sábado, 19 de setembro de 2015

Infidelidade: paradoxo natural ou racional?

Série Ensaios: Sociobologia

Por Victoria Stadler Tasca Ribeiro
Graduanda em Bacharelado em Ciências Biológicas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Recentemente foi noticiada a suposta separação entre a modelo brasileira Gisele Bündchen e o jogador de futebol americano Tom Brady. O fim do casamento teria sido por conta de uma traição, por parte de Brady, com uma ex-babá em um vôo particular.


Atualmente cada vez mais casais separam-se, como apontam as estatísticas. Com o crescimento demográfico, expansão cultural e inversão de valores na sociedade atual, o que se observa são diversos casos de traição, visto como uma espécie de despotismo no terreno amoroso, podendo ser definida como “falta de respeito, de fidelidade àquilo com que se deveria estar comprometido”; e também “violação, transgressão da regra de fidelidade conjugal imposta aos cônjuges pelo contrato matrimonial, cujo princípio consiste em não se manter relações carnais com outrem fora do casamento.”. Com o advento da tecnologia, hoje existem até sites para os interessados. Contudo, a infidelidade não é exclusiva da modernidade. Sabe-se que antigamente, na literatura grega clássica, há citações no livro “A origem da família, da propriedade privada e do Estado” de Friedrich Engels que revelam registros anteriores a práticas monogâmicas, onde homens e mulheres possuíam vários parceiros, sem violação moral. Complementando o fator do condicionamento cultural e religioso, a traição é vista como um escrúpulo e pecado.
- Mas será que podemos conceituar infidelidade como imoral e escrupulosa?
Antes de tudo, deve-se ressaltar a importância da formação de um grupo social, que ao longo da evolução foi se estruturando às características de cada grupo, promovendo relações e ligações entre indivíduos. Características estas que serão definidas de acordo com a sua viabilidade e estratégias. Para algo tão vital como a reprodução, é necessário que haja socialização. Podemos pontuar a monogamia e a poligamia. A monogamia, além de uma escolha, é uma estratégia que no seu ideal de família, permite que os pais eduquem seus filhotes, aptos a sobreviverem e reproduzirem mais uma geração. É o caso dos pinguins , motivados pela difícil condição climática, a estratégia social é a mais adequada para que haja perpetuação. Num outro viés, a poligamia também tem seus méritos, como é observado no trabalho do pesquisador Carlos Botero.  A partir de levantamentos genéticos em aves, foi observado que muitas vezes os pais não estavam criando um filho genuíno. Foi questionado então o aquecimento global na influência da fidelidade desses animais, e o que foi levantado é que com um ambiente hostil e incerto, é mais sólido para a sobrevivência uma prole com maior variabilidade genética. Logo, interações sociais e estratégias reprodutivas acarretarão na evolução e sucesso de uma espécie.
De acordo com teses de Charles Darwin e outros biólogos na tentativa de explicar a evolução humana, foi proposto que a natureza determinou que nosso comportamento sexual fosse orientado por alguns mecanismos biológicos com concupiscência, com o ideal de trabalhar a favor da manutenção da espécie, podendo pontuar que para serem bem sucedidas, as espécies devem perpetuar seus genes, e isso acarreta em ter diversos parceiros. Já o neurocientista norte-americano Larry Young afirma que a monogamia sexual não é uma tendência natural entre os humanos (e ainda pode ser acentuada naquelas pessoas que possuem genes que estimulam a buscar uma maior dose de dopamina), também podendo estar relacionado aos receptores de vasopressina e ao elevado nível de estradiol (nas mulheres), que está vinculado à auto-estima e à luxúria. Há também ligações entre a testosterona e a infidelidade, produzida de 20 a 30 vezes mais em homens que mulheres. Estudos recentes sugerem que a baixa concentração deste hormônio pode estar relacionada com a fidelidade. Sabe-se, no entanto, que no mundo animal existem diversos relatos de casais monogâmicos, por exemplo: ratos, que criam junto seus filhotes e estabelecem uma longa relação. Contudo, se este casal se desencontra por algum motivo, ambos podem “trair”, mas retornam às suas casas e parceiros à noite para cuidar de suas famílias.
É provável que os humanos possuam esta mesma tendência biológica. Entretanto, o Homo sapiens estabelece conexões, que fazem com que haja o desenvolvimento de longos relacionamentos, e, principalmente, emoções.
Para Freud, o instinto de vida era representado pela energia pulsional chamada Libido; para Darwin, pelo Imperativo Reprodutivo: o impulso básico de deixar cópias de melhor qualidade possível. Constituem-se de uma mesma força, com diferentes paradigmas para compreendê-la.”.
Na sexualidade humana é possível distinguir componentes biológicos e socioculturais, uma vez que sociedade e cultura são também produtos da biologia, visto que fenômenos socioculturais têm origem em atos psíquicos, que são gerados por mecanismos neurofisiológicos e culturais. O componente biológico constitui a essência do comportamento, que é determinado pela cultura, que tem aspectos negativos ou positivos sobre o comportamento.
Como graduanda em Biologia, vejo que a cultura, sociedade e religião incentivam um relacionamento monogâmico, porém, isto não acarreta que ele seja natural, pois vai contra nossos instintos e traços evolutivos sociais. Entretanto, a razão atrelada aos sentimentos inerentes ao ser humano pode superar a infidelidade. Vejo que ao tentar compreender aspectos mais profundos da natureza humana, há algo além da matriz biológica, deixando de ser apenas “Imperativo reprodutivo”, indo à procura de qualidade de vida, e não apenas a aspectos de sobrevivência e sucesso reprodutivo.






O presente ensaio foi embasado nas seguintes referências:
Freud S. (1931), Sexualidade feminina. Vol. 21. Rio de Janeiro: Imago
Darwin C. (1871), The descent of man and selection in relation to sex. London, England.

Parisotto et al. (2003), Diferenças de gênero no desenvolvimento sexual: integração dos paradigmas biológico, psicanalítico e evolucionista. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul vol.25. Porto Alegre.

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