segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Refugiados – o passado bem sucedido dos novos brasileiros


Série Ensaios: Sociobiologia

Por Ana Carolina Grabowski de Souza; Gabriel Felipe de Freitas; Juliane Lisboa Scroccaro; Mariana Luísa Martines; Mariana Mota Nogueira da Costa; Milena do Prado Portes; Millena Kwaczynski; Natália Janke

Maio de 2015. O congolês Jeff Bobolibanda pousa no aeroporto de Guarulhos, fugindo da cadeia no Congo, sem maiores expectativas, buscando apenas segurança e uma qualidade de vida melhor. Sua vida e sua experiência como refugiado foram retratadas na reportagem da BBC Brasil onde Jeff conta que ainda tem planos de trazer a família (a esposa e os três mais novos dos cinco filhos). Bobolibanda, assim como tantos outros, buscou o Brasil para se abrigar dos perigos e “desafios” de seu país. Mesmo com diploma universitário, algumas vezes até mais de um, esse grupo de pessoas é condenado a viver em subempregos, quando empregados, raramente voltando a exercer suas formações acadêmicas. 

As causas dessa imigração forçada são as mais variadas: crises políticas e econômicas, catástrofes naturais e até mesmo perseguição cultural. No Brasil, os maiores números de pedidos de refúgio vêm da Venezuela e Cuba, locais que sofrem com os governos ditatoriais  autoritários ali instaurados. Além disso, desde o devastador terremoto de 2010, o Haiti também está no top 3 em números de pedidos de refúgio. A degradação da natureza, um dos aspectos centrais que compõem o território, compromete a manutenção dos indivíduos em sua base territorial, forçando-os a migrarem em busca de locais mais seguros que proporcionem melhores condições de sobrevivência. Nessa dinâmica, os deslocados ambientais estabelecem, concomitantemente, seus processos de desterritorialização e reterritorialização A maior parte dos indivíduos afetados por adversidades ambientais detêm poucos recursos financeiros; já os que contam com mais recursos, territorializam-se em ambientes mais seguros e, por isso, possuem melhores condições de resistirem aos deslocamentos, ou seja, têm sua territorialidade melhor consolidada. Só em 2017, o Brasil recebeu 2362 pedidos de refúgio do país da América Central. Enquanto os venezuelanos se concentram na precária região norte do Brasil, os haitianos se espalharam por todo o país, em número mais expressivo no sudeste e sul do país. A recepção dos brasileiros não é das melhores. Entre casos de violência e discriminação, o preconceito é o fator em comum. A falta de vagas tanto para imigrantes quanto para os próprios brasileiros e a péssima recepção de patrões e dos outros empregados é um reflexo do preconceito e dos mecanismos biológicos e psicológicos de defesa de todo ser homem.
O condicionante biológico pode ser identificado no fato do racismo sempre ter sido marcante na história da sociedade. A ideia de raça, utilizada para justificar maus tratos e massacres, era e às vezes ainda é claramente difundida entre as pessoas. Porém, do ponto de vista genético, não existe de fato o conceito de raça humana. Estudos realizados ao longo dos anos relevam que há mais diferenças entre dois indivíduos quaisquer do que entre duas raças, e apenas o gene de alguém não é suficiente para encaixá-lo em alguma. Hoje em dia, o racismo, além de crime, já foi eliminado pela ciência. De acordo com estudos, não existem genes exclusivos de uma população, nem grupos. Não há dúvida que os genes não são suficientes para julgar alguém, e que somos mais do que a cor da nossa pele.
O condicionante etológico pode ser identificado ao analisarmos um estudo feito na década de 1950 por Peter Marler apresentado no livro “Comportamento Humano: Uma Abordagem Evolutiva” em relação ao canto de machos de aves, em especial ao do tico-tico-da-califórnia, mostra que não é o fator genético que influencia essas aves, mas sim o fator ambiental. Os diferentes dialetos entre os cantos dessas aves demonstram que nem a distância, seja ela a mínima entre uma determinada região, as espécies de aves possuem um canto que as diferencia. Ou seja, por mais que sejam da mesma espécie, morando em locais diferentes, o seu canto muda de acordo com o ambiente. Assim acontece conosco, seres humanos. Nascemos em uma cidade, adquirimos manias, sotaques e ao sairmos de nosso local de origem, passamos por experiências diferentes, o que desencadeia mudanças em nosso comportamento, já que estamos recebendo diferentes estímulos.
Em relação ao condicionante psicológico, os indivíduos possuem grupos de acordo com as semelhanças de características (podendo ser elas físicas, ideológicas, intelectuais e emocionais), de acordo com sua identificação. A própria divisão em grupos já pode causar a estereotipação de outros grupos através da redução deles à apenas uma característica e o preconceito surge por considerar outros grupos como sendo inferiores ao de pertencimento dos indivíduos. Os indivíduos, ao julgarem outros grupos como inferiores, atribuem a eles características negativas.
O congolês Jeff, por exemplo, demorou meses até conseguir se reestabelecer em sua antiga profissão, e foi ensinado que, por ser refugiado, não deveria receber salário todos os meses, enquanto os brasileiros recebiam normalmente, fruto do preconceito e rejeição imediata de muitos brasileiros. A CEO da empresa de investimentos onde Jeff atualmente trabalha se chocou com a informação, ainda muito comum em vários ambientes que escolhem (ou não) receber pessoas nessa condição como empregadas.
Uma das maiores dificuldades para refugiados, e até mesmo para brasileiros que se formam fora do país, é a revalidação do diploma. Esse ato continua sendo cheio de burocracias, mesmo com as novas leis implantadas no país. O prazo para a revalidação leva em cerca de 180 dias para ser processado, conforme o Ministério da Educação. Em maio de 2016, o mesmo ministério aprovou uma resolução, onde todas as universidades públicas do Brasil fariam o reconhecimento de diplomas de graduação, mestrado ou doutorado expedido por universidades estrangeiras. Os valores são altos, chegam até a 2000 reais (universidades estaduais em SP e RJ oferecem esse serviço gratuitamente), além dos custos com traduções de diplomas e currículos, o que torna essa opção inacessível para alguns dos refugiados.
Algumas empresas e instituições já oferecem apoio e ajuda aos estrangeiros que buscam se enquadrar novamente no mercado de trabalho. A ACNUR (Agência da ONU para Refugiados), por exemplo, organizou um projeto chamado de “Talentos Invisíveis”, onde refugiados tem a oportunidade de mostrar suas formações acadêmicas e capacidades em vídeos. A “Abraço Cultural” promove cursos de cultura e idiomas em São Paulo e Rio de Janeiro. O Instituto ADUS de Reintegração também é destaque nesse ramo de ONGs.
Refugiados e imigrantes tem uma história, uma vida que deixaram para trás, e querem a oportunidade de recomeçar sua vida em melhores condições. 
Nós, como futuros psicólogos, acreditamos que acolhê-los e proporcionar a eles conforto e possibilidade de adaptação é nossa obrigação e dever como cidadãos de um país miscigenado e multicultural, que conta com todos para continuar progredindo passo a passo. 


O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia, tendo como base as obras:
ALCOCK, JOHN. Comportamento animal: UMA ABORDAGEM EVOLUTIVA. 9 ed. Porto Alegre: ARTMED, 2011. 624 p.

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