O altruísmo sobre uma perspectiva etológica

Série Ensaios: Sociobiologia
Por Aline de Andrade Batista
Acadêmica do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas

Em Belo Horizonte foi iniciada uma campanha de doações pelas redes sociais em nome da Igreja Sagrado Coração de Jesus para ajudar os mais de 100 refugiados sírios que chegaram recentemente na cidade. Noutro dia, centenas de pessoas foram à igreja para levar os donativos, que eram colocados próximos ao altar e do lado de fora da construção, pois não havia mais espaço dentro da igreja.
 “Altruísmo” é um vocábulo criado pelo filósofo francês Auguste Comte, em 1830, para caracterizar o conjunto dos comportamentos humanos que nos inclinam a fazer ações benevolentes aos outros. Geralmente é usado como sinônimo de filantropia e o oposto do egoísmo. Bondade, veneração, caridade e apego são consideradas características altruístas. O termo frequentemente é associado como sendo uma virtude e justificado por alguma tendência religiosa - embora isso de fato não seja verdade.
O altruísmo, visto como fazer “o bem ao próximo” também é possível de ser observado em outros animais, tendo como objetivo garantir a sobrevivência da espécie, como indicam DeNault & McFarlane (1994), em seu estudo com morcegos hematófagos da espécie Desmodus rotundus: esses animais reconhecem a interdependência de sua colônia e compartilham alimento com outros indivíduos com base na compreensão de que se os papéis estivessem invertidos, esses indivíduos também partilhariam alimento com eles e como Wilson (1981) cita em seu livro comportamentos de defesa, como o suicídio altruísta – este existente em humanos, mas também em animais que formam algum tipo de estrutura social, como abelhas.  Por outro lado, mais registros (sem fins científicos) de atos de solidariedade entre os animais têm aparecido, como este vídeo e este relato de um leopardo que cuida do filhote que sua presa deixou.
Wilson defende dois tipos de altruísmo: o absoluto, que provavelmente evoluiu através de seleção de parentesco ou de seleção natural e que consiste em uma ação irracional e sem desejo de retribuição; e o relativo, que evoluiu da seleção individual e é consciente, elaborado e de caráter egoísta, que busca algum reconhecimento na sociedade e satisfação própria.
Pesquisadores de Stanford apontam aqui que em nós, humanos, o altruísmo relativo envolve um processo de aprendizado de três etapas para ser desenvolvido. A primeira é reconhecer a si mesmo como individuo, e isso ocorre quando ainda somos bebê. A segunda etapa acontece por volta dos 4 anos, quando a criança consegue reconhecer o outro e assim tende a se comportar semelhantemente aos outros. Por fim, a última etapa ocorre aos 10 anos, quando a maturidade já é o suficiente para exercer algum comportamento altruísta voluntaria e conscientemente.
Aproveitando e usando como exemplo a atual crise dos refugiados, muito se tem relatado sobre a solidariedade de pessoas de inúmeros países para com essa gente. Só no Brasil, cerca de 100 sírios chegaram a capital mineira recentemente e então uma igreja da cidade começou a arrecadar doações através de campanhas em redes sociais. O resultado foi surpreendente: centenas de pessoas se mobilizaram e doaram itens alimentares e de higiene   - a igreja ficou sem espaço para abrigar todas as doações e então teve que direcioná-las para outro lugar. Ao analisar a situação, não posso afirmar que tipo de altruísmo desencadeou o fato, tendo em vista que cada pessoa deve ter tomado sua atitude por diferentes motivos, mas que a sociedade tem um certo poder sobre a “bondade” das pessoas, pois aqui temos duas situações culturais implícitas: a religião e a situação humilhante dos imigrantes.
Muitas pessoas relatam se sentir após de realizar alguma ação considerada boa.  Isso se deve a ocitocina, que estimula comportamentos como altruísmo, generosidade e empatia – isso funciona como uma forma de recompensa.”
Como bióloga, acredito que o altruísmo está empregado na sociedade de diversas formas, porém com alguns equívocos de conceito. Muitos acreditam piamente que são “bons” por ajudar ou respeitar o próximo, quando que para o senso comum não fazem nada além do esperado de alguém civilizado. Acredito que o fato do homem estar deixando seu lado mais “selvagem” diminuir implica numa redução do altruísmo herdado por seleção natural, enquanto o altruísmo relativo só tende a crescer mais. Vemos muito hoje que a bondade e caridade das pessoas é fruto de muitos fatores culturais e emocionais que a pessoa vai absorvendo conforme o que vive.

O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia, tendo como base as obras:
DeNault, L. K., & McFarlane, D. A. (1995). Reciprocal altruism between male vampire bats, Desmodus rotundus. Animal Behaviour, 49(3), 855-856.
Hoje em Dia. Doações a refugiados lotam igreja e local de entrega é transferido. Acessado em 20 de setembro de 2015. Disponível em http://www.hojeemdia.com.br/horizontes/doac-es-a-refugiados-lotam-igreja-e-local-de-entrega-e-transferido-1.347510.

Revista Crescer. Crianças são naturalmente altruístas¿ Acessado em  04 de setembro de 2015. Disponível em: http://revistacrescer.globo.com/Bebes/Desenvolvimento/noticia/2015/01/criancas-sao-naturalmente-altruistas.html
Wilson, E. O. (1981). Da natureza humana. TA Queiroz/Ed