Série Ensaios: Ética no Uso de Animais e Bem-estar Animal
Por Fabiana Ferreira e
Lilian Quintana Jankoski
Alunas especiais da disciplina do programa de Mestrado em
Bioética
Em 2013, a morte do cavalo
Parceiro no Rio de Janeiro inspirou um
vereador a criar projeto de lei que visa proibir uso a utilização e circulação
de veículos com tração animal em Paquetá, Rio de Janeiro. Parceiro era usado no
transporte de passageiros e morreu por conta de maus-tratos, ele era obrigado a
trabalhar até a exaustão, sendo socorrido em estado grave por veterinários da
Secretaria da Saúde. A morte do cavalo chamou a atenção para as péssimas condições de
saúde dos animais na região.
De acordo com a Lei Federal
9.605 de 12 de Fevereiro de 2008 (Brasil, 1998) “praticar atos de
abusos, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou
domesticados, nativos ou exóticos confere ao réu pena de detenção de três a um
ano”. Na maioria das vezes os maus-tratos com os animais sequer são
denunciados. Casos como o do cavalo parceiro do Rio são comuns em todo o
Brasil. Animais de tração, em especial cavalos, têm se tornado alvo de maus-tratos
e abandono, habitualmente usados para puxar carroças de carrinheiros que atuam
na coleta de materiais recicláveis. O Homem, desde os seus
primórdios, sempre teve uma estreita relação com o mundo animal, ligado,
sobretudo à sua própria subsistência e sobrevivência. Os animais sempre foram
elementos integrantes do meio ambiente que os rodeava. Sendo assim, ao longo
dos anos os animais foram cada vez mais utilizados para o benefício dos homens servindo
os como utilidade para a guarda, a utilização por deficientes físicos com os
cães guias e até mesmo em terapias. Segundo
estudos, o cavalo existe a cerca de 55 milhões
de anos, assim há alguns milhares de anos, homem e cavalo se
encontram para a realização de muitas tarefas que envolvem até hoje a
agricultura, o transporte e o esporte. A utilização de cavalos para o trabalho
teve início no meio rural onde habitualmente era utilizado como meio de
transporte e no dia-a-dia da rotina de trabalho.
Com o surgimento do
automóvel o animal foi perdendo o posto de principal meio de
transporte e passou a ser utilizado por uma grande parte da população carente.
A situação de pobreza vivida por muitas famílias faz com que o cavalo seja
usado para trabalho nos grandes centros e muitas vezes trabalham o dia todo ao
sol, sem água, sem comida e sem descanso.
De acordo com especialistas, o cavalo necessita de intervalos
e descanso adequado e não deve carregar mais do que 20% do seu peso.
Considerando a questão social, ambiental e urbana, a situação das
carroças puxadas por cavalos contraria os diversos aspectos. Por um lado os carrinheiros argumentam ser
esta a forma única de subsistência. Já pela questão urbana, o grande número de
veículos em circulação nas cidades, a circulação de carroças contraria até
mesmo as leis
de trânsito podendo até contribuir para o engarrafamento e a possibilidade
de acidentes. Na questão
ambiental, todos os direitos do animal são desrespeitados. Desde a
medicação e troca de ferraduras com materiais improvisados feitos pelos
próprios carrinheiros até a sobrecarga de trabalho e peso infringida ao
animal.
Na América Latina, a extinção do uso do cavalo para tração
nos centros urbanos teve início na Colômbia. O uso de
tração animal foi erradicado na capital, depois em mais duas cidades. Os
cavalos foram trocados por motocicletas elétricas. Israel, país em plena guerra deu um exemplo para por
fim à crueldade com animais. O país acaba de proibir carroças e carruagens de serem
puxadas por cavalos e burros. Em
Porto Alegre está em andamento a restrição gradativa de circulação de carroças
e carrinhos na Capital, determinada pela Lei nº 3.581/08, e que começou
a ser aplicada no dia 1º de outubro, nas regiões Centro-Sul, Cristal, Cruzeiro,
Glória, Lomba do Pinheiro, Partenon e Sul. A proibição deverá ter validade para
praticamente toda cidade até junho de 2015. Iniciativas como a de Porto Alegre
mostram que é possível encontrar alternativas para substituir o cavalo e
oferecer uma vida digna para carroceiros. Na
cidade de Belo Horizonte
o prefeito já sinalizou o fim da tração animal, da mesma forma que em Recife.
