Série Ensaios: Sociobiologia
Por Larissa Pimentel, Luana Good, Maria Luiza
Antunes e Stephanie Prohnii
Acadêmicas do curso de
Ciências Biológicas da PUCPR
Uma menina recém nascida foi
encontrada por um cachorro em um terreno baldio em Fazenda Rio Grande, região
metropolitana de Curitiba. O cachorro começou a latir no local e os vizinhos
encontraram a recém-nascida. A mãe era Franciele Barbosa, de 20 anos, confessou
ter abandonado a filha logo após o nascimento dentro de uma mala de viagem e
disse não ter arrependimentos. A jovem Franciele disse que como já tinha um
filho, não tinha condições de cuidar da menina recém-nascida, então, abandonou
a criança no matagal, afirmando que “sabia que alguém ia achar e cuidar”. Em um
vídeo ela afirma “Meu
outro filho é tudo para mim, mas essa não teria como cuidar”. “Ela não ter
condições de cuidar, não justifica esse ato cruel, ela vai ser interrogada, mas
infelizmente não podemos mantê-la presa por não possuirmos o flagrante e nem
mandado” disse o delegado responsável pelo caso.
O
comportamento
social é definido como qualquer interação direta entre indivíduos da mesma
espécie, geralmente aparentados e vivendo em um grupo
organizados
de maneira cooperativa (DEL CLARO, 2004). A motivação
para que animais se mantenham em um mesmo espaço baseia-se nas vantagens que
esse comportamento traz como, por exemplo, a de garantir proteção, alimentação
e reprodução, facilitando a sua sobrevivência (KARKOW, 2013), estes fatores determinam a formação
de um grupo. O grupo é definido como, organismos que vivem juntos com uma
comunicação interativa, sendo que os principais grupos sociais são: os formados
pelas mães e seus filhotes, pais e filhotes, um par que se une durante um
período do ano ou por toda a vida, assim como grupos mistos, familiares ou não
(SOUTO,
2003). Existem diversas vantagens de viver
em grupo estando relacionadas com a proteção, manutenção do ambiente em que
vivem, reprodução, e alimentação dos indivíduos. Entretanto as desvantagens
também existem, bem como a falta de liberdade, maior proliferação de doenças e
parasitas, ampla concorrência e fácil detecção pelos predadores.
O
tema do presente ensaio é o amor
pelos filhotes, visando uma abordagem da rejeição e da adoção. O cuidado à prole requer um certo
investimento por parte dos pais, esta tarefa de é imprescindível para a
sobrevivência dos filhotes nos primeiros dias de vida, denominada de cuidado
parental (materno e paterno) sendo definido como qualquer forma de comportamento
parental que aparece provavelmente para aumentar a aptidão dos descendentes
(BOTTEGA, 2003). Os filhotes
de mamíferos nascem quase que completamente dependentes do comportamento
parental, principalmente do comportamento maternal, que visa nutrir, aquecer e
prover contato físico para a maturação
completa dos filhotes até que eles possam sobreviver sozinhos (TODESCHIN, 2008). Estudos demonstram que o
cuidado parental pode ter várias origens como gravidez psicológica,
comportamento cooperativo ou alta produção de ocitocina, hipótese mais viável
que justifica um gasto alto de energia a um filhote não biológico (MASSON,
1998).
A
maternidade e maternagem são termos que apresentam semelhanças em suas
descrições, mas possuem a maior diferença em sua essência. A maternidade é
classificada como a qualidade ou condição de ser mãe, é o laço de parentesco
que une mãe e filho. Já a maternagem é classificada como os cuidados próprios
de mãe, o cuidado materno, afetuoso, dedicado, carinhoso e maternal (MAGALDI,
2014). A maternagem seria um cuidado materno independente do laço sanguíneo. Atualmente,
muitas notícias evidenciam esse cuidado sem a ligação de sangue e mostram o amor
passado de mãe para filho de animais que adotam até mesmo filhotes de outras
espécies é cada vez mais comum, sendo vários casos bastante repercutidos,
questionados e admirados - Animais
adotam e amamentam filhotes de outras espécies; Tigresa
adota filhotes de porco; Galinha
adota filhotes de cachorro.
A
adoção
entre espécies diferentes ou entre uma mesma espécie pode ser proveniente de
vários fatores regidos pelo cuidado parental, motivados por estímulos de
proteção, afeto e atenção às necessidades do filhote abandonado (MASSON, 1998).
