Série Ensaios: Sociobiologia
Por: Amanda Modesti,
Franciele Telles, Gabriele Helena, Marcio Henrique, Mariane Londero, Matheus
Viana, Roberto Biesuz.
Acadêmicos do Curso de Ciências
Biológicas
Pipoca é
uma cachorrinha que foi encontrada no lixão de Botucatu-SP, e que por possuir cinomose, um patógeno comum em
cães que pode levar a morte, ficou tetraplégica. Mas a filhote encontrada teve
o que muitos animais a espera de um lar almejam, encontrou uma família. Regina
Stella, professora universitária que se sensibilizou para com a vida do animal e
não hesitou em adotá-la, independente de todas as outras dificuldades que as
necessidades dela lhe trariam. O amor de Regina pela Pipoca é revigorado a cada
movimento em que a mesma conseguia fazer, a cada melhora e a cada dia bem
vivido (veja
a Matéria completa aqui).
Segundo o
budista Matthieu Ricard, em um mundo de crises
econômicas e ambientais nos quais vivemos, o que sempre observamos no outro é o
egoísmo. O que é compreensível
do ponto de vista individual, mas errôneo do ponto de vista coletivo, visto que
precisamos de um mundo com pessoas mais altruístas, que desejam o bem para qualquer outro
ser vivo que o mesmo espaço divide, que almejem a felicidade para com o outro. Salientando,
ainda, que todas as batalhas que o ser humano venha a enfrentar, sejam elas
econômicas, ambientais, ou em prol das futuras gerações, a chave fundamental
para se sair vitorioso esteja apenas em ter consideração pelos outros,
independente do quanto o outro interfere ou importa na sua vida. Apenas
considerar a uma vida, o direito de VIVER.
O altruísmo pode ser definido como um padrão de
comportamento, no qual a ação de um ser vivo ajuda outro, mesmo que o primeiro
tenha prejuízo (Costa, 2012). Segundo George Price, autor do livro “The price of altruism”, existem dois tipos de altruísmo: o biológico, que é
algo mais momentâneo, pertence a natureza e é baseado em qualquer tipo de
comportamento que reduza a sobrevivência do altruísta e aumente a sobrevivência
de outro; e o psicológico, visto em humanos, que dependerá da intenção, podendo
ser em simplesmente ajudar ou buscar algo em troca.
O altruísmo, segundo Darwin, seria melhor explorado a nível de grupo, uma
vez que um grupo cheio de indivíduos altruístas teriam mais chances de
sobreviver ao ataque de um predador do que os que tivesses muito indivíduos
egoístas. Essa teoria caiu por um problema chamado “subversão de dentro” a qual explica que,
como os altruístas tem mais chances de atraírem o problema para eles a chance
de aumentar os genes egoístas no grupo é grande,
podendo assim levar a extinção do grupo. Um exemplo
seria o caso de macacos Vervet que anunciam a vinda
de um predador e com esse alarme acabam atraindo o predador para si. Portanto a
teoria mais aceita nos dias de hoje seria “seleção de parentes”, proposta por Hamilton. Ele discutiu que os genes de animais altruístas seriam passados
somente para seus parentes, aumentando a chance de sobrevivência e de número de
altruístas no grupo. Os indivíduos altruístas também podem ajudar seres de
outros grupos, mas darão foco principal aos seus parentes. Esse comportamento
não precisa ser passado somente geneticamente, pode ir adiante por meio de
imitação e aprendizado social (Okasha, 2013).
Alguns exemplos de altruísmo incluem: abelhas que usam o seu
aguilhão para proteger a colmeia e acabam morrendo, pois o seu abdômen inteiro
é puxado; morcegos vampiros que acabam
regurgitando sangue para alimentar os companheiros, entre outros casos que
podem envolver altruísmo de espécies diferentes como o caso de cachalotes que adotaram um
golfinho com a coluna vertebral torta ou o caso de baleias-jubartes que usam o seu grande
porte para defender focas indefesas do ataque de orcas.
