terça-feira, 6 de junho de 2017

Interação com animais em ambiente hospitalar: uma conduta de cuidado?


Por Amanda Amorim Zanatta

Mestranda em Bioética - PUCPR






Fruto do relato documental do diretor Roberto Berliner, o filme Nise - O coração da loucura tem sua reconstituição no Centro Psiquiátrico Pedro II no Engenho de Dentro, localizado no Rio de Janeiro na década de 1940, é baseado na história real da psiquiatra brasileira Nise da Silveira, representada pela atriz Glória Pires, a qual foi pioneira na utilização de técnicas de humanização em hospitais psiquiátricos. Após a mesma recusar-se a utilizar os tradicionais métodos desumanos de eletro convulsão e Lobotomia, ficou designada a atender o renegado Setor de Terapia Ocupacional (STO), onde optando por métodos alternativos como a pintura e a presença de animais, elucidou práticas baseada na arte e no afeto sendo capaz de revolucionar os métodos de tratamentos psiquiátricos no Brasil e no mundo.


As práticas revolucionárias da psiquiatra abordam como principal método de humanização a busca pelo ser biográfico de cada paciente, reconhecendo as necessidades e peculiaridades de cada indivíduo sem julgá-los, as maiores doenças que Nise enfrentou não foram marcadas somente pelo abandono, mais pelo preconceito, a intolerância e o machismo. Sem dúvidas Nise foi uma mulher a frente do seu tempo, capaz de questionar se fazer pensar sobre as práticas de poder impostas, mas sobretudo capaz de mudar sua realidade.

As interações com animais em diferenciados contextos, como os educacionais e hospitalares vem sendo amplamente discutida, a crença de que o deslumbramento afetivo entre humanos e animais domésticos podem vir a auxiliar no âmbito terapêutico tem sido atrelada à resultados positivos no aspecto biopsicossocial dos envolvidos. Foi somente em 1996, que a organização americana Delta Society fomentou a melhoria na saúde e qualidade de vida humana através do auxílio dos animais, com o intuito de dar profissionalismo e credibilidade à pratica, definiu a utilização de animais em dois programas, sendo eles: Atividade Assistida por Animais (AAA), a qual tem como proposta o entretenimento, recreação, distração, dentre outros fatores como a melhora da qualidade de vida, porém não há preocupação com a análise dos resultados obtidos através do procedimento; e a Terapia Assistida por Animais (TAA), a qual é desenvolvida, documentada e avaliada por uma equipe multidisciplinar de profissionais da área, se caracteriza por adotar critérios específicos posicionando o animal como o ator principal do tratamento, objetivando promover benefícios como melhora social, emocional, física e/ou cognitiva e auxiliando na recuperação física e psicológica de crianças e adultos, através do amor e da amizade resultantes da interação entre seres humanos e animais apresentando objetivos e critérios previamente estabelecidos. Atualmente o processo de humanização nos hospitais tem investido em intervenções que leve divertimento para os pacientes internados, uma vez que estas têm sido comprovadas como beneficiadoras do sistema imunológico, menor sensação de dor e também diminuição do tempo de internamento. Práticas como palhaços, shows, música, leitura de livros são comuns, assim como a zooterapia. A terapia com animais tem sido amplamente aplicada em segmentos ambulatoriais e hospitalares devido aos resultados positivos que tem desencadeado nos envolvidos com a prática, tem-se assim o objetivo de melhorar o processo de comunicação, a interação social e a autoestima.

Atualmente, inúmeros relatos e notícias vêm pontuando os benefícios que a interação com animais traz para os pacientes envolvidos, outro fator que cada vez se torna mais recorrente é a visita de animais de estimação, até mesmo para pacientes em cuidados paliativos, a qual tem se mostrado como importante prática de humanização, visto que em muitas situações, o convívio diário com o animal fazia parte da rotina do paciente. No ano passado, entrou em vigor a lei que dispõe sobre a permissão da visitação de animais domésticos e de estimação nos estabelecimento hospitalares do Paraná, a proposta determina que os hospitais poderão criar normas e procedimentos próprios para a visitação de animais à pacientes internados, visando a redução de estresse e o aumento do bem-estar. Contudo, alguns hospitais alegam que a prática é inviável devido a fatores como falta de espaço e a quebra das barreiras de biossegurança, questiona-se se os animais não podem trazer riscos desnecessários para os pacientes que já se encontram em situações de vulnerabilização.

A utilização de animais na terapia e o interesse dos profissionais da saúde por métodos terapêuticos alternativos tem sido cada vez mais recorrente no Brasil. Eu como futura bioeticista acredito que a utilização de animais no contexto hospitalar ainda carecem de regulamentação da prática, para constituir de fato uma conduta de cuidado, há necessidade de adoção de protocolos previamente estabelecidos de acordo com a realidade de cada instituição, visando mitigar os possíveis inconvenientes da presença animal, mas cabe ressaltar que a saúde e o bem-estar dos animais envolvidos também devem ser devidamente preservados, dá-se aí a importância fundamental de um profissional veterinário, capacitado  para diagnosticar os problemas de conduta animal e as demandas físicas e emocionais dos animais como membros co-terapeutas.

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