segunda-feira, 15 de junho de 2015

Coleções didáticas e vivissecção: ética e/ou pesquisa?

Série Ensaios: Ética no Uso de Animais
Por Vanessa Vlnieska
Bióloga e Aluna de Pós-Graduação do Curso de Especialização em Conservação da Natureza e Educação Ambiental

Há cerca de mais ou menos1 ano, o tema de experimentação animal foi fortemente veiculado na mídia através de uma notícia em que dezenas de ativistas invadiram um laboratório do Instituto Royal, em São Roque, localizado a 59 km de São Paulo. Eles levaram dezenas de cachorros da raça Beagle que estavam no complexo do Instituto de Pesquisa, motivados pelas suspeitas de que os bichos sofriam maus-tratos no local. Os animais eram usados em pesquisas com medicamentos, e o Instituto possuía autorização do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal para a realização de seu trabalho. Este fato suscitou uma série de questionamentos de grupos a favor e contra o uso de animais para pesquisas. Grupos defensores dos direitos dos animais se posicionaram a favor dos ativistas enquanto grupos de profissionais que trabalham com pesquisa se mostraram contrários às reivindicações e ao fato ocorrido.

O uso de animais para a realização de estudos laboratoriais sempre causou polêmica entre diversos grupos, por isso, existe a necessidade e uma importância de se discutir deliberadamente esse tema. A prática da vivissecção, principalmente em estudos cientifico-pedagógicos, caracteriza-se de fato como experimentação animal. Porém, o termo "vivissecção" é geralmente usado com uma conotação mais negativa, referindo-se mais ao que implica em tortura, sofrimento e morte, e é preferido por àqueles que se opõem à estes métodos de estudo. Cientistas normalmente usam o termo "experimentação animal", mas na realidade as duas expressões referem-se ao mesmo método. Os testes em animais, também conhecidos como "experimentação animal, pesquisa com animais e ensaios in vivo", referem-se à utilização de animais não humanos em experiências.
O uso de animais em pesquisas vem desde a antiguidade. Grandes pesquisadores em séculos passados já relacionavam o aspecto de órgãos humanos doentes com o de animais, com finalidades claramente didáticas. Anatomistas, em meados de 300 a.C., também realizavam vivissecções animais com o intuito de observar as estruturas do organismo e assim formular hipóteses sobre o funcionamento associado à estas. Ainda posteriormente, Galeno (129-210 d.C.), médico e filósofo em Roma, foi um dos primeiros a realizar vivissecção com objetivos experimentais, ou seja, de testar variáveis através de alterações provocadas nos animais (Goldim & Raymundo, 1997).
Ainda debatendo sobre o uso de animais, porém para outro fim, as coleções didáticas também são motivo de questionamentos quando se trata do meio ético. Para esse fim ainda, sabe-se da importância dos exemplares no papel gerador de conhecimento. Nos dois casos, os animais são utilizados com objetivo científico/didático, com o intuito de possibilitar a descoberta de novos conhecimentos ou comportamentos sobre aquele “exemplar”, extrapolados muitas vezes para outras espécies, e isto de fato, é de extrema importância, pois todo o conhecimento que hoje temos em termos biológicos para a grande maioria das espécies, foi pautado nestes procedimentos. O “x” da questão está na consideração do bem-estar do animal, dos princípios éticos que todos esses procedimentos norteiam, e a análise de que apesar de à princípio não terem consciência, são seres vivos, além de tudo sencientes, e como tais são dignos de respeito e têm direito à vida.
No Brasil, a Lei n° 11.794 de 8 de outubro de 2008 regulamenta o uso de animais, estabelecendo os procedimentos para o uso científico, com o auxílio da criação do CONCEA – Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal, o qual tem competência para reger todas as normas que norteiam esses procedimentos. É importante ressaltar que as questões éticas são de extrema relevância, levando-se em consideração todos os aspectos biológicos dos seres vivos, e até por isso, esses procedimentos e critérios de utilização devem ser rigorosamente cumpridos, porém, é preciso lembrar também que se não fossem estes métodos, provavelmente não teríamos o conhecimento que temos hoje e seria difícil trabalhar no sentido de inúmeros avanços, sejam para benefícios do próprio homem – no aspecto da medicina, como também para benefícios de todas as outras espécies – no aspecto de conservação. Existem ainda outros métodos alternativos à estes procedimentos, porém ainda muito contestáveis e duvidosos, principalmente pela ciência. Eu, como bióloga, acredito que o ideal seria trabalhar com exemplares artificiais que reproduzissem exatamente as condições de um ser vivo, porém, isto é um desafio bem complicado de se resolver exatamente porque os comportamentos não esperados não poderiam ser reproduzidos de forma artificial, já que não se teria conhecimento para isso. Enquanto uma solução para esta questão não é encontrada, só resta tentar agir da forma mais ética possível.


O presente ensaio foi elaborado para a disciplina de Ética no Uso de Animais e Bem-Estar Animal, baseando-se nas fontes:
GOLDIM J.R., RAYMUNDO M.M. Pesquisa em Saúde e os Direitos dos Animais. 2 ed. Porto Alegre: HCPA, 1997.
ETOLOGIA NO DIA A DIA. Disponível em: <http://etologia-no-dia-a-dia.blogspot.com.br/> Acesso em 26/05/2015.
EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL. < http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2014/10/invasao-ao-predio-do-instituto-royal-em-sao-roque-completa-um-ano.html>
BEAGLE.
USO DE ANIMAIS. https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=77037
COLEÇÕES DIDÁTICAS. https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=77037
BEM-ESTAR ANIMAL. C:\Users\User\Downloads\4057-8683-1-PB.pdf

Nenhum comentário:

Postar um comentário