Nesse último caso foi ressaltado que não houve nenhum
tipo de ganho para as jubartes em proteger as focas, elas apresentam esse
comportamento apenas para ajudar um ser de outra espécie que naquela situação
se encontra indefeso. Mostrando assim que o altruísmo está presente em várias
espécies, basta o indivíduo estar disposto a exercer pensamentos positivos e
consequentemente um comportamento altruísta. (Pitman, 2009). Pela escolha de se viver em grupo, os
indivíduos se submetem a diversas situações tanto para defender um dos seus,
quanto para caçar as suas presas. Dentro dessas estratégias de sobrevivência a escolha de viver em
grupo
tem suma importância, e da mesma forma que irá trazer benefícios aos
componentes do grupo, também irão trazer conflitos e regras, as quais devem
sempre serem mantidas para um melhor convívio entre os mesmos. A demonstração
de um comportamento altruísta, o qual coloca em risco a vida do próprio
indivíduo com a exclusiva forma de tentar proteger um dos seus, provando que na
vida em grupo a sua sobrevivência não tem a mesma importância do que a
sobrevivência do grupo.
Outro
tema importante citar, e que não acontecem apenas em filmes como no Marley e eu, em que no filme
Marley é um cachorro da raça labrador que desenvolve uma doença conhecida por
torção gástrica, a qual na época não se conhecia a cura, fazendo com que os
seus donos tomassem a difícil decisão de proceder com a eutanásia, aliviando a dor e o
sofrimento que seu companheiro estava sentindo.
Quando se
trata do bem-estar animal fica difícil mensurar
o seu sofrimento ou alegria diante de situações
que comprometam a qualidade de vida do animal. Doenças degenerativas, câncer, ferimentos
gravíssimos e de recuperação quase impossível, ou até mesmo quando há ausência de
todos os movimentos. São em casos como esses que normalmente indicam a eutanásia, uma decisão
extremamente delicada, difícil e dolorosa, afinal de contas cria-se um vínculo
muito grande com seu animal. O que muitas vezes coloca em dúvida qual é a
decisão correta a se tomar, visto que existem muitos sentimentos envolvidos, e
também muitas dúvidas. Incluindo o fato de não ter como entender o que o seu
animal prefere, ficando assim a responsabilidade para o seu dono, em optar pela
decisão correta. Mas o problema está em saber qual é a decisão correta a se
tomar. Cada situação deve ser analisada individualmente e deve sempre ser levado
em consideração o bem-estar do animal, o que ele está
sentindo, e a difícil decisão que seus donos irão tomar devem estar livres de
julgamentos (Lima, 2013)
Segundo
dados estatísticos, levantados pelo IBGE em
2013,
existem cerca de 1,56 bilhões de animais de estimação, sendo o Brasil ocupante
o 4º lugar no ranking, com cerca de 132,4 milhões, perdendo para a China (289
milhões), Estados Unidos (226 milhões) e Reino Unido (146 milhões). Globalmente, o setor de indústrias pet
movimenta US$ 102,2 bilhões de dólares. No Brasil, em 2015, esse setor faturou
R$ 18 bilhões, sendo responsável por ocupar 0,37% do PIB nacional, superando
componentes elétricos e automobilísticos.
Essa relação entre animal de
estimação e humano, não surgiu do nada. Foi um processo lento de domesticação, que começou com o uso
desses animais para a caça, como foi o caso da domesticação dos cachorros que
conhecemos hoje em dia. Eles vieram dos lobos, que se adaptaram a conviver com
os humanos devido à abundância de comida em suas aldeias. Hoje em dia, os
animais de estimação já são considerados membros da família pelos seus donos,
devido à grande necessidade de
companhia
dos seres humanos.
Em 2015,
o IBGE fez um levantamento de
dados sobre animais de estimação nos lares do País, os valores mostram que o
Brasil possuí mais animais cachorros de estimação do que crianças, isso dá um
valor total de 52,2 milhões de cães, ou seja, uma média de 1,8 cachorro por domicílio.