Este cuidado pode ultrapassar barreiras, podendo ocorrer entre grupos
distintos, por exemplo, aves e mamíferos. Como o caso de uma leoa no Quênia
que adotou sua maior presa natural, um filhote de antílope que perdeu sua mãe.
A leoa protegeu o filhote por semanas, para que outros leões não o atacassem,
passava horas observando-o e lambendo como se fosse seu próprio filhote, porém
ficou muito tempo sem caçar e ambos estavam muito fracos e com sede, por um
descuido o filhote acabou sendo devorado por um outro leão, e a mãe leoa não
pode ajuda-lo pois estava fraca. Ela tentou adotar outros filhotes de antílopes
porém tiveram o mesmo fim (REDERECORD,
2012). Essa é uma de muitas histórias
(Gata
adota e amamenta filhotes de pato; Chimpanzé
adota filhote de Puma) que atualmente ouvimos falar sobre adoção
entre diferentes espécies.
O
surgimento do “instinto materno” em fêmeas de mamíferos, tem ligação com os
hormônios produzidos pela hipófise,
sendo eles a ocitocina
e prolactina
(CAMARGO, 2013). Esses
hormônios têm como principal função a produção e secreção de leite, que são
estimulados pela sucção do bebê (NASCIMENTO &
COSTA,
2010). A ocitocina é descrita como “o hormônio do amor” (DACOME & GARCIA, 2008), considerado
como facilitador da motivação social e o comportamento de aproximação, e parece
ser fundamental para o estabelecimento de vínculos sociais (YOUNG, 1999), incluindo cuidados
maternos e paternos, ligação em pares, investigação social e comportamento sexual
(KARKOW, 2013). O desenvolvimento
da relação entre mãe e filho e do comportamento maternal é estabelecido
pela ocitocina, pois é transmitida ao bebé através do aleitamento materno.
Muitos casos de mães adotivas que conseguem amamentar já foram registrados e
para muitas o que seria um sonho pode se tornar realidade, sendo o processo de
produção do leite materno fruto de um estímulo repetido; onde ao sugar o seio,
o bebê ajuda a mandar uma mensagem para a hipófise, no cérebro, que avisa que é
preciso começar a produção do leite (LARA,
2012). Assim, o organismo da mãe libera a prolactina, que aciona as
glândulas mamárias para fabricar o leite, e a ocitocina, o hormônio responsável
pela liberação do líquido. Como vários fatores podem influenciar na amamentação
adotiva, como a idade da criança, hormônios e fatores psicológicos, na maioria
dos casos se é utilizado medicamentos que atuam na hipófise e aumentam a
produção da prolactina (LARA, 2012). A mãe perto da data do parto, inicia uma sequência
de mudanças comportamentais que visam receber adequadamente os filhotes (BENETTI, 2005). Durante o
período pós-parto é alterado em função dos cuidados da prole, como a
hipervigilância, e obsessividade que pode melhorar e garantir a saúde e
sobrevivência do recém-nascido (KARKOW, 2013). Por esse amor ao filhote, a mãe
renuncia muitas vezes às necessidades próprias para cuidar do recém-nascido,
perdoa sua irracionalidade, sendo fiel ao seu objetivo de cuidar da prole (AMARO, 2006).
Um
ambiente livre de estresse
é vital para o bem-estar da mãe e seus filhotes, se incidentes perturbadores
ocorrem frequentemente durante esta importante fase da vida, a mãe pode
interpretar os fatores de estresse como uma ameaça e como resultado, ela pode
simplesmente abandonar sua prole, ou em uma tentativa mais drásticas para
proteger seus filhotes de distrações que ela interpreta como perigo, a relação
dela com o ambiente é importante pois
ela pode abandonar, abortar ou matar se perceber que a cria não terá sucesso (PET,
2003).
Embora
a proteção e os cuidados da mãe “estranha” ajudem o filhote a sobreviver, por
terem características, necessidades e hábitos diferentes, ambos podem ter
problemas e confusão comportamental ao notar as diferenças presentes (ANDA,
2011). Podendo ocorrer um estresse psicológico, tanto na mãe adotiva quanto
no filhote. Isso acontece quando eles passam a agir conforme os instintos
pertinentes a suas espécies (PIRES,
2011). Portanto, a história do “Patinho Feio”, que fica triste ao perceber
as diferenças físicas e comportamentais existentes entre ele e sua família
adotiva, também pode facilmente acontecer na vida real dos animais (ANDA, 2011).
