quinta-feira, 23 de junho de 2016

NÃO ROUBE!! O governo detesta concorrência


Série Ensaios: Sociobiologia

por: Bruna Falavinha, Cátia Sant’Anna, Jonathan Jesus da Silva e Paola Gyuliane.

Graduandos do curso de Biologia



            Durante a operação lava-jato descobriu-se um dos maiores esquemas  de corrupção da história. A operação ainda está em andamento e já prendeu uma série de políticos por corrupção e lavagem de dinheiro, inclusive um senador em exercício. No dia 14 de junho de 2016 o presidente em exercício da Câmara dos deputados criou uma comissão especial destinada a discutir as propostas de combate à corrupção apresentadas pelo Ministério Público Federal. O Ministério Público Federal apresenta dez propostas para reforçar o combate à corrupção no país, que incluem alterações legislativas para prevenir, punir e recuperar desvios de dinheiro público. As principais propostas são tornar crime o enriquecimento ilícito por parte de agentes públicos tornar os crimes de corrupção hediondo e o ressarcimento de recursos aos cofres públicos, no qual o responsável deverá entregar todo o seu patrimônio, exceto aquele que consiga provar origem lícita.

            A corrupção consiste no desvio de recursos dos orçamentos públicos da União, dos Estados e dos Municípios destinados à melhoria de vida da população, que são desviados para financiar campanhas eleitorais ou contas pessoais, principalmente no exterior. A corrupção afeta diretamente o bem-estar dos cidadãos pois diminui a verba que seria aplicada em investimentos públicos na saúde, na educação, em infraestrutura, segurança, habitação, entre outros direitos essenciais à vida, e fere criminalmente a Constituição. A corrupção está relacionada com a mentira, trapaça e desonestidade.

            A desonestidade pode parecer uma característica exclusiva dos seres humanos, entretanto muitos zoólogos afirmam que os animais usam muito mais  linguagem para dissimular e mentir do que para trocar informações “honestas”. A natureza está repleta de bichos vigaristas, como por exemplo os drongos, pássaros pretos vigilantes que emitem um som de alerta cada vez que avistam um predador. Suricatos, por exemplo, se escondem quando ouvem o som do drongo, mas nem sempre o alarme é verdadeiro. Quando os suricatos capturam insetos ou pequenos lagartos, os drongos emitem um som de alarme para os suricatos fugirem, e então roubam sua comida. Outro exemplo é das garças-verdes que depositam pequenas quantidades de alimento na água, esperando que um peixe seja atraído por ele; assim que a vítima se aproxima do alimento, a garça-verde ataca. Ninguém sabe explicar como elas aprenderam a fazer isso. Alguns especialistas acreditam que a habilidade se desenvolveu observando humanos.

            Dois ingleses primatólogos fizeram uma vasta pesquisas sobre casos de mentiras entre primatas, e obtiveram 253 casos de fraude,  e classificaram os símios como criaturas mentirosas, que têm a chance de ser honestos mas insistem em enganar os próprios companheiros. Somente a família dos lêmures, animais de cérebro pequeno e organização social simples, não cometeu nenhuma fraude. Os cientistas acreditam que quanto mais dissimulado o primata, maior o seu cérebro . Um exemplo é o caso da gorila Koko. Koko é uma gorila que aprendeu a linguagem de sinais e domina mais de mil sinais de comunicação gestual. Como efeito colateral do aprendizado, foi a primeira gorila a mentir na linguagem dos homens. Desde os primeiros anos de vida Koko começou a empregar os sinais para fingir e dissimular. Quando quebrou seu brinquedo preferido, prontamente apontou uma assistente como culpada. O mesmo aconteceu quando em um acesso de fúria a gorila quebrou a pia do seu quarto e culpou seu gatinho de estimação. A gorila mentiu para escapar de uma punição, estratégia que também é feita por humanos.

            Faz parte da natureza humana mentir, muitas mentiras são contadas para facilitar o convívio na sociedade. Estima-se que 60% dos humanos mentem em conversas durante o dia-a-dia e isto mostra como a mentira é algo frequente na sociedade humana. Entretanto, a mentira é um assunto constrangedor que envolve questões éticas e condenações morais.

            Do ponto de vista etológico, as mentiras são apenas elementos da justa disputa pela sobrevivência. Todo animal procura tornar seu ambiente o mais vantajoso possível para si mesmo. Em seu livro O gene egoísta, o biólogo Richard Dawkins afirma que a desonestidade é um comportamento incentivado pela seleção natural. O desejo de levar vantagem sobre nossos semelhantes  torna-nos mais aptos a sobreviver. Desde que o segundo homem das cavernas roubou a primeira pedra lascada – para a indignação do primeiro homem das cavernas –, os genes da trapaça prosperam entre os homens. Já escritor irlandês Oscar Wilde diz: “O objetivo do mentiroso é simplesmente encantar, deliciar, dar prazer. Ele é a própria base da sociedade civilizada”. Na Grécia Antiga, a mentira era vista como forma de criatividade. “Mentir de forma consciente e voluntária tem mais valor do que dizer a verdade de forma involuntária”, afirmou Platão (século V a.C.). A ficção teve um papel importante no desenvolvimento da sociedade. Oscar Wilde também diz que acreditar na arte, na literatura e na mitologia ajudou o homem a imaginar um mundo melhor. Sem esse tipo de mentira deliberada, o homem não teria impulso criativo e seria igual aos outros animais.

