Série Ensaios: Sociobiologia
Por Ana Paula Miranda dos Santos, Erick
Barbosa Ribeiro, Kathylin Fiorotti da Silva Brittes e Mairan Eliszabet Rezena
da Silva
Graduandos do curso de Biologia
É
comum olhar um atleta de alto nível como um herói, até mesmo porque a mídia
televisiva esportiva costuma tratá-lo assim. Para essa mídia brasileira, o
atleta é um herói porque em geral ele é mal pago, porque os treinamentos são
muito rigorosos e porque ele representa o nosso país. Mas quando falamos de
atletas russos uma das primeiras coisas que passa pela nossa cabeça é a palavra
doping. O doping
é caracterizado pelo uso de qualquer droga ou medicamento que possa aumentar o
desempenho dos atletas durante uma competição. Após mais um escândalo
de doping envolvendo o país durante essa semana, o
Comitê Olímpico Internacional (COI) em conjunto com o Associação Internacional
de Federações de Atletismo (IAAF) tomaram a decisão de vetar os atletas russos
dos Jogos do Rio em 2016. Segundo o comitê “Os atletas russos e quenianos
perderam a presunção de inocência em relação ao doping”. Mas quais são os
aspectos que levam atletas de alta categoria a se arriscarem tanto sabendo que,
hoje, as chances de serem descobertos são tão grandes? Será que a trapaça é
algo que já faz parte da natureza humana ou do mundo animal?
De uma forma geral, os hormônios servem para manter a fisiologia, o sistema endócrino libera
compostos químicos que ajudam em momentos necessários de fuga, de “força. A
secreção hormonal é regulada por um sistema de retroalimentação negativa, ou
seja, a secreção de um hormônio produz alguma alteração no organismo e essa
alteração, por sua vez, inibe uma maior secreção hormonal do mesmo. Como
normalmente esses hormônios são secretados em pequenas quantidades, atletas
recorrem ao doping para potencializar suas atividades. As substâncias dopantes estão divididas
em cinco classes: analgésicos narcóticos, estimulantes, agentes anabolizantes,
diuréticos e hormônios peptídicos e análogos. De um modo geral, os efeitos
desses compostos são a diminuição da dor, resistência física elevada,
crescimento muscular acelerado e maior eficiência respiratória, e além das
vantagens físicas essas substâncias proporcionam aos atletas sensação de
prazer. Contudo, O uso de qualquer um desses compostos em excesso causa efeitos
muito prejudiciais, causando desde mudanças comportamentais até problemas de
fígado, coração e ocasionalmente a morte do indivíduo. Só deve-se fazer o uso
de tais substancias com acompanhamento médico e levando em consideração
risco/benefício.
Ao contrário do que se imagina, o doping
não é uma prática moderna: desde 2000 a.C., os chineses já usavam substâncias
que, quando mastigadas, tinham um efeito estimulante e, mais tarde, nas
Olimpíadas antigas, era comum o uso entre os atletas de uma miscelânea de plantas,
cujo principal ingrediente era um cogumelo, que surtia efeitos alucinógenos.
Talvez, o caso mais chocante de doping tenha ocorrido na antiga Alemanha
Oriental entre as décadas de 1970 e 1980:
engravidavam-se as atletas de modo que elas chegavam à competição grávidas de
dois a três meses. Nesse período, o organismo da mulher aumenta naturalmente a
sua taxa de hemoglobina, fazendo com que aumente a sua capacidade aeróbia. Após
a prova, as atletas passavam por abortos e voltavam aos seus treinamentos.
Outros atletas, de ambos os sexos, ainda na infância recebiam enormes doses de
hormônios masculinos para melhorar o desempenho em competições. Obviamente, em
nossa sociedade esta prática é considerada uma fraude, uma forma de trapacear e
vencer os melhores sem o mérito real. Assim como nós temos as Olimpíadas, uma
competição por lazer e profissão, no mundo animal também existe competição,
desde a luta por recursos e território até pela conquista de um parceiro
reprodutivo. Mas afinal, de onde vem esse comportamento fraudulento do ser
humano? Será que nossos antepassados e outros animais também utilizam dessas
práticas para se beneficiar?
