CRONOBIOLOGIA, DESVENDANDO OS RITMOS DA VIDA


Por Lício Domit; Marco Rodrigues; Priscila Bohrer

 Formandos do curso de Ciências Biologicas

            A Cronobiologia é uma disciplina científica que estuda a organização temporal dos seres vivos, abordando conceitos como ritmos biológicos e relógios internos. Estes, são compreendidos como a periodicidade em que ocorrem expressões do comportamento e fisiologia do organismo (1). Esses sistemas biológicos asseguram que os processos fisiológicos, bioquímicos e comportamentais ocorram em um nicho temporal ótimo, a obediência a esses padrões, selecionados durante anos de evolução, garantem a manutenção do desenvolvimento orgânico saudável e equilibrado (2).
            Os ciclos biológicos são classificados como circadianos (cerca de 24hrs), infradianos (inferiores a 28hrs) e ultradianos (superior a 20hrs). As características clássicas dos ritmos biológicos são: o ritmo é gerado endogenamente, tendo como expressão a sua persistência independentemente de fatores ambientais; é capaz de ser sincronizado por um ciclo ambiental e também apresenta compensação às variações de temperatura.  Praticamente todas as funções orgânicas apresentam oscilações, os ritmos biológicos são regulares e oscilações irregulares são reflexos a variações não periódicas do ambiente. Em resumo, apesar do relógio endógeno manter a periodicidade, os organismos dependem de pistas do ambiente para sincronizar suas atividades (2). Os ritmos biológicos estão presentes de cianobactérias a mamíferos, fornecendo vantagens adaptativas de vários tipos. Nos procariontes, surgem de forma a protegê-los de agentes foto-oxidantes. Nos organismos eucariontes pode ter surgido para protegê-los dos efeitos nocivos dos raios UV, numa época em que a camada de ozônio ainda não havia se formado. Com o aumento da complexidade dos seres, os ciclos biológicos aumentam a habilidade de prever acontecimentos e limitações impostas pelo meio, como disponibilidade de luz e alimento (2).       

Os primeiros relatos de ritmos biológicos foram propostos por J. J. De Mairan, que relatou que os movimentos das folhas de uma planta oscilavam num período de 24 horas, mesmo se privado do período claro-escuro. A primeira tese formal foi escrita em 1814, é de Julien – Joseph Virey (‘’Ephémérides de sesphénomènes dans La santé et lês maladies’’), sendo o primeiro a utilizar o termo relógio biológico.
Em 1960 ocorreu o – Cold Spring Harbor Symposia on Quantitative Biology:Biological Clocks: Marco inicial da Cronobiologia como disciplina formal, reunindo profissionais das áreas de Biologia, Medicina, Física, Matemática e Ciências Humanas. Os tópicos principais do simpósio enfatizavam regras e metodologias para a condução de estudos de cronobiologia e desenvolvimentos de métodos estatísticos específicos. No final da década de 70, Jurgen Aschoff sugere que a cronobiologia deve ser uma complementação da homeostasia, e no inicio do século XX, foram conduzidos muitos estudos para descobrir os mecanismos de controle dos ritmos biológicos, também criados e decifrados diversos conceitos e classificações. Pelo fato dos ritmos biológicos serem observados em quase todos os organismos, as pesquisas são muito diversas. Pesquisas em plantas vem mostrando a ação da luz, como reguladora desde a germinação até quando ocorrerá a floração. Desta forma, explicam também tropismos, regulação de hormônios, fotorreceptores e metabolismo fotossintético (2; 4). Nos invertebrados, os estudos de ritmos biológicos mostram que os controladores dos ritmos e da sincronização com o meio são os neurônios laterais, visto que possuem um sistema nervoso central simples, reagem com claro/escuro, interagem com fotopigmentos e fotoreceptores oculares (2; 5). Nos vertebrados, as pesquisas podem ser conduzidas às mais diversas hipóteses, visto que possuem um sistema nervoso central muito desenvolvido, e o sincronismo com o meio pode ter vários estimuladores, que por sua vez podem ser percebidos por diferentes receptores, desencadeando as reações, alguns exemplos são os ritmos circadianos e estados de dormência e hibernação. (6)
            Como todos os seres vivos, os humanos também são rítmicos desenvolvendo suas funções durante o dia e repouso e/ou período de sono a noite, evolutivamente explicado pela prática da pesca e da caça, acompanhando o ritmo dos recursos usados principalmente para a alimentação.  Porém na sociedade moderna esses ritmos não estão sendo respeitados, pelo acesso de luz e atividades sociais durante a noite acarretam em um atraso no relógio endógeno, alterando comportamentos e impondo riscos a saúde (2; 7)
            As novas tendências da Cronobiologia estão voltadas ao ser humano, visto que alterações de cunho cultural vêm modificando os hábitos da população, e como resultados estão aparecendo cronopatologias, doenças associadas ao desrespeito aos ritmos endógenos. A depressão e a maior vulnerabilidade a doenças em indivíduos que são submetidos a trabalhos em horários irregulares têm induzido pesquisas nesse sentido. Quando a pessoa troca o dia pela noite, ocorre a dessincronização interna, pois nem todos os ritmos internos se alteram rapidamente. Manifestando sintomas como desânimo, fraqueza, sonolência, descontrole, agressividade, ansiedade, alterações gastro-intestinais, obesidade (2; 7). Da mesma forma, outra linha de estudos possui uma abordagem terapêutica, a Cronofarmacologia, estuda a ação diferenciada de drogasao se escolher horários de administração de acordo com protocolos crono-biológicos, havendo a possibilidade de diminuir efeitos colaterais preservando o efeito desejado.
Nos formandos em biologia acreditamos que a sociedade humana moderna, com a necessidade cada vez maior de trabalhadores em horários irregulares e compromissos sociais noturnos, desrespeitam os aspectos evolutivos relacionados aos ritmos biológicos, resultando em danos à saúde física e mental dos envolvidos. Por esse fato a parte da biologia que estuda a dimensão temporal dos seres vivos assume importância fundamental, tanto por suas implicações teóricas como pelas possibilidades de aplicação na prática. Atualmente os organismos são estudados de uma maneira muito mais dinâmica deixando para trás uma visão mais estática dos seres vivos.

O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia e se baseou nas obras:
1.  ARAÚJO, J. F. & MARQUES, N. Cronobiologia: uma multidisciplinaridade necessária. Margem, São Paulo. Nº 15, p. 95-112. Jun. 2002. Disponível em: <http://www.pucsp.br/margem/pdf/m15jn.pdf>
2.  MOURA, L. N. & SILVA, M.S. Fundamentos evolutivos da ritmicidade biológica. Disponível em: . Acesso em: 23 Mar. 2012.
3.  MENNA-BARRETO, L & MARQUES, N. O tempo dentro da vida, além da vida dentro do tempo. Disponível em: < http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?pid=S0009-67252002000200030&script=sci_arttext>. Acesso em: 23 Mar. 2012.
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