            Do ponto de vista psicológico, o ser humano tem uma tendência natural a trapacear e mentir. Quando alguém se esta em uma situação onde pode trapacear, a pessoa analisa os prós e os contras caso seja pego trapaceando. Isso ocorre pois ha a necessidade de se parecer honesto para si mesmo e para os outros. Devido a isso, estudiosos dizem que pessoas comuns tendem a trapacear em 15% das oportunidades, fazendo com que se mantenha uma imagem honesta de si mesmo sem desrespeitar os instintos trapaceiros. De acordo com a pesquisa, cada pessoa é desonesta num grau diferente, e quando se consegue convencer a si mesmo de que se é honesto outras pessoas acreditam também. Existem fatores que nos fazem trapacear mais, como quando as pessoas veem outros trapaceiros em ação e usam a desculpa do “todo mundo faz”, ou quando querem se vingar. Quando nos sentimos ofendidos por alguém, as chances de sermos honestos com essa pessoa diminuem. Um exemplo disso são o de pessoas que estão insatisfeitas com o seu governo e tendem a pagar menos impostos ou desrespeitar as leis do trânsito. Outros exemplos são de que pessoas mais criativas tendem a trapacear pois podem criar justificativas racionais para seus deslizes e tem capacidade de inventar novas maneiras de quebrar as regras e de que essas que trabalham em profissões estressantes tendem a ser mais desonesto, pois para manter a honestidade, é preciso fazer o esforço para conter a tendência natural e o cansaço mental enfraquece as defesas. Outro ponto é o de que quem já trapaceou uma vez tem uma chance maior de repetir a mesma trapaça mais vezes. Entretanto, para os estudiosos a busca por uma sociedade mais honesta é possível desde que admita-se a tendência natural humana à trapaça e ao autoengano e faça-se um exercício de autocontrole para evitar mentir e trapacear. Porém, eliminar 100% a mentira não seria vantajoso do ponto de vista social , já que o muitas vezes temos de mentir para seguir regras básicas de convívio, apenas seria algo bom nos negócios e na política.

            Já no ponto de vista biológico pode-se observar uma diferença no cérebro dos mentirosos patológicos que apresentam 25% mais massa branca em seus lobos pré-frontais quando comparados com o grupo controle, já com a massa cinzenta os mentirosos patológicos tem cerca de 14% menos massa do que o grupo controle. Isto implica que a grande quantidade de substância branca dá aos mentirosos a capacidade de criar histórias muito rapidamente e lhes dá mais poder para avaliar as respostas e reações das pessoas com quem estão falando, para ver se a mentira está funcionando e fazer os ajustes necessários, portanto o aumento da massa branca esta relacionado com a tendência a mentir. Estudos anteriores demonstraram que as pessoas com autismo têm dificuldade em criar e dizer mentiras, e parte da diferença em seus cérebros é justamente o crescimento lento da massa branca. A massa cinzenta é o centro de moral das pessoas, e com a matéria cinzenta reduzida, os mentirosos não veem nada moralmente errado em suas mentiras constantes. Do ponto de vista genético, o gene APOE4 pode alterar a atividade cerebral ao longo da vida e os pesquisadores sugerem que sua expressão esta relacionada com a desonestidade e o risco de desenvolver Alzheimer. A variação APOE4 pode ser encontrada em aproximadamente um quarto da população e causa uma hiperatividade nas regiões do cérebro responsável pela memória, conhecida como o hipocampo, e no córtex pré-frontal relacionado com a mentira. A hiperatividade dessa região pode fazer com que o individuo tenha uma tendência maior a mentir e ser desonesto.

            Nossa opinião como futuros biólogos é  de que a mentira é um comportamento utilizado por diversos animais como estratégia evolutiva para se livrar de situações de risco ou conseguir melhores recursos, como o alimento. No entanto, as mentiras e a desonestidade humana ultrapassam o nível de todas as outras espécies. Uma explicação para tal observação, pode ser a complexidade do cérebro humano e de nossa sociedade. A desigualdade social e o capitalismo, por exemplo, favorecem as tentativas de burlar as regras e passar por cima de outras pessoas pela dificuldade que esse sistema propicia na conquista de uma qualidade de vida elevada.





O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia, baseando-se nas obras:







Dawkins, R. (1999) O Gene Egoísta, Ed. Oxford, 460 págs.

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