sexta-feira, 24 de junho de 2016

O “jeitinho brasileiro” nas demais espécies?


Série Ensaios: Sociobiologia



Por Ana Carolina Gadotti, Camilla Soto, Franciele Santos, Juliana Padilha e Maria Eduarda Garcia

Graduandos do curso de Biologia





Foi noticiado, recentemente, pela mídia mais um caso de corrupção, mas desta vez, ao invés de políticos, o foco da reportagem foi um dos jogadores de futebol mais conhecidos no Brasil e no mundo, Neymar. Acusado de fraude nos valores de sua transferência do Santos para o Barcelona para que um valor menor fosse pago ao grupo DIS, o qual possuía 40% dos direitos do jogador, se condenado, pode pegar até dois anos de cadeia.

A corrupção vem de muito tempo atrás, no Brasil Colônia, em que, assim como hoje, permeava diversos níveis do funcionalismo público. Historiadores relatam que há documentos que mostram funcionários protegendo ou favorecendo vendedores mediante propina. Além disso, em regiões mais longes do litoral e que, portanto, não eram, de fato, colonizadas, eram afastadas dos cuidados da família real e acessíveis apenas após meses de caminhada, o que exigia bons incentivos para aqueles que aceitavam desbravar aquelas terras. A escravidão, muito comum naquela época, também favoreceu possibilidades de suborno e outros tipos de corrupção, já que criava um ambiente vulnerável e sem qualquer tipo de norma para regê-lo.

O convívio social na natureza é muito comum e traz consigo vantagens aos indivíduos como a defesa contra predadores, a obtenção de alimentos, a reprodução e criação da prole, além da evolução cultural. Para que a vida social funcione, tais indivíduos devem possuir objetivos em comum, sendo eles positivos ou negativos (fator agregador), e também diferenças (fator segregador), além de que os interessados devem abrir mão de sua liberdade individual para seguir regras de bom convívio que são estabelecidas e monitoradas por toda uma hierarquia de “superiores” e, dessa forma, poderem desfrutar dos benefícios da vida coletiva. Mas na natureza há uma regra imprescindível, denominada “luta por sua própria sobrevivência” que fez com que os animais dotassem artifícios comportamentais para se adaptarem ao meio em que vivem e a estabelecerem determinadas estratégias que maximizaram a sua chance de sobreviver por outros meios que os sinais honestos estabelecidos pelas regras impostas durante a formação de grupo. Dessa forma, mecanismos como a desonestidade e a trapaça passaram a fazer parte da busca dos interesses próprios por facilitarem ainda mais a busca por alimento, a diminuição da competição e a proteção contra predadores.

Questões relacionadas à mentira e o engano são muito estudadas na espécie humana, principalmente através da neurociência. Sabe-se que quando o indivíduo mente, seus níveis de estresse aumentam caso haja uma possibilidade de ser descoberto. Sendo assim, alguns sinais são clássicos, como por exemplo: a mentira produz um maior consumo de oxigênio e, portanto, aumento do fluxo sanguíneo, a ativação de certas partes do cérebro que inibem ações que possam delata-lo, aumento da temperatura como resultado do aumento do fluxo sanguíneo, principalmente ao redor dos olhos, pois ao se sentir ameaçado o aumento da circulação favorece uma melhora da visão, facilitando a fuga e percepção do ambiente.

O conhecimento da fisiologia, portanto, permite que se desenvolvam tecnologias que permitem detectar mentiras, como testes do polígrafo, eletroencefalograma, termografia do rosto, entre outras.

Na natureza, é muito comum que um animal engane outros para conseguir benefícios para si próprio. Recursos muito utilizados para se evitar predação são o mimetismo, quando partes de um animal assemelham-se a outros animais e a camuflagem, quando os animais buscam imitar objetos não comestíveis presentes no ambiente. Existem também muitos exemplos de animais que usam táticas predatórias "desonestas": a garça ardosia engana suas presas com a tática conhecida como caça dossel, criando uma falsa sensação de proteção para os peixes que preda; o peixe livingstone que dá o bote ao se fingir de morto; crocodilos que colocam gravetos em suas bocas buscando atrair aves que procuram materiais para construir seus ninhos. Entre os primatas, animais que vivem em sociedade na natureza, também já foi registrado que alguns indivíduos ocultam informações sobre a localização de comida de membros de seu próprio grupo, consumindo sozinhos o alimento.

O motivo para a prática da corrupção é muito debatido, principalmente neste cenário político vivido no Brasil nos últimos meses. A explicação mais importante é que todas as pessoas desejam e buscam o prazer, dessa forma, estão sempre à procura de instrumentos que os permitam alcança-la. Neste caso, recursos materiais com os quais seja possível comprar o que possibilite realizar esse desejo. No entanto, esses recursos quase sempre requerem um esforço, que muitas pessoas não estão dispostas a aceitar. Assim, quando surge uma situação que permite obter o prazer com um menor gasto de energia, alguns são seduzidos a aceitar.

Mesmo atrativo, muitos resistem à iniciativa corruptiva. O que significa que essa busca de recursos para o prazer pode estar associada ao temor, em que a pessoa age exclusivamente em função do medo, por exemplo, de alguém descobrir e acabarem presos. Há também aqueles que resistem mesmo sem a presença do medo. É onde entra a questão moral, uma avaliação interna da própria conduta, no sentido do respeito a certos princípios que, livremente, o indivíduo opta por respeitar e que fazem parte da convivência em sociedade.

Uma vez que os seres humanos optaram pela vida em sociedade, as regras as quais geram a boa convivência devem ser passadas desde a infância, de um ponto de vista moral, onde as regras morais vão sendo impostas sem críticas, pela heteronomia, até que se possa alcançar a autonomia que é típico da chegada da maturidade. Na fase da heteronomia, as crianças obedecem às regras que lhe são impostas e aos poucos vão abrindo-se para discussões a fim de estimular a adesão pessoal e autônoma das normas. O grande impasse entre a heteronomia e autonomia ocorre na adolescência, período de contradições em que, abandonando as características infantis, o indivíduo ainda não assumiu as obrigações e as responsabilidades da vida adulta.

Para Kohlberg o desenvolvimento moral é baseado no nível de consciência que se tem das regras e normas, das suas razões e motivações, da consciência da sua utilidade e necessidade. A moral na criança é marcada pelas consequências de seus atos: punição ou recompensa, elogio ou castigo e baseia-se no poder físico (de punir ou recompensar) daqueles que estipulam as normas. Dessa forma, a moralidade de um indivíduo depende tanto de fatores psicológico e biológicos (quem é a pessoa, quem são seus pais, qual sua bagagem genética), como de elementos sociais e culturais (onde nasceu, em que época, quem são seus amigos, vizinhos, mestres, grau de instrução, condição financeira), tornando-se claro que diferentes situações sociais, culturais, psicológicas e biológicas irão proporcionar diferentes comportamentos e, portanto, diferentes moralidades.

Nós, formandas de biologia, acreditamos que a prática de hábitos "desonestos" sempre foi essencial para a sobrevivência tanto em nível individual quanto de espécie na natureza. Porém, para nós humanos, enganar o próximo deixou de ser apenas um instinto de sobrevivência para se tornar uma prática racional, premeditada e muito questionável. Egoísmo e ambição tornam-se combustíveis potentes para a quebra de valores morais pregados na vida em sociedade.





O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia, baseando-se nas obras:























Nenhum comentário:

Postar um comentário