segunda-feira, 5 de junho de 2017

Altruísmo e o antagonismo dos instintos egoístas


Série Ensaios: Sociobiologia



Por: Amanda Modesti, Franciele Telles, Gabriele Helena, Marcio Henrique, Mariane Londero, Matheus Viana, Roberto Biesuz.

Acadêmicos do Curso de Ciências Biológicas




Pipoca é uma cachorrinha que foi encontrada no lixão de Botucatu-SP, e que por possuir cinomose, um patógeno comum em cães que pode levar a morte, ficou tetraplégica. Mas a filhote encontrada teve o que muitos animais a espera de um lar almejam, encontrou uma família. Regina Stella, professora universitária que se sensibilizou para com a vida do animal e não hesitou em adotá-la, independente de todas as outras dificuldades que as necessidades dela lhe trariam. O amor de Regina pela Pipoca é revigorado a cada movimento em que a mesma conseguia fazer, a cada melhora e a cada dia bem vivido (veja a Matéria completa aqui).

Segundo o budista Matthieu Ricard, em um mundo de crises econômicas e ambientais nos quais vivemos, o que sempre observamos no outro é o egoísmo. O que é compreensível do ponto de vista individual, mas errôneo do ponto de vista coletivo, visto que precisamos de um mundo com pessoas mais altruístas, que desejam o bem para qualquer outro ser vivo que o mesmo espaço divide, que almejem a felicidade para com o outro. Salientando, ainda, que todas as batalhas que o ser humano venha a enfrentar, sejam elas econômicas, ambientais, ou em prol das futuras gerações, a chave fundamental para se sair vitorioso esteja apenas em ter consideração pelos outros, independente do quanto o outro interfere ou importa na sua vida. Apenas considerar a uma vida, o direito de VIVER.

            O altruísmo pode ser definido como um padrão de comportamento, no qual a ação de um ser vivo ajuda outro, mesmo que o primeiro tenha prejuízo (Costa, 2012). Segundo George Price, autor do livro “The price of altruism”, existem dois tipos de altruísmo: o biológico, que é algo mais momentâneo, pertence a natureza e é baseado em qualquer tipo de comportamento que reduza a sobrevivência do altruísta e aumente a sobrevivência de outro; e o psicológico, visto em humanos, que dependerá da intenção, podendo ser em simplesmente ajudar ou buscar algo em troca.

            O altruísmo, segundo Darwin, seria melhor explorado a nível de grupo, uma vez que um grupo cheio de indivíduos altruístas teriam mais chances de sobreviver ao ataque de um predador do que os que tivesses muito indivíduos egoístas. Essa teoria caiu por um problema chamado “subversão de dentro” a qual explica que, como os altruístas tem mais chances de atraírem o problema para eles a chance de aumentar os genes egoístas no grupo é grande, podendo assim levar a extinção do grupo. Um exemplo seria o caso de macacos Vervet que anunciam a vinda de um predador e com esse alarme acabam atraindo o predador para si. Portanto a teoria mais aceita nos dias de hoje seria “seleção de parentes”, proposta por Hamilton. Ele discutiu que os genes de animais altruístas seriam passados somente para seus parentes, aumentando a chance de sobrevivência e de número de altruístas no grupo. Os indivíduos altruístas também podem ajudar seres de outros grupos, mas darão foco principal aos seus parentes. Esse comportamento não precisa ser passado somente geneticamente, pode ir adiante por meio de imitação e aprendizado social (Okasha, 2013).

            Alguns exemplos de altruísmo incluem: abelhas que usam o seu aguilhão para proteger a colmeia e acabam morrendo, pois o seu abdômen inteiro é puxado; morcegos vampiros que acabam regurgitando sangue para alimentar os companheiros, entre outros casos que podem envolver altruísmo de espécies diferentes como o caso de cachalotes que adotaram um golfinho com a coluna vertebral torta ou o caso de baleias-jubartes que usam o seu grande porte para defender focas indefesas do ataque de orcas.

