terça-feira, 13 de junho de 2017

AMOR AO FILHOTE: um comportamento genuíno ou seletivo?

Série Ensaios: Sociobiologia
Por  Beatriz Raymann, Fernanda Schneider, Gustavo e Maria Clara Nunes
Acadêmicos do Curso de Biologia


Desde algum tempo, a sociedade vem discutindo assuntos de extrema importância para a saúde da mulher, um desses exemplos é a liberação do aborto que agora entrou em vigor pelo STF,  no qual o Supremo tribunal Federal  constou que abortar até o 3 mês de gravidez não será mais considerado crime, e a autoria dessa lei  tem o objetivo de proteger a   saúde da mulher brasileira, para que casos como mortes em clínicas clandestinas não ocorram.  Um caso brasileiro recente de aborto ocorreu no Rio de Janeiro, foi de uma paciente do Hospital Municipal Fernando Magalhães, em São Cristóvão, na zona norte da cidade, em maio de 2014. A paciente chegou à maternidade com 12 semanas de gestação, apresentando o comprovante do diagnóstico de anencefalia, contando com três exames de ultrassonografia obstétrica, declarando a má-formação do feto. Mesmo assim, após 4 dias internada e com o diagnóstico de anencefalia do feto confirmado, a mulher recebeu alta e foi orientada pelos médicos a recorrer à Justiça para conseguir a autorização para a realização do aborto. Não autorizada, a paciente teve que esperar a gestação chegar até o final, tendo o seu parto realizado em outubro daquele ano. O bebê morreu uma hora e meia após nascer. “Impor à mulher o dever de carregar por nove meses um feto que sabe, com plenitude de certeza, não sobreviverá, causa à gestante dor, angústia e frustração, resultando em violência às vertentes da dignidade humana, liberdade e autonomia da vontade, além de colocar em risco a saúde, tal como proclamada pela Organização Mundial da Saúde”, disse a desembargadora Claudia Telles.

O tempo de gestação é uma das coisas mais importantes para o mundo animal, pois é durante esse tempo que o feto irá se desenvolver e ter os primeiros cuidados maternos. A gestação do ser humano, é menor em relação a de outros primatas, com duração de apenas 9 meses. Quando o neonato nasce possui uma fragilidade, exigindo cuidados parentais mais prolongados para: proteção dos predadores, ajudando no desenvolvimento saudável e no aprendizado nas interações sociais, no qual isso ocorre através da proximidade dos pais e filhotes, criando assim um vínculo afetivo no qual pode ser considerado um tipo de amor. Pois quando essa aproximação ocorre bem, a criança terá uma oportunidade de explorar o mundo de uma forma segura e confiante (Detoni , 2004). O comportamento do cuidado parental e o consequente vínculo afetivo surgiram com os endotérmicos, pois era necessário que as mães aquecessem seus filhotes para que estes permanecessem em temperatura constante. A parte do cérebro dos mamíferos responsável pela modulação desses comportamentos afetivos mediante síntese de hormônios é o sistema límbico, estrutura que controla, por exemplo, a memória e a reatividade de emoções perante determinados estímulos. Essa estrutura está relacionada tanto com o amor quanto com a agressividade maternal, de forma que, esse comportamento é fundamental para formação de grupo e estratégia de sobrevivência, pois tem por finalidade a preservação da prole, zelando por ela até que alcance a independência e maturidade sexual, tendo como objetivo a geração de descendentes e perpetuação da espécie. O cuidado materno é preponderante no cuidado com o filhote, porém, a participação do pai nesse processo é importante para que se gaste menos energia no cuidado com o filhote (Ades, 1998;).

O principal hormônio responsável pelo estabelecimento desse vínculo afetivo entre a mãe e o filhote é a ocitocina, esta que é produzida pelo organismo em grande quantidade nos últimos dias de gravidez e nos primeiros dias de amamentação, esse hormônio aumenta ativação do sistema límbico na relação entre mãe e filhote, modulando assim o comportamento materno e gerando vínculo afetivo. 
Muitos acreditam que apenas os seres humanos são capazes de cometer esse ato do aborto, porém o que não sabem é que na natureza muitas fêmeas utilizam o aborto como uma estratégia de reprodução, principalmente quando o macho líder troca de lugar, isso geralmente acontece por causa que a fêmea sabe que não compensa ela utilizar energia para o filhote nascer, pois sabe que, quando nasce esse novo líder, ele poderá matar os filhotes que não são dele. Esse fenômeno é geralmente visto em macacos Gelada, uma espécie de babuíno. Outro fenômeno presente no reino animal, que é observado apenas em cativeiro é o Efeito Bruce, no qual com estudos já feitos com camundongos, uma fêmea grávida realizou um aborto após ser colocada em um ambiente com um novo macho, da mesma forma quando colocada em um recinto com o cheiro de outro macho.
 