Nós acadêmicas de biologia
acreditamos que esse “amor” a prole está relacionado aos fatores biológicos,
como a produção da ocitocina no organismo da mãe, gerando esse apego para a
proteção do filhote, já que evolutivamente falando, essa proteção está
relacionada com o sucesso da passagem de seus genes. Portanto, acreditamos que
os comportamentos de cuidado parental estão ligados aos níveis hormonais, nas
ações de afetividade, proteção e cooperação, onde essas são desencadeadas por
estímulos interiores e exteriores interligados. Sendo assim, excede até mesmo
interesses de sobrevivência e propagação de espécies e barreiras de grupos distintos.
Porém, esses comportamentos podem apresentar reações contrárias quando os
hormônios e a afetividade se encontram em baixos níveis ou em deficiência,
podendo assim causar reações que não envolvam aqueles sentimentos que
normalmente uma mãe demonstraria a sua prole. Sendo estas reações atualmente
discutidas e de motivo para inúmeros estudos.
O Presente ensaio foi elaborado para disciplina de
Etologia, tendo como base as obras:
AMARO, J. W. F. Discomfort and
love. Revista
de Psiquiatria Clínica, v. 33, n. 6, p. 337-341, 2006.
ANDA
- AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DE DIREITOS ANIMAIS. Adoção
entre animais: um gesto de amor incondicional. Bauru, São Paulo, 2011. Disponível
em
Acesso em 08 de setembro de 2014.
BECKER,
M. J. A ruptura dos vínculos: quando a
tragédia acontece. Em S. Kaloustian (Org.), Família, 1994.
Brasileira:
a Base de Tudo (pp. 60-76). São Paulo: Cortez
BENETTI,
F. Intervenções na relação mãe-filhote e
seus efeitos nas respostas comportamentais e endócrinas na vida adulta.
Tese (Mestrado em Fisiologia), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2005.
BOTTEGA,
M. Influência do ambiente social e da
experiência sobre o comportamento de cuidade à prole em gerbilos da mongólia (Meriones unguiculatus). Tese
(Mestrado em Neurociências), Universidade
Federal De Santa Catarina, 2003.
CAMARGO, M. F. Maternidade: simples assim?. Sapere Aude-Revista de Filosofia, v.
4, n. 7, p. 477-482, 2013.
DACOME, O. A.; GARCIA,
R. F. Efeito Modulador da Ocitocina
sobre o Prazer. Saúde e
Pesquisa, v. 1, n. 2, p. 193-200, 2008.
DEL-CLARO, K. Comportamento
Animal: uma introdução à ecologia comportamental. Livraria Conceito, São
Paulo, 2004.
HRDY, S. B. Mãe Natureza: uma visão feminina da
evolução. Maternidade, filhos e seleção natural (A. Cabral, Trad.) Rio de
Janeiro: Campus, 2001.
KARKOW, A. R. M. Efeitos da manipulação neonatal sobre
comportamentos sociais e a expressão de receptores de ocitocina em ratos
neonatos e juvenis. Tese (Doutorado
em Neurociências), Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, 2013.
LARA, M. L. Mães Adotivas Podem Amamentar. Revista
Abril. São Paulo, 2012. Disponível em
Acesso em 12 de 2014.
MASSON, J.F. Quando os elefantes choram. Editora
Geração, 1998.
NASCIMENTO,
B. I. C. D.; & COSTA, T. R. A
importância da Enfermagem no incentivo ao aleitamento. Monografia
(Graduação em Enfermagem), Faculdade do Vale do Ipojuca, Caruaru, 2010.
PIRES,
L. Adoção faz parte do instinto dos
animais. Jornal da Cidade, Bauru, São Paulo, 2011. Disponível em
Acesso em 08 de setembro de 2014.
PET. Por que um cão mãe rejeita um filhote de
cachorro recém-nascido. Portugal, 2003. Disponível em
Acesso em 08 de setembro de 2014.
TODESCHIN,
A. S. Manipulação neonatal, ocitocina,
vasopressina e comportamentos sociais em ratos. Tese (Doutorado em Ciências
Biológicas: Fisiologia), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2010.
SOUTO,
A. Etologia: princípios e
reflexões. Editora Universitária UFPE, 2003.
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