            Nesse último caso foi ressaltado que não houve nenhum tipo de ganho para as jubartes em proteger as focas, elas apresentam esse comportamento apenas para ajudar um ser de outra espécie que naquela situação se encontra indefeso. Mostrando assim que o altruísmo está presente em várias espécies, basta o indivíduo estar disposto a exercer pensamentos positivos e consequentemente um comportamento altruísta. (Pitman, 2009).  Pela escolha de se viver em grupo, os indivíduos se submetem a diversas situações tanto para defender um dos seus, quanto para caçar as suas presas. Dentro dessas estratégias de sobrevivência a escolha de viver em grupo tem suma importância, e da mesma forma que irá trazer benefícios aos componentes do grupo, também irão trazer conflitos e regras, as quais devem sempre serem mantidas para um melhor convívio entre os mesmos. A demonstração de um comportamento altruísta, o qual coloca em risco a vida do próprio indivíduo com a exclusiva forma de tentar proteger um dos seus, provando que na vida em grupo a sua sobrevivência não tem a mesma importância do que a sobrevivência do grupo.

Outro tema importante citar, e que não acontecem apenas em filmes como no Marley e eu, em que no filme Marley é um cachorro da raça labrador que desenvolve uma doença conhecida por torção gástrica, a qual na época não se conhecia a cura, fazendo com que os seus donos tomassem a difícil decisão de proceder com a eutanásia, aliviando a dor e o sofrimento que seu companheiro estava sentindo.

Quando se trata do bem-estar animal fica difícil mensurar o seu sofrimento ou alegria diante de situações que comprometam a qualidade de vida do animal. Doenças degenerativas, câncer, ferimentos gravíssimos e de recuperação quase impossível, ou até mesmo quando há ausência de todos os movimentos. São em casos como esses que normalmente indicam a eutanásia, uma decisão extremamente delicada, difícil e dolorosa, afinal de contas cria-se um vínculo muito grande com seu animal. O que muitas vezes coloca em dúvida qual é a decisão correta a se tomar, visto que existem muitos sentimentos envolvidos, e também muitas dúvidas. Incluindo o fato de não ter como entender o que o seu animal prefere, ficando assim a responsabilidade para o seu dono, em optar pela decisão correta. Mas o problema está em saber qual é a decisão correta a se tomar. Cada situação deve ser analisada individualmente e deve sempre ser levado em consideração o bem-estar do animal, o que ele está sentindo, e a difícil decisão que seus donos irão tomar devem estar livres de julgamentos (Lima, 2013)

Segundo dados estatísticos, levantados pelo IBGE em 2013, existem cerca de 1,56 bilhões de animais de estimação, sendo o Brasil ocupante o 4º lugar no ranking, com cerca de 132,4 milhões, perdendo para a China (289 milhões), Estados Unidos (226 milhões) e Reino Unido (146 milhões).       Globalmente, o setor de indústrias pet movimenta US$ 102,2 bilhões de dólares. No Brasil, em 2015, esse setor faturou R$ 18 bilhões, sendo responsável por ocupar 0,37% do PIB nacional, superando componentes elétricos e automobilísticos.

Essa relação entre animal de estimação e humano, não surgiu do nada. Foi um processo lento de domesticação, que começou com o uso desses animais para a caça, como foi o caso da domesticação dos cachorros que conhecemos hoje em dia. Eles vieram dos lobos, que se adaptaram a conviver com os humanos devido à abundância de comida em suas aldeias. Hoje em dia, os animais de estimação já são considerados membros da família pelos seus donos, devido à grande necessidade de companhia dos seres humanos.

