Guerra dos sexos? Quanto drama!



Série Ensaios: Sociobiologia

Por Cristiane Stacechen e Flávia Santos

Acadêmicas do curso de Ciências Biológicas

A diferença entre os seres humanos, mas especificamente entre homens e mulheres, é parte da história da humanidade estando presente nos mais diversos discursos - filosófico, religioso, biológico/científico, psicológico, antropológico e social. Mas é na modernidade que esse tema ganha maior relevância como objeto de análise (Araújo, 2005). Desde os tempos das cavernas, as atividades cotidianas já eram divididas entre o que era trabalho do homem e o que era trabalho da mulher. Trabalhos que exigiam mais força, como a caça e a proteção à família ficavam aos homens e zelar pelas crianças e idosos, pela alimentação e manutenção da caverna era as atividades das mulheres. Com o passar do tempo - mesmo com os avanços tecnológicos e consequentemente, com a modernização do mundo e ocorrendo mudanças e atingindo paradigmas criados - as divisões entre atividades masculinas e femininas se mantiveram. As diferenças e limites entre homens e mulheres virou mais do que uma questão cultural, passada de geração por geração. Ganhou força no enfoque biológico, o qual prova que essa questão vai muito além das questões sociais, psicológicas e antropológicas.
Atualmente, no ponto de vista biológico, por exemplo, segundo K. Pastore e V. França: “a principal diferença entre homens e mulheres se encontra na forma pela qual utilizam o cérebro. Nos homens, predomina o uso do lado esquerdo, responsável, entre outras funções, pelo raciocínio lógico. As mulheres usam tanto a porção esquerda como a direita do cérebro, que deflagra os mecanismos da emoção. Elas têm, por isso, uma relação mais estreita com todas as formas da linguagem. Eles são mais frios”. Segundo Doreen Kimura, neurologista da Universidade de Ontário Ocidental, Canadá, a descoberta de substanciais diferenças entre os sexos sugere que homens e mulheres possam ter interesses e habilidades diferentes, independentemente de qualquer influência social. Homens são de Marte, mulheres são de Vênus. Para o escritor John Gray é assim que a relação homem-mulher deve ser interpretada. Apesar de quase todo mundo concordar que homens e mulheres são diferentes, o como são diferentes, está ainda indefinido para a maioria das pessoas. Não somente homens e mulheres se comunicam diferentemente, mas pensam, sentem, percebem, reagem, respondem, amam, precisam e apreciam diferentemente. Eles quase parecem ser de planetas diferentes, falando línguas diferentes e necessitando de diferentes nutrientes. Muitas vezes, sem a consciência de que deveriam ser diferentes, homens e mulheres estão sempre em disputa uns com os outros.
Sendo tão diferentes assim, homens e mulheres também se inter-relacionam de maneiras diferentes. Para entender, é preciso voltar no tempo e fazer um passeio pelas savanas africanas, 3 milhões de anos atrás. O homem caçava e protegia a família. A mulher cuidava dos filhotes. Mas, em determinado momento, os casais se separavam. O objetivo da família nuclear - nome técnico que os antropólogos dão ao conjunto de pai, mãe e filhos - era garantir que o homem ficasse por perto tempo suficiente para criar o filhote. Somente isso. Quando o filhote já estava crescidinho e não exigia atenção integral da mãe, o pai estava livre para ir embora e procurar outras fêmeas para iniciar uma nova cria. Isso mudou e os homens passaram a cultivar relacionamentos monogâmicos.
O comportamento mudou, homens e mulheres passaram a ter mais tempo juntos, no entanto, cérebro e corpinho continuam sendo os mesmos. Então entram em cena os problemas mais comuns nos relacionamentos: a traição e o ciúme. As estatísticas variam, mas entre 50 e 60% dos homens praticam sexo fora do casamento, contra 45 a 55% das mulheres. As raízes disso estão dentro do cérebro. Os sistemas cerebrais (luxúria, paixão/amor e ligação) são independentes. Isso tem um motivo - e não é complicar os relacionamentos, pelo contrário: surgiu para que nossos ancestrais pudessem buscar estratégias reprodutivas diferentes. A mulher poderia ter um parceiro para protegê-la enquanto gerava os filhos de outro, enquanto o homem poderia espalhar seus genes alegremente por aí, com outras mulheres. A natureza não queria o ideal romântico de amor eterno, mas sim que tivéssemos um backup reprodutivo, um plano B genético, e nos meteu nessa confusão. 
