Por Dulce F. de Carvalho, Kassiana R. dos Santos e Letícia Dalanhol
Acadêmicas do Curso de Ciências Biológicas
Há séculos estamos acostumados a pensar em nós mesmos como seres superiores, criados de acordo com um padrão divino. A ciência vem derrubando, o último refúgio onde ainda nos sentíamos seguros: a mente. Estamos descobrindo que, em termos de inteligência, cognição e psicologia, não somos tão especiais.Durante muito tempo o homem admitiu ser a única espécie inteligente, capaz de pensar, estabelecer raciocínios, aprender e memorizar, apesar de muitos filósofos e cientistas da antiguidade afirmarem a existência de uma inteligência animal que iria alem do instinto. Aristóteles definiu cognição como o processo responsável por armazenar conhecimento, transformá-lo e resgatá-lo sempre que preciso.Sendo assim os animais não são tão diferentes de nós, cada vez mais a ciência prova que a mente dos animais é muito mais sofisticada do que se imaginava. Novos estudos ao redor do mundo começam a descobrir que habilidades antes atribuídas apenas ao homem podem ser encontradas em outras espécies: golfinhos imitam gestos humanos elefantes se reconhecem quando olham no espelho ovelhas, ovelhas reconhecem as pessoas, macacos fabricam ferramentas e alguns espécies parecem raciocinar.
A ideia de consciência animal ainda é rejeitada, essa rejeição por parte dos pesquisadores tem raiz em René Descartes. O matemático francês colocou os animais em um segundo plano intelectual. Descartes dizia que a mente dos animais funciona como uma máquina, e que nenhum animal é capaz de ter sentimentos. Donald R. Griffin criou o campo de investigação a que chamou etologia cognitiva, sem o qual o estudo comparativo do comportamento animal (etologia) fica incompleto. Colocou no seu centro a consciência animal, criticando severamente a concepção cartesiana, de que os animais são meras máquinas que não pensam. As primeiras pesquisas de cognição animal utilizavam estímulos simples como luzes coloridas, sons e cliques. Esses estímulos talvez tenham sido básicos demais para permitir uma compreensão do processo cognitivo animal, pois não permitiam aos animais exibirem a gama completa de capacidades de processamento de informação. Pesquisas posteriores utilizaram elementos mais complexos, tais como fotos coloridas e objetos conhecidos. Esses estímulos fotográficos revelaram capacidades conceituais até então não atribuídas aos animais. Observou-se ainda uma memória animal complexa e flexível e pelo menos alguns processos cognitivos operando de modo semelhante no animal e nos seres humanos. Os animais de laboratório são capazes de aprender conceitos variados e sofisticados. Eles exibem processos mentais tais como a codificação e organização de símbolos, a capacidade de formar abstrações espaciais, temporais e numéricas e perceber as relações de causa e efeito. Além disso, o uso que fazem de ferramentas e outros acessórios implica um sentido básico de raciocínio .