No reino animal é comum ver fêmeas que rejeitam, matam ou comem os filhotes. Na verdade, isso funciona mais como uma estratégia de reprodução e controle ´populacional e para o bem da espécie, do que propriamente por falta de vínculo afetivo. O infanticídio ou o abandono, muitas vezes é para prezar pela sobrevivência dos mais fortes e evitar que os pais mediante cuidados parentais desperdicem tempo e energia em proles sem potencial de vida.
 Para os humanos, a questão do aborto é mais delicada, pois envolve questões morais, políticas e religiosas. Existem dois tipos de opiniões diferentes sobre o aborto, há os que defendem a descriminalização do aborto e há os que se apoiam este. Mesmo com toda a percussão que o assunto tem no país, os abortos clandestinos ainda são realizados diariamente, onde foi constatado que é realizado 1 milhão de abortos por ano no Brasil (OMS). Apesar de existirem leis sobre o aborto, essas não são respeitadas pela população, e as condições precárias do SUS, ajudam nas complicações decorrentes dos abortos realizados. O aborto só é permitido no Brasil: quando apresenta risco de morte para a mãe, e nos casos de estupro. Recentemente, os juízes têm atendido favoravelmente os pedidos de interrupção da gravidez dos fetos anencéfalos (Dr. William Saad Hossne).
Quando comparamos essa prática do aborto em animais juntamente com os humanos, percebemos que algumas situações são semelhantes. O exemplo claro disso é quando uma cadela mata seus filhotes após descobrir que algum deles possui alguma deficiência. Isso acontece da mesma forma com os humanos, no caso acima citamos uma reportagem na qual uma mulher descobriu que seu filho nasceria portador de uma deficiência e então ela decidiu realizar o aborto. Podemos tirar uma conclusão de que a mãe, com o instinto protetor e sensível de ser, possivelmente acha que não teria condições de cuidar de um filhote com algum problema, de não querer ver esse filhote sofrendo por conta desse problema ou até mesmo quando ocorre uma gravidez indesejada na qual ela sabe que o macho não assumiria o filho no caso de a ajudar em todas as necessidades que o bebê tem, financeiramente e até mesmo da afetividade que ele precisa para se desenvolver. Dessa forma, isso se remete a questão ética do assunto, na qual a mãe não aceita ou tem medo da situação e prefere tirar a vida desse filhote, do que ver o mesmo sofrendo com a deficiência ou passando necessidades na qual ela não pode suprir a energia gasta para uma prole que não tem como se desenvolver ou sobreviver.
 Nós como futuras biólogas acreditamos que essa é uma questão a ser discutida e analisada minuciosamente para cada tipo de situação em que cada pessoa que passa por isso se enquadra. Sabemos que esse tema é de difícil concordância pois existem aqueles que apoiam e outros que não concordam com a prática do aborto. É sabido que o apego da mãe pelo filhote tem influência direta do hormônio citocina, de forma que esse comportamento tem relação com o cuidado com a prole até que atinja idade reprodutível e perpetuem os genes da espécie. Nos vertebrados, situações em que ocorrem aborto, infanticídio ou rejeição ao filhote, na grande maioria das vezes constitui um comportamento com objetivo de controle populacional ou estratégia de reprodução, entretanto, nos seres humanos situações como essas são mais delicadas e não seguem padrões tão instintivos, sendo regidos por diretrizes políticas e éticas que visam preservar a vida.

O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia tendo como base as obras:

Ades, C. (1998). Psicoetologia do cuidado paterno. In: M.J.R. Paranhos da Costa e V.U. Crornberg, Comportamento Materno em Mamíferos (Bases Teóricas e Aplicações aos Ruminantes Domésticos), São Paulo: Sociedade Brasileira de Etologia, pp. 31-51.DE TONI, Plínio Marco et al. Etologia humana: o exemplo do apego. Psico-USF, v. 9, n. 1, p. 99-104, 2004.
ÉPOCA. Stf decide que o aborto até o terceiro mês não é crime: o que isso significa.Disponível em: . Acesso em: 28 mai. 2017.
EXAME. Grávida de anencéfalo que teve aborto negado será indenizada. Disponível em: . Acesso em: 26 mai. 2017.
HYPESCIENCE. Éguas abortam “propositalmente” seus potros por causa dos machos. Disponível em: . Acesso em: 28 mai. 2017.

ÚLTIMO SEGUNDO. Clandestinas: retratos do brasil de 1 milhão de abortos clandestinos por ano. Disponível em: . Acesso em: 28 mai. 2017.

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