Em 2015, o IBGE fez um levantamento de dados sobre animais de estimação nos lares do País, os valores mostram que o Brasil possuí mais animais cachorros de estimação do que crianças, isso dá um valor total de 52,2 milhões de cães, ou seja, uma média de 1,8 cachorro por domicílio. Por serem companheiros para qualquer momento, principalmente independentemente da idade, os animais de estimação já superam o número de crianças dentro dos lares brasileiros: a cada 100 domicílios, 44 criam cachorros, enquanto 36 possuem crianças. Isso se dá pelo aumento no número de idosos e por mulheres de países desenvolvidos optarem por terem um bebê mais tardiamente. Ou seja, eles passam serem uma alternativa para acompanhar pessoas mais solitárias.

O fato de ter em suas mãos a tarefa de tirar ou não a vida de algum outro ser, principalmente se esse for um animal de estimação em que já existem sentimentos envolvidos, não é uma tarefa fácil e precisa ser tomada pensando nos valores éticos e morais. É necessário também ser levado em consideração os dias ruins e os dias bons que o animal está vivendo, se os dias ruins se sobreporem aos dias bons, isso significa que seu animal de estimação já não está tendo uma vida em boa qualidade, e se torna egoísmo da sua parte querer manter a vida do animal, em prol de se ter uma companhia ao chegar em casa no final do dia.

            Mas em casos como o da Pipoca? Foi demonstrado um comportamento extremamente altruísta, já que existe clara dificuldade na adoção de animais de rua, e quando estes demonstram algum tipo de problema, ou doença, a adoção torna-se muito mais improvável. Situações como essas, apresentam inúmeras barreiras e exigem o dobro de cuidado, atenção, acompanhamento e gastos, na tentativa de proporcionar uma boa qualidade de vida para esse animal. Nesses casos a maioria das pessoas não estão dispostas a terem consideração pela outra vida, ou então não possuem condições para atender todas as necessidades que esses animais precisam.

            Ainda podemos dizer que o comportamento altruísta pode ser adquirido, e que nem sempre é um comportamento inato. A questão da plasticidade cerebral em humanos faz com que o próprio indivíduo tenha o poder de transformar os seus pensamentos negativos em positivos, modificando assim seu comportamento e agindo com mais compaixão perante o outro.

            Na natureza quando um indivíduo se submete a viver em grupo ele está disposto a respeitar regrar e a ser submisso a hierarquias. E nela o altruísmo é utilizado como estratégia de sobrevivência, visto que indivíduos que apresentam comportamentos egoístas com frequência são expulsos de seus grupos. O animal quando demonstra comportamento altruísta tem uma grande melhora no convívio social, e consequentemente um aumento da qualidade de vida, e seu bem estar perante suas relações interpessoais.

 O processo evolutivo é mais bem-sucedido em sociedades nas quais os indivíduos colaboram uns com os outros para um objetivo comum. Assim, grupos de pessoas, empresas e até países que agem pensando em benefício dos outros e de forma coletiva, alcançam mais sucesso (COSTA, 2012, p. 81).       

E nós, como futuros biólogos, acreditamos que o altruísmo pode mudar o mundo e, através desse sentimento, é possível enxergar que a felicidade pode estar nas pequenas atitudes, que a bondade e o amor devem ser vistos e sentido da melhor forma e, principalmente, que o bem ao próximo faz mais bem para quem o faz. Enxergar, aceitar e amar as limitações e as diferenças de cada indivíduo, seja humano ou animal, com certeza deve ser o segredo para tornar nosso mundo melhor.

O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia baseando-se nas obras:

Costa, F. A. P. L. (2012). O preço do altruísmo. História, Ciências, Saúde, 19(4), 1352-1355.

Okasha, S. Biological Altruism, The Stanford Encyclopedia of Philosophy, Jul. 2013. Disponível em: https://plato.stanford.edu/entries/altruism-biological/. Acesso em: 26 mai. 2017.

Lima, M.J., Silva, A.A., O homem em prol do bem-estar animal. In: Seminário Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão, 20, 2015, Cruz Alta-RS. Anais do 20º Seminário Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão. Cruz Alta: UNICRUZ, 2013.

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