Série Ensaios:
Ética no Uso de Animais
Por Leonardo José Lobo Brantes
Pós
graduando em Conservação da Natureza e Educação Ambiental
Nos últimos 60
anos houve um grande avanço na reflexão ética a respeito das relações entre o
homem e os demais animais, tanto ao nível social quanto acadêmico, em que
inúmeras pessoas mudaram a sua conduta depois que identificaram seus próprios
sentimentos em outros animais (Fischer
e Oliveira, 2012). Historicamente, o poder humano sobre os outros seres é
antigo, Pitágoras, no século VI a.C., já alertava para o valor inerente às
“coisas vivas”. O homem por sua vez, violou o “contrato animal” quando passou a
se considerar superior e também desenvolver técnicas de domesticação de plantas
e animais, com consequente aumento do seu território em detrimento do território
das demais espécies. (Fischer e Oliveira, 2012)
De acordo com vídeo publicado pela WPSA (1,2,3),
estima-se que atualmente no Brasil em cada quatro lares, um possua algum animal
como companhia. Em detrimento do ser humano querer recuperar o elo perdido com
a natureza, em busca de status, curiosidade ou ingenuidade, outros tipos de
animais têm sido cada vez mais comuns nos ambientes urbanos, os animais
silvestres.
A Lei 5.197/67, Lei de Proteção à Fauna, em seu artigo 1º define
fauna silvestre como sendo: os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase
do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro,
constituindo-se esta bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais, propriedades
do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou
apanha, excetuando-se os espécimes provenientes legalizados. Assim
sendo, temos que a comercialização em questão será permitida desde que haja o
devido registro das espécimes, devendo o IBAMA preocupar-se não só com o
criadouro comercial e comerciante, bem como, com o consumidor final, já que
este manterá sob seus cuidados e vontades, por toda a vida, o animal.
Segundo documento publicado pela gestão de 2011 a
2014 do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRVM) do Rio Grande
do Sul a regulamentação para a criação comercial de espécies silvestres
nativas: “está definida na Portaria
n° 118, de 15 de outubro de 1997 ,
que normatiza a criação para fins econômicos e industriais. Para a criação
comercial de fauna exótica, a Portaria
n° 102, de 15 de julho de 1998 ,
regulamenta a atividade. Além disso, a Resolução
nº 394/07, estabelece os
critérios para determinação de espécies silvestres a serem criadas e
comercializadas como animais de estimação.” É triste afirmar que a proibição não
garante a não criação desses animais, uma vez que a demanda para criação é
grande e envolve temas delicados como hábitos culturais, crendices e questões
sentimentais. Há de salientar que é cada vez mais comum que pessoas em todo
território nacional mantenham animais silvestres irregularmente em suas
residências, sem nenhum comprometimento legal, condições sanitárias ou garantia
de procedência dos animais, implicando assim para o tráfico de animais. Uma notícia
publicada no dia 12/05/2014 no National Geographic Brasil revela que a retirada de espécies
selvagens da natureza para suprir o mercado de bichos de estimação, sustenta uma das maiores ameaças
à biodiversidade brasileira, sendo
que é a modalidade de comércio ilegal que mais incentiva o tráfico de
animais silvestres no Brasil. “Segundo
um levantamento realizado pelo IBAMA, em 2002, os Núcleos de Fauna e os Centros
de Triagem de Animais Silvestres receberam um total de 44.355 espécimes
provenientes de apreensões, sendo que destes, 82,71% eram aves, 13,75% répteis
e 3,54% mamíferos. Já de acordo com um levantamento realizado pela Polícia
Militar Ambiental (PMA) do Estado de São Paulo com dados referentes ao ano de
2006, apenas naquele ano e somente no Estado de São Paulo, foram apreendidos
pela PMA (excetuando-se então apreensões realizadas pelas polícias Civil, Federal,
Rodoviária) 30.216 animais, sendo que destes 26.313 eram aves.” Ao retirar o animal do ambiente natural,
além do grande risco de mortalidade, extinção na natureza comprometimento da
dinâmica do ecossistema local, cria-se ainda um grave problema de equilíbrio
fisiológico, indução de estresse e indução de má qualidade de vida devido o
sofrimento do animal.