Analisando a situação pela ótica da Ética
Utilitarista – cujo principal disseminador contemporâneo é o filosofo Peter Singer - É imoral a
utilização do animal para servir o homem em qualquer instância – desde a
alimentação até a experimentação científica – quando se tem métodos
alternativos. Logo, a utilização de animais de tração, principalmente em
condições totalmente diferentes dos ambientes naturais – asfalto quente,
barulho e baixo grau de bem-estar animal – é intolerável! Partindo deste
princípio podemos sugerir que capitais como Curitiba comecem a pensar em leis
que mudem este cenário, com políticas que visam à substituição dos animais por
outros meios da mesma forma o vem acontecendo em outras capitais brasileiras,
por exemplo, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife.
Por outro lado o
filósofo Tom Regan defende
uma postura reganiana – ou seja deontológica: cuja
moralidade de uma ação não depende de suas consequências, como suposto pelo
Utilitarismo. Ele sustenta que, ao menos alguns animais – no mínimo todos os
mamíferos e aves – possuem desejos, crenças, memórias, percepções,
autoconsciência, intenção e sentido de futuro. Seu “bem-estar” não depende
somente de que tenham suas necessidades básicas satisfeitas, mas também de que
possam viver satisfazendo seus desejos e propósitos próprios, que irão variar
de acordo com a espécie em questão.
A Bioética é um instrumento
valioso para a sociedade se tornar mais respeitosa para com os animais, pois
ela nos permite refletir sobre como interagimos com esses animais e a forma
como o tratamos e o utilizamos. Entendemos que para existir equilíbrio
entre o homem e o equino precisamos reconhecer que não estamos
lidando com uma máquina ou uma ferramenta de trabalho, e o conhecimento e a aplicação
das Cinco Liberdades é fundamental: o animal deve
ser livre de fome e sede, livre de desconforto, dor, lesões e doenças, medo e
estresse e ter a liberdade de expressar o seu comportamento normal.
Nós como profissionais que buscamos estimular condutas
éticas para os animais acreditamos que o fim para esse problema seja a redução
gradativa do uso de cavalos por meio de leis municipais em conjunto com medidas
socioeducativas com o objetivo de buscar alternativas que beneficiem a todos os
envolvidos. A sociedade em geral deve também
cumprir o seu papel. É praticamente impossível controlar todos os abusos contra
os animais, por isso a população deve por si só respeitá-los e denunciar às autoridades
casos de maus-tratos, principalmente os de trabalho, facilitando assim que as
leis sejam cumpridas. O governo, por outro lado, deve criar leis mais efetivas,
realistas, regulamentá-las e principalmente, fazer com elas sejam cumpridas.
O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Bem Estar Animal,
baseado nas obras:
ALMEIDA E SOUZA, Mariângela Freitas. Implicações
para o bem estar de equinos usados para tração de veículos. Revista Brasileira
de Direito Animal, Vol. 1, 2006. Disponível em: < http://www.portalseer.ufba.br/index.php/RBDA/article/view/10247/7304> Acessado em: 09 Nov.2014.
BRASIL, Lei nº 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998.
Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas
ao meio ambiente e dá outras providências. Diário Oficial da União,
Poder Executivo, Brasília, DF, 13 Fev. 1998. Seção 1, pg 1.
DELABARY, Barési Freitas. Aspectos que influenciam
os maus tratos contra animais no meio urbano. Revista Eletrônica em Gestão,
Educação e Tecnologia Ambiental REGET/UFSM, Porto Alegre, 2002. Disponível
em: <http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/reget/article/viewFile/4245/2813>Acessado em: 09 Nov.2014.
MASCHIO,
Jane Justina. Os
animais. Direitos deles e ética para com eles. Jus Navigandi, Teresina, ano 10,
n.
771, 13 ago. 2005. Disponível em: .
Acesso em: 12 nov. 2014.
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