Um dos aparelhos mais conhecidos para o estudo animal é a "Caixa de Skinner" desenvolvida pelo psicólogo Burrhus Frederic Skinner, que consiste basicamente em uma caixa-problema, na qual o animal aprende, por ensaio e erro, que o acionamento de uma alavanca produz uma recompensa (MANNING, 1979). Talvez o caso mais famoso de cognição animal na ciência tenha sido o do papagaio Alex que morreu aos 31 anos em 2007. Em 1977, a psicóloga Irene Pepperberg, juntou-se a Alex, um papagaio cinzento com um ano de idade, na tentativa de descobrir o que se passava na mente de um animal de outra espécie conversando com ele. (veja o vídeo). Pepperberg enfrentou críticas, deboches e ceticismo dos colegas acadêmicos. Mas Alex, pegou todos de surpresa. O papagaio aprendeu a falar. Não apenas a reproduzir o som, como muitos fazem, ele expressava em frases seus desejos, como dizer: “Quero uvas” quando estava faminto. Alguns testes feitos por Pepperbeg mostraram que o animal raciocinava. Ao ver duas xícaras com o mesmo formato, Alex dizia o que elas tinham de diferente: “A cor”. Além disso, ele sabia contar. Cansado dos exercícios cognitivos, pedia à sua dona: “Quero ir para a árvore”. A antropóloga britânica Jane Goodall, mostrou que os chimpanzés e os bonobos africanos são capazes de usar ferramentas e identificou neles cultura, raciocínio e capacidade de aprendizado. Chimpanzés são animais inteligentes e, por isso mesmo, lideram as pesquisas que buscam compreender a mente dos bichos. Mas eles também exibem comportamentos surpreendentes, como o altruísmo. Até pouco tempo, os cientistas acreditavam que somente o Homo sapiens, contrariando a lei da sobrevivência, era capaz de abrir mão de algo para ajudar outro indivíduo da espécie. Um Estudo divulgado pelo Instituto Max Planck de Ornitologia, em Seewiesen, na Alemanha indicam que pássaros pertencentes à família Corvid (dos corvos e gralhas) são considerados mais inteligentes que muitas outras espécies de aves. Seus desempenhos em testes de inteligência são tão altos quando os dos grandes primatas. Mesmo não tendo mãos ou patas, os corvos fazem gestos para atrair a atenção de seus semelhantes. Com suas asas e o seu bico, as aves também fazem uso desta maneira de se comunicar que, até então se acreditava que era exclusiva dos humanos e primatas (veja o vídeo). Inúmeros testes são feitos com animais em cativeiro, porém estamos sujeitos a interferências vindas do contato com os humanos. Para definir o grau de inteligência de um animal devemos observá-los em ação no seu ambiente natural.
É muito difícil interpretar as reações dos animais sem correr o risco de antropomorfismo. Segundo o psicólogo americano Clive Wynne, professor da Universidade da Flórida os animais são mais complexos do que imaginamos, e é preciso tomar cuidado quando tentamos compará-los a nós, afinal jamais saberemos ao certo o que se passa na cabeça de um elefante, simplesmente porque não fazemos idéia de como é ser um. Nós formandas de Biologia acreditamos que cada espécie animal tem suas próprias capacidades. Não somos superiores. Esta é a grande lição das pesquisas a respeito da cognição animal: a de humildade. Não somos os únicos capazes de inventar, planejar ou observar a nós mesmos. Existem animais com percepções do mundo diferentes das nossas, com inteligências desenvolvidas de maneira diferente a que estamos habituados.
Será que o homem terá a inteligência para perceber isso?
O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Etologia I e baseado nas obras:
ADES, C. O morcego, outros bichos e a questão da consciência animal, Psicologia USP, São Paulo, vol. 8(2), 1997.
CORDEIRO, T. Animais: gente como a gente. Disponível em: <http://super.abril.com.br/mundo-animal/animais-gente-como-gente-446505.shtml> 2006. Acesso em: 16 de março de 2012.
ESTEVAN, A. Assim como os primatas, corvos também são capazes de fazer gestos. Disponível em: <http://viajeaqui.abril.com.br/materias/assim-como-os-primatas-corvos-tambem-sao-capazes-de-fazer-gestos> National Geographic Brasil, 2011. Acesso em 16 de março de 2012.
MANNING, A. Introdução ao comportamento animal. Rio de Janeiro: Livros técnicos e científicos, 1979
MORELL, V. Mentes que brilham. Disponível em: <http://viajeaqui.abril.com.br/materias/mentes-que-brilham?pw=1> National Geographic Brasil, 1996. Acesso em 16 de março de 2012.
NASCENTE, C. Inteligência animal é muito maior do que se imaginava. Disponível em: <http://ambientalsustentavel.org/2011/estudos-indicam-que-a-inteligencia-animal-e-muito-maior-do-que-se-imaginava/> 2011. Acesso em: 16 de março de 2012.
MORELL, V. Mentes que brilham. Disponível em: <http://viajeaqui.abril.com.br/materias/mentes-que-brilham?pw=1> National Geographic Brasil, 1996. Acesso em 16 de março de 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário