureza e Educação Ambiental (PUCPR)
Nos últimos anos a reflexão ética quanto às relações entre humanos e animais tem sido cada vez mais evidente(1). Ainda assim, é uma questão que se encontra distante do ideal, pois ainda conhecemos muito pouco sobre os animais que nos cercam e como se sentem dentro do mundo que criamos para eles. A maioria da população ainda caracteriza os animais como um bem de uso, o que resulta em sofrimento e comprometimento do bem-estar desses seres(2).
Um dos inúmeros usos que destinamos aos animais, é como companhia. Cães e gatos passaram por milhares de anos de domesticação para essa finalidade, nem sempre atingindo as necessidades do animal nesse processo(2). Nesse espectro, o problema se torna ainda mais latente quando passamos a aderir animais selvagens para suprir a necessidade humana de aproximação com a natureza. A partir daí, começamos a incentivar a terceira maior atividade ilegal do mundo: o tráfico de animais(3).
A ONG Projeto Mucky acolheu, em março de 2019, 68 filhotes de saguis entre dez dias e três meses de vida que foram resgatados em operação conjunta contra o tráfico de animais silvestres das polícias Civil e Ambiental de São Paulo. Os animais foram trazidos da Bahia, trancados em compartimentos pequenos, sem água e comida, e seriam vendidos por R$100,00 cada. Junto com os saguis havia também mais 120 aves de diferentes espécies, algumas já mortas(4). Esse é apenas um exemplo dentre inúmeros casos relacionados ao tráfico que temos em nosso país.
Esse cenário vem de uma demanda que muitos acreditam que deve ser estimulada em respeito ao desejo humano em ter um animal silvestre e, por essa razão, a prática deveria ser amplamente legalizada. Em contrapartida, outra parcela da população acredita que mesmo que nascidos em criadouros comerciais autorizados, a venda desses animais apenas reforça o tráfico, como mostram os dados que cerca de 60% das espécies criadas em cativeiro são também as mais traficadas(3).
No geral, quem é a favor do comércio de animais silvestres se pautam na ética ecocêntrica, que parte do princípio do ecossistema e o uso de animais é justificado por uma relevância para todos. Assim, não há problema em utilizar alguns desde que não afete o todo. Já os que são contra se embasam na ética biocêntrica, levando em conta o bem-estar animal e a vulnerabilidade. Nesse caso, quando há alternativas para que o animal não sofra, é imoral causar mal-estar.
O fato é que ter um animal silvestre em ambiente doméstico torna impossível gerar bem-estar e satisfazer suas necessidades, em especial pela privação do seu comportamento natural. Além disso, as consequências para o ambiente natural são várias, como: diminuição de populações da espécie, podendo levar até à extinção, desequilíbrio ecológico nas cadeias tróficas, perda ou diminuição de serviços ecológicos, riscos à saúde humana, entre outras(2,5).
Essa última traz, inclusive, danos diretos aos humanos por conta de zoonoses. As doenças infecciosas transmitidas entre animais domésticos e seres humanos são bem conhecidas por conta de sua proximidade, tendo tratamentos bem estabelecidos. Porém, os agentes com potencial de transmissão entre animais silvestres e humanos são desconhecidos. Isso significa que o contato próximo pode gerar problemas em escalas inimagináveis(5).
A reflexão que gostaria de deixar como profissional da área e em especial para o momento presente é: se karma é uma espécie de lei universal de causa e efeito em que toda ação tem consequências futuras, sendo que boas ações levam a bons resultados e más ações a resultados ruins, seria o vírus Sars-Cov-2 nosso karma frente nossas postura danosa para o meio ambiente? Seria resultado do contato próximo e muitas vezes abusivo com os animais selvagens? Quais são as considerações que vamos levar para vida quando o período de contágio terminar?
Nós, humanos, como seres racionais, temos uma responsabilidade moral com as outras espécies. Criar um mundo melhor se dá também pela preocupação genuína com o sofrimento do outro e, por isso, é importante se atentar aos desejos, necessidades e sentimentos dos animais. Existem alternativas para estabelecer uma cultura de não-agressão com todos os seres vivos e essa reconexão permite menos danos ao meio ambiente, oferece menor risco a saúde humana e proporciona maior bem-estar a todos os envolvidos(2).
Um dos inúmeros usos que destinamos aos animais, é como companhia. Cães e gatos passaram por milhares de anos de domesticação para essa finalidade, nem sempre atingindo as necessidades do animal nesse processo(2). Nesse espectro, o problema se torna ainda mais latente quando passamos a aderir animais selvagens para suprir a necessidade humana de aproximação com a natureza. A partir daí, começamos a incentivar a terceira maior atividade ilegal do mundo: o tráfico de animais(3).
A ONG Projeto Mucky acolheu, em março de 2019, 68 filhotes de saguis entre dez dias e três meses de vida que foram resgatados em operação conjunta contra o tráfico de animais silvestres das polícias Civil e Ambiental de São Paulo. Os animais foram trazidos da Bahia, trancados em compartimentos pequenos, sem água e comida, e seriam vendidos por R$100,00 cada. Junto com os saguis havia também mais 120 aves de diferentes espécies, algumas já mortas(4). Esse é apenas um exemplo dentre inúmeros casos relacionados ao tráfico que temos em nosso país.
Esse cenário vem de uma demanda que muitos acreditam que deve ser estimulada em respeito ao desejo humano em ter um animal silvestre e, por essa razão, a prática deveria ser amplamente legalizada. Em contrapartida, outra parcela da população acredita que mesmo que nascidos em criadouros comerciais autorizados, a venda desses animais apenas reforça o tráfico, como mostram os dados que cerca de 60% das espécies criadas em cativeiro são também as mais traficadas(3).
No geral, quem é a favor do comércio de animais silvestres se pautam na ética ecocêntrica, que parte do princípio do ecossistema e o uso de animais é justificado por uma relevância para todos. Assim, não há problema em utilizar alguns desde que não afete o todo. Já os que são contra se embasam na ética biocêntrica, levando em conta o bem-estar animal e a vulnerabilidade. Nesse caso, quando há alternativas para que o animal não sofra, é imoral causar mal-estar.
O fato é que ter um animal silvestre em ambiente doméstico torna impossível gerar bem-estar e satisfazer suas necessidades, em especial pela privação do seu comportamento natural. Além disso, as consequências para o ambiente natural são várias, como: diminuição de populações da espécie, podendo levar até à extinção, desequilíbrio ecológico nas cadeias tróficas, perda ou diminuição de serviços ecológicos, riscos à saúde humana, entre outras(2,5).
Essa última traz, inclusive, danos diretos aos humanos por conta de zoonoses. As doenças infecciosas transmitidas entre animais domésticos e seres humanos são bem conhecidas por conta de sua proximidade, tendo tratamentos bem estabelecidos. Porém, os agentes com potencial de transmissão entre animais silvestres e humanos são desconhecidos. Isso significa que o contato próximo pode gerar problemas em escalas inimagináveis(5).
Nós, humanos, como seres racionais, temos uma responsabilidade moral com as outras espécies. Criar um mundo melhor se dá também pela preocupação genuína com o sofrimento do outro e, por isso, é importante se atentar aos desejos, necessidades e sentimentos dos animais. Existem alternativas para estabelecer uma cultura de não-agressão com todos os seres vivos e essa reconexão permite menos danos ao meio ambiente, oferece menor risco a saúde humana e proporciona maior bem-estar a todos os envolvidos(2).
O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Ética no uso de animais e bem-estar animal, baseando-se nas obras:
(1) FISCHER, M. L.;
OLIVEIRA, G. M. D. Ética no uso de animais: a experiência do Comitê de Ética no
Uso de Animais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Estudos de
Biologia, v. 34, n. 83, 2012.
(2) WSPA. Sociedade
Mundial de Proteção Animal. Vídeos: Animais Seres Sencientes - 8 partes - WSPA
Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=rF1wXCVMDE0&t=12s. Acesso
em 02 abr. 2020.
(3) WORLD ANIMAL
PROTECTION. Proteção Animal Mundial. Animal silvestre não é pet.
Disponível em: https://www.worldanimalprotection.org.br/silvestre-nao-e-pet.
Acesso em 02 jun. 2020.
(4) LARA, M. Estadão.
ONG acolhe 68 filhotes de saguis que estavam sendo vendidos a R$ 100 em SP. 14
mar. 2019. Disponível em: https://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,ong-acolhe-68-filhotes-de-saguis-apreendidos-em-operacao-contra-trafico-de-animais-silvestres,70002755351.
Acesso em 04 abr. 2020.
(5) UFMG. Universidade
Federal de Minas Gerais. Tráfico de animais silvestres: tratamento,
recuperação e soltura. 12 ago. 2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Mm1UE4IqBCA. Acesso
em 04 abr. 2020.
Imagem: Saguis foram
resgatados em uma operação contra o tráfico de animais silvestres. Foto:
Divulgacão/Projeto Mucky. (https://img.estadao.com.br/resources/jpg/2/3/1552591149932.jpg)Vídeo:
Karma | Projeto Mucky (https://www.youtube.com/watch?v=Z-nZLbitjaM)