A obsessão pela medalha
de ouro cega muitos atletas e estão entre as causas mais freqüentes de consumo
de esteróides anabolizantes no meio esportivo. Muitos atletas acham que tudo é
válido na briga pelo primeiro lugar, pela vitória. Principalmente entre os que
praticam esportes individuais. No mundo animal, também encontramos essas
características, algumas espécies se adaptaram para burlar as regras da
natureza e muitas vezes, alguns indivíduos conseguem praticar uma certa trapaça
e se beneficiar no grupo. Assim como no esporte, no reino animal o mais forte,
preparado e apto geralmente vence e conquista as melhores condições para
perpetuar seus genes. Mas qual seria a
linha entre a fraude e a estratégia? Talvez a intenção? Um estudo realizado por
Tibbetts e Izzo em 2010, percebeu que na espécie de vespas Polistes dominulos,
ocorre trapaça por parte de alguns machos durante o combate, algumas vezes eles
se mostram mais forte do que realmente são para intimidar seus oponentes. Em
outros grupos como os sapos, os machos mais fracos escondem-se atrás de outros
mais fortes, para confundir a fêmea durante o cortejo, fingindo coachar mais
alto. Nas relações interespecíficas a trapaça também existe, como no caso das
orquídeas que imitam o cheiro do ferômonio de algumas fêmeas de abelhas,
atraindo os zangões, através da “imitação
química”, ou seja, o uso, por uma espécie, de
uma substância química para obter uma determinada resposta, não necessariamente
normal, de uma outra espécie.
De um modo geral,
esse “jeitinho”, considerado imoral pelas sociedades, está presente na evolução
de todas as espécies, garantindo que os menos aptos também consigam propagar
seus genes, o que chama atenção por ser comum à todas as sociedades, é a
resposta que o grupo tem diante à descoberta das fraudes: a agressividade e
isolamento do grupo. Naturalmente todos somos individualistas e buscamos nos
proteger e garantir nossa sobrevivência, o comportamento social segue a mesma
lógica, não podendo aceitar indivíduos no grupo, que coloquem em risco a
integridade da espécie. Mas a grande questão é: quais os motivos que levam um
atleta profissional a arriscar sua carreira em busca de uma vitória ilícita?
Muitos atletas fazem
uso sistemático de esteroides como parte de seu treinamento, porém não apenas
os usam, eles possuem acompanhamento médico, estratégia, técnica, equilíbrio
psicológico e treino, para que obtenham boa performance e não tenham resultados
positivos no exame antidoping, como disse o ex-atleta de atletismo Bem Johnson. A utilização desses fármacos está relacionada à motivação do atleta em
relação à vitória e satisfação de uma necessidade pessoal, a qual é orientada
pelos valores pessoais de cada um, temos então dois tipos de orientação: Orientação
Tarefa e Orientação Ego. No primeiro tipo as pessoas preferem
alcançar seus objetivos de forma correta, dar o melhor de si, sua satisfação
está em jogar limpo e não em alcançar a vitória por meios ilícitos, sendo uma
característica que vem desde a infância através da frase “Assim não tem graça”.
Já as pessoas com orientação do tipo Ego não pensam duas vezes em utilizar de
recursos ilícitos e jogar sujo quando aparecem as oportunidades, o importante é
ser o melhor de todos, alcançar a vitória a qualquer custo sem pensar no que
isso pode ocasionar.
Existem diversas
razões que levam um atleta a fraudar seu resultado nas competições, segundo Aquino
Neto “ as pressões familiares, sociais e
econômicas, além da influência da mídia, transformam o atleta em um instrumento
da vontade alheia, retirando sua capacidade de discernir onde se situam os
limites éticos, morais e de segurança de seu comportamento”. Para Silva e Rubio
“atleta que utiliza estimulação artificial opta por esta conduta porque se
sente inseguro, acreditando não ser capaz de corresponder às suas expectativas
e de muitas outras pessoas”. Em resumo, a glória de ser um vencedor, a
valorização do recorde, a necessidade de se obter mais dinheiro como sendo o
melhor e de manter seu status de recordista, a ascensão social e econômica e as
pressões sofridas em cada competição são alguns motivos que levam pessoas, não
apenas os atletas, mas também empresários, empregados, artistas, entre outras
pessoas, à trapacearem para ser o melhor, o mais reconhecido, o vitorioso.
Nós
como futuros biólogos, acreditamos que o ser humano, apesar de julgado como mal
e imoral, apresenta comportamentos semelhantes aos encontrados no mundo animal.
E que mesmo se considerando uma espécie evoluída em relação ás demais, acaba
por apresentar comportamento influenciados pelo instinto maior de busca pelo
primeiro lugar, se deixando levar pela vontade máxima que existe em nós de
garantir a sobrevivência individual. Contudo, também acreditamos na
possibilidade de que todos possam se tornar os melhores um dia, dentro da
sociedade humana que vem se formando há milhares de anos, adaptando-se as novas
necessidades encontradas em nosso planeta.
O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia, baseando-se nas obras:
RONDINELLI, Paula. "O doping e o mito do herói"; Brasil
Escola. Disponível em
. Acesso em 21 de
junho de 2016.
Tibbetts, A.
Elizabeth & Izzo, Amanda. 2010. Social Punishment of Dishonest Signalers Caused by Mismatch between
Signal and Behavior. Current biology. p. 1637-40.
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