O ciúme é destrutivo para os relacionamentos. Como tantas outras características, o ciúme não é exclusivamente humano. Por exemplo, existem aves que examinam a fêmea quando chegam ao ninho, assim, se ela tiver tido contato com outro macho, eles a rejeitam. O mais interessante é que esse monstro de olhos verdes - como chamou Shakespeare - surgiu com o objetivo oposto - preservar a relação monogâmica. Ao primeiro sinal de infidelidade, soa o alarme e a pessoa fica atenta. E, como homens e mulheres desenvolveram estratégias distintas de reprodução, também sentem ciúmes de coisas diferentes. Já que, por conta da fecundação interna, as fêmeas de mamíferos têm mais certeza de que os filhos são seus, os machos sempre ficam na dúvida. Essa diferença fisiológica na fecundação e gestação da prole influenciou na evolução do tipo de ciúme mais predominante em homens e no tipo mais predominante em mulheres. Os homens ancestrais temeram mais ajudar a criar um filho que não era deles e as mulheres ancestrais temeram mais perder o vínculo emocional e assim o cuidado paternos em seus filhos.
Em 2006, o neurologista japonês Hidehiko Takahashi realizou um estudo que comprovaram que, quando sente ciúmes, o homem usa partes do cérebro ligadas a comportamentos agressivos e sexuais, como a amígdala e o hipotálamo. Já nas mulheres, a área mais ativada durante as crises de ciúme é o sulco temporal posterior superior, associado à percepção de emoções nas outras pessoas. É por isso que há mais casos de crimes passionais cometidos por homens do que por mulheres. A máxima de que “quem ama cuida” é comumente citada pelos ciumentos. “Porém, quando esse sentimento passa a ser um sofrimento muito grande, a ponto de prejudicar a vida daquele que o sente, ou a de seu parceiro, pode se tratar de um quadro de ciúme patológico”, diz o psicólogo Thiago Almeida em matéria da revista Istoé de julho de 2012. Um caso real de ciúmes é uma história de amor iniciada há quatro anos que terminou em agressão e morte por ciúme excessivo. É assim que pode ser resumido o relacionamento do corretor de imóveis Bruno César Augusto Ribeiro, 30 anos, com sua mulher, a ex-modelo Babila Teixeira Marcos, 24. Após uma discussão, Bruno matou Babila a facadas. Um dos golpes desferidos esfacelou a maçã direita do rosto da jovem. Bruno foi indiciado por homicídio qualificado e motivo torpe. O desentendimento do casal parecia apenas mais um entre tantos, geralmente motivados pelo ciúme exagerado dele. O psicólogo César Ades afirma em entrevista que há toda uma problemática que pode ser abordada a partir das diferenças do tipo de concepção que a pessoa tem do comportamento amoroso que muitas vezes é influenciado por atitudes e visões sociais e relações que se adquire na infância. Se você adquire uma visão confiante, o ciúme tende a ser algo normal, mas se tem uma atitude ansiosa, tende a tornar uma pessoa muito preocupada.
Nós acadêmicas de biologia acreditamos que primeiramente as diferenças biológicas eram mais evidentes e aceitas por ambos os sexos. Cada um tinha sua função e cumpria com seu papel dentro do relacionamento. Com o passar do tempo, surgiram os problemas de comunicação, principal causa de confrontos entre os casais. Houve também a busca das mulheres, até então consideradas o “sexo frágil”, pela independência, seja ela financeira ou emocional. Desde então movimentos pela igualdade entre os sexos ganharam força e as diferenças, antes consideradas normais e fundamentais, tornaram-se motivos para se criar uma hierarquia entre os sexos. Atualmente os limites entre o biológico e o social se confundem, transformando o que era para ser natural em discórdia, despertando os piores sentimentos em cada sexo, levando ao confronto físico, e em casos extremos, ao assassinato.

Este ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia II, sendo baseado nas seguintes obras:

Flávio COSTA, Natália MARTINO e Paula ROCHA. O lado trágico do ciúme. Revista Istoé, 18 de julho de 2012 – ano 36 – N° 2227, pg. 74
John GRAY. Homens são de Marte, mulheres são de Vênus. Rio de Janeiro - 1996. Editora Rocco Ltda.