Por serem companheiros para qualquer momento, principalmente independentemente da
idade,
os animais de estimação já superam o número de
crianças
dentro dos lares brasileiros: a cada 100 domicílios, 44 criam cachorros,
enquanto 36 possuem crianças. Isso se dá pelo aumento no número de idosos e por
mulheres de países desenvolvidos optarem por terem um bebê mais tardiamente. Ou
seja, eles passam serem uma alternativa para acompanhar pessoas mais
solitárias.
O fato de
ter em suas mãos a tarefa de tirar ou não a vida de algum outro ser,
principalmente se esse for um animal de estimação em que já existem sentimentos
envolvidos, não é uma tarefa fácil e precisa ser tomada pensando nos valores éticos e morais. É necessário também
ser levado em consideração os dias ruins e os dias bons que o animal está
vivendo, se os dias ruins se sobreporem aos dias bons, isso significa que seu
animal de estimação já não está tendo uma vida em boa qualidade, e se torna
egoísmo da sua parte querer manter a vida do animal, em prol de se ter uma
companhia ao chegar em casa no final do dia.
Mas em casos como o da Pipoca? Foi demonstrado um
comportamento extremamente altruísta, já que existe clara dificuldade na adoção de animais de
rua, e
quando estes demonstram algum tipo de problema, ou doença, a adoção torna-se
muito mais improvável. Situações como essas, apresentam inúmeras barreiras e
exigem o dobro de cuidado, atenção, acompanhamento e gastos, na tentativa de
proporcionar uma boa qualidade de vida para esse animal. Nesses casos a maioria
das pessoas não estão dispostas a terem consideração pela outra vida, ou então não
possuem condições para atender todas as necessidades que esses animais precisam.
Ainda podemos dizer que o comportamento altruísta pode
ser adquirido, e que nem sempre é um comportamento inato. A questão da plasticidade cerebral em humanos faz com que
o próprio indivíduo tenha o poder de transformar os seus pensamentos negativos
em positivos, modificando assim seu comportamento e agindo com mais compaixão perante o outro.
Na natureza quando um indivíduo se submete a viver em
grupo ele está disposto a respeitar regrar e a ser submisso a hierarquias. E nela
o altruísmo é utilizado como estratégia de sobrevivência, visto que indivíduos
que apresentam comportamentos egoístas com frequência são expulsos de seus
grupos. O animal quando demonstra comportamento altruísta tem uma grande
melhora no convívio social, e consequentemente um aumento da qualidade de vida,
e seu bem estar perante suas relações interpessoais.
O processo evolutivo é mais bem-sucedido em
sociedades nas quais os indivíduos colaboram uns com os outros para um objetivo
comum. Assim, grupos de pessoas, empresas e até países que agem pensando em
benefício dos outros e de forma coletiva, alcançam mais sucesso (COSTA, 2012,
p. 81).
E nós,
como futuros biólogos, acreditamos que o altruísmo pode mudar o mundo e,
através desse sentimento, é possível enxergar que a felicidade pode estar nas
pequenas atitudes, que a bondade e o amor devem ser vistos e sentido da melhor
forma e, principalmente, que o bem ao próximo faz mais bem para quem o faz.
Enxergar, aceitar e amar as limitações e as diferenças de cada indivíduo, seja
humano ou animal, com certeza deve ser o segredo para tornar nosso mundo melhor.
O presente ensaio foi elaborado para
disciplina de Etologia baseando-se nas obras:
Costa,
F. A. P. L. (2012). O preço do altruísmo. História, Ciências, Saúde,
19(4), 1352-1355.
Okasha,
S. Biological Altruism, The
Stanford Encyclopedia of Philosophy, Jul. 2013. Disponível em: https://plato.stanford.edu/entries/altruism-biological/.
Acesso em: 26 mai. 2017.
Lima,
M.J., Silva, A.A., O homem em prol do bem-estar animal. In: Seminário
Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão, 20, 2015, Cruz Alta-RS.
Anais do 20º Seminário Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão. Cruz
Alta: UNICRUZ, 2013.
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