Um Olhar Para o Outro



Já faz algum tempo que olhares mais atentos têm se solidarizado com os impactos da vaidade humana nos animais que compartilham conosco nosso esdruxulo ecossistema urbano. As aves sempre fascinaram os sentidos dos seres humanos, os quais para suprir a sua demanda insaciável de admiração do canto, das cores e formatos e do desejo de posse - passaram a prendê-las em gaiolas e, assim, ter acessibilidade incondicional à existência desses seres. Ressalva-se, ainda - em tempos não tão remotos - a expressão cultural de caçar passarinhos com estilingues – o que ocasionou a disseminação das mais coloridas e alegres dessas criaturas. Os tempos mudaram, atualmente a consciência ética da “não promoção do sofrimento injustificável aos animais” tem ganhado cada vez mais adeptos. Cidades arborizadas se destacam no cenário de planejamento urbano e de promoção de bem-estar para os cidadãos, os quais cada vez mais prezam por um ambiente saudável. Contudo, fatos corriqueiros alertam que é preciso ajustar mais os olhares e questionar algumas atitudes para propiciar de fato um ambiente que seja bom para todos.
As aves por serem diurnas, coloridas e barulhentas estão nos alertando em alto em bom som a respeito de nossas condutas. A diminuição da área de fuga e a aproximação cada vez maior com humanos demonstra a escassez de alimentação natural, levando-as a buscarem produtos industrializados, os quais além de acarretar em impactos na sua saúde, colocam-nas em perigo. É comum presenciarmos aves mortas em ruas arborizadas, as quais demoram tanto tempo para reagir à aproximação dos veículos, que acabam sendo atropeladas. Outro ponto a ser considerado é o impacto da luminosidade no fotoperíodo desses animais alterando além de rotas migratórias, o horário de atividade e do canto, sendo comum nas grandes cidades ouvir cantos de aves nas primeiras horas da madrugada. Entre essas aves destaca-se o sabiá laranjeira, o qual com sua alta e estridente vocalização tem sido alvo de polêmica após a publicação de que cidadãos paulistanos estavam incomodados com o canto das aves e solicitavam uma providência da gestão urbana.
                A demanda por ambientes mais limpos visualmente tem levado à exploração excessiva de vidros, não apenas em janelas, mas também em muros, o que gera uma estatística de mais de 100 milhões de mortes de aves anualmente apenas nos Estados Unidos e de 250.000 por dia na Europa.  Segundo Liana Cézar Barros, da Faculdade de Engenharia Mecânica da UNICAMP a colisão de aves com vidros - reflexivos ou não - é a segunda causa antropológica de mortalidade de pássaros. A imoralidade das condutas está na existência de alternativas, marcas ultravioletas imperceptível para humanos sinalizam para os animais a existência de um obstáculo.
Eu fico muito feliz quando tenho a oportunidade de presenciar a compaixão de cidadãos portadores de olhares mais sensíveis para natureza e para vida cuja formação profissional passou longe dos animais. Essas pessoas que olham o outro – tão diferente de nós – com o olhar do outro se preocupa em proporcionar um bem-estar segundo as suas demandas.... Ao invés de prender os animais em gaiolas proporcionam um ambiente acolhedor que os fazem por vontade própria querer estar próximo e, assim, sabiamente desfrutarem mutualmente da companhia um do outro. Essas pessoas não transitam pela cidade e pela rotina distraídas e lutando contra o relógio, mas percebe e interage com os outros habitantes de nossas cidades e percebem que temos muito que fazer para sermos considerados cidadãos na concepção mais real e profunda que esse termo significa.