Para os animais silvestres, a vida em
cativeiro por mais confortável que nos pareça, significa a negação de toda sua
natureza. As necessidades comportamentais não se restringem apenas a sua
fisiologia. Como muitas vezes desconhecemos os sinais comunicativos dos animais
a ciência do bem-estar animal determinou que devem ser respeitados as Cinco
Liberdades dos Animais como condição de criação, a saber:
1.
Liberdade de
Fome e Sede
– Água limpa e freca e uma dieta saudável e equilibrada, de acordo com a
espécie
2.
Liberdade de
desconforto
– ambiente adequado, incluindo abrigo e uma área de descanso confortável
3.
Liberdade de
dor, ferimento ou doença – prevenção ou diagnostico e tratamento rápido
4.
Liberdade para
expressar o comportamento normal – Fornecer espaço suficiente, instalações
adequadas e companhia (preferencialmente de sua própria espécie animal).
5.
Liberdade de
medo e angústia
– proteção, garantia de condições e tratamento que evitem sofrimento mental,
medo e estresse
Torna-se de extrema importância
desenvolver então uma campanha rigorosa de fiscalização por meio dos órgãos e
entidades ambientais bem como estabelecer um lista detalhada das espécies que
poderão ser criadas e comercializadas como animais de estimação. Até o momento,
não foi publicada a lista destas espécies, conhecida popularmente como “Lista
Pet”.
·
Criação
de políticas públicas que ofereçam maiores oportunidades de educação e emprego
para as pessoas;
·
Campanhas
ambientais no sentido de conscientizar as pessoas da importância de manter os
animais em seu habitat natural e preservá-los;
·
Consolidação
de todos os diplomas legais referentes à proteção da fauna, com a criação de
uma Política Nacional de Proteção da Fauna,
·
Criação
de um tipo penal específico para o tráfico de animais silvestres punindo
severamente os traficantes, e compradores.
Dada a
conjuntura atual de grande declínio populacional por parte do tráfico, como
Biólogo penso que a vida é um valor universal e merece ser respeitada em todas
as suas virtudes, nossa responsabilidade é evitar sofrimento, e se existe uma
sequer possibilidade de senciência esta deverá ser priorizada em nossas
decisões. Que tenhamos bom senso e racionalidade para responder a tal
questionamento: será que não estamos sendo egoístas ou inconsequentes ao
retirar o animal da natureza, mesmo que este já seja nascido em cativeiro? Vale
a pena o sofrimento animal em detrimento do bem-estar de outrem? Você não
poderia estar contribuindo indiretamente com o tráfico e extinção de espécies
ao comprar um animal selvagem? A vida é um bem de todos, pense nisto!
O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Ética no Uso de Animais e Bem estar animal, baseando-se nas obras:
ABDALLA,
A. V. D. A proteção da fauna e o tráfico de animais silvestres. 2007.
235 (Dissertação de Mestrado). Direito, Uiversidade Metodista de Piracicaba,
Piracicaba.
BRASIL.
Lei 5.197 – Lei de Proteção a Fauna.
1967
CRMV. Guia
Básico de Legislação sobre, Criação, Comercialização e Manutenção de Animais
Selvages em Cativeiro. Rio Grande do Sul 2011/2014.
FERREIRA, J. M.
Tráfico de animais no Brasil e suas consequências. National Geographic
Brasil, 2014. Acesso em: 19/05/2014.
FISCHER,
M. L.; OLIVEIRA, G. M. D. A. E. Ética no uso de animais: A experiência do
Comitê de Ética no Uso de Animais da Pontifícia Universidade Católica do
Paraná. Estudos de Biologia, v. 34, n. 83, 2012.
WPSA.
Silvestre Não é Pet - 1/3 - Campanha
WSPA Brasil. Disponível em:
<
http://goo.gl/PaVxI9 >. Acesso em: 19/05/2014.
WPSA.
Silvestre Não é Pet - 2/3 - Campanha
WSPA Brasil. Disponível em:
<
goo.gl/Ckul4k>. Acesso em: 19/05/2014.
WPSA.
Silvestre Não é Pet - 3/3 - Campanha
WSPA Brasil. Disponível em:
<
goo.gl/nYCQLR>. Acesso em: 19/05/2014.
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