Série Ensaios: Aplicação da Etologia
Por Aline Cristine Cavichia, Aline de Andrade Batista, Amanda Deconto Mileo
Segundo a definição clássica, experimentação
animal é qualquer prática que faz uso de animais não humanos para
fins didáticos e/ou científicos (pesquisa), abrangendo a dissecação
e a vivissecção.
A utilização de animais na experimentação já vem datada desde os séculos XVII e
XVIII. René
Descartes descartava a possibilidade de que os animais eram seres
conscientes, mas sim máquinas
naturais. A partir dessa linha de pensamento, começaram a utilizar
práticas como a vivissecção e a realização de experimentos cruéis com animais. Voltaire
discordava dos pensamentos de Descartes, pois acreditava que os animais eram
sencientes. Kant
defendia o antropocentrismo débil, onde o homem tinha obrigações para com os
animais. Jeremy
Bentham defendia a igualdade de condições a todos os seres sensíveis
em virtude de sua capacidade de sofrimento. Após a Revolução
Intelectual, Iluminista, dos séculos XVII e XVIII veio a Revolução
Industrial dos séculos XIX e XX, que possibilitou o desenvolvimento
da ciência e da técnica. No século XX, surgiram correntes filosóficas em defesa
da causa animal. Peter Singer
(corrente utilitarista) fundou a filosofia com as preocupações éticas atuais em
relação aos animais. Já o filósofo americano Tom
Regan (corrente deontologista) um expoente na questão dos direitos
dos animais. Ambos defendiam que as espécies sensíveis possuem
status moral, que as diferenças entre animais e humanos não justificam a forma
como são tratados e por isso os costumes devem ser reformulados.
Atualmente, as pesquisas em animais têm como
propósitos a pesquisa como meio, aquela envolvendo o uso de modelos animais
para a geração de conhecimento que seja transponível aos seres humanos, caso das
pesquisas nas fases pré-clínicas ou básicas, ou, ainda a pesquisa como fim, na
qual é estudado o animal e suas características. Hoje
em dia existe uma necessidade global da redução do uso
de animais na experimentação. A obra “The
Principles of Humane Experimental Tecnique”,
publicada em 1959 pelo zoólogo William Russell e o microbiologista Rex Burch estabelece princípios conhecidos como o princípio dos
“3Rs”, “Reduce”, “Replace” e “Refine”. “Reduce” (redução) determina o mínimo de
utilização de animais em um experimento. “Refine” (refinamento) orienta para a
o emprego de métodos adequados de analgesia, sedação e eutanásia. “Replace”
(substituição) orienta para ao uso de métodos alternativos, sempre que possível.
Estamos ainda longe de atingir os 3 Rs. As farmacopéias estão cheias de
anomalias sobre o uso de animais empregados em testes. Richomond
(2002) alega que os
estudos com animais devem ser conduzidos somente quando: 1) o objetivo é de
importância justificável; 2) não existem métodos alternativos válidos; 3) todas
as estratégias relevantes de redução e refinamento já foram identificadas e
implementadas; 4) o desenho e a condução do estudo minimizem o prejuízo causado
ao bem estar animal, não somente com relação ao número de animais utilizados,
mas também em relação à dor e ao sofrimento causado e 5) exista benefício
científico máximo. Os países da União Europeia já
não fazem testes de experimentação cosmética e produtos de higiene pessoal em animais
desde 2009. No Brasil, o estado pioneiro nessa atitude foi São Paulo, quando em
janeiro de 2014, Geraldo Alckmin sancionou a
lei que proíbe o uso de animais para
esta finalidade. Hoje em dia métodos alternativos
estão sendo cada vez mais buscados, como vídeos demonstrativos e programas de
computador, produtos e modelos sintéticos: do sistema circulatório, ósseo, do
globo ocular e das diferentes partes do corpo dos animais para prática de
punções venosas e cirurgias. Os testes
convencionais podem ser substituídos por organismos desenvolvidos in vitro, como por
exemplo, a pele artificial
desenvolvida pela equipe da professora Silvya Stuchi na USP em 2009, onde podem
substituir a utilização de animais em testes de produtos cosméticos. Nas instalações das
empresas do Grupo Boticário, todas as atividades são monitoradas regularmente
com o propósito de diminuir ou eliminar desperdícios e impactos ambientais. As
empresas também não realizam testes em animais, por integrar a sustentabilidade
em sua estratégia de negócio.
Existem alguns recursos alternativos simuladores na área de farmacologia:
LAL (Limulus
Amoebocyte Lysate) – capaz de substituir o ensaio de pirogênio em coelhos. O
método é baseado na reação entre a endotoxina e o substrado de LAL. Dependendo
do método utilizado, quando a endotoxina está presente ocorre coagulação
(método gel-clot) ou liberação de cor (método cromogênico).
HET-CAM
(Membana cório-alantóide de embrião de galinha) – método capaz de substituir o
método de irritação ocular e de mucosas Os vasos da membrana cório-alantóide
apresentam reações às substâncias irritantes.
Citotoxicidade
– compreende técnicas que usam parâmetros de morte ou alterações fisiológicas
de diferentes linhagens celulares.
Pele
reconstituída – utiliza
fragmentos de pele humana com os quais podem ser utilizados em estudos
para observar alterações histológicas e de liberação de mediadores
inflamatórios
Nós como formandas em Biologia acreditamos que a
substituição de animais em nosso país, além da ética, também é questão legal. A lei federal
9.605/98 prevê penalidades (três meses a um ano de prisão, além de multa)
para o uso de animais em experimentos que envolvam dor, sempre que houver
métodos alternativos. Além disso, a objeção de consciência, assegurada pela Constituição,
pode ser utilizada para garantir os direitos individuais dos alunos que se
negam a assistir ou participar de aulas que utilizam animais. A utilização dos animais nas investigações científicas
deve ser vista sob três aspectos: científico, ético e legal. Se o pesquisador
mantiver a sua atividade equilibrada nesse tripé, terá maiores chances de
progredir sem comprometer o seu trabalho e o seu nome.
O presente ensaio foi realizado
para a disciplina de Etologia 1, tendo como base as seguintes obras:
ANDRADE,
A., PINTO, SC., OLIVEIRA, RS. (2002). Animais
de Laboratório: criação e experimentação. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ. 388
p. ISBN: 85-7541-015-6. Avail able from SciELO Books
CARVALHO,
A. M. A. Etologia e Comportamento Social. Disponível em:
Acessado em: 12 abr 2015
FAPESP
(2009). Pele recriada. Disponível
em: Acesso
em: 23 mar 2015.
FRANBLAT,
M, AMARAL, V. L. A & RIVERA, E. A, B (2008). Ciência em Animais de Laboratório. Ciência e Cultura. São Paulo:
v.60 ISSN 2317-6660
G1 (2013). Após
denúncia de maus tratos, grupo invade laboratório e leva cães beagle.
Disponível em:
Acesso em: 23 mar 2015.
RICHMOND,
J. (2002). Refinement, reduction, and
replacement of animal use for regulatory testing: future improvements and
implementation within the regulatory framework. ILAR Journal, 43(Suppl
1), S63-S68.
RIVERA,
E. A. B.; Amaral, M.H.; Pinheiro, V.(Org.). (2006). Ética e Bioética Aplicadas à Medicina Veterinária. 1 Ed. Goiânia:
Ed/orgs.v.1, p.159-186.
UFPR.
Ministério da Educação. Treinamento em
manipulação na experimentação animal (2012). Disponível em:
Acesso em: 12 abr 2015
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