Por Marta L Fischer
Docente PPGB-PUCPR
Esse post foi motivado com a matéria assinada por Petter Singer e Paola Calavieri que fazem uma reflexão dos “mercados úmidos”, onde se comercializa e abate animais vivos, comuns em muitos países asiáticos e resultantes da transmissão de muitas zoonoses. Os autores caracterizam perfeitamente o assustador cenário vivenciado nos últimos meses e as milhares de vertentes de debates desde a restrição do direito individual em prol da coletividade, a omissão da China, uma provável manobra econômica, porém não se fala de onde veio esse vírus com alto poder de transmissão e resultou em uma pandemia tão drástica que levou as nações a fecharem suas fronteiras, identificadas em cenas premonitórias de filmes e séries apocalípticas.
Desde o começo da pandemia se sabia que o paciente zero estava no mercado de frutos do mar da cidade de Wuhan, na China “Wuhan’s Huanan Market”, provavelmente associado com consumo de carne de cobras. No mercado se comercializa animais silvestres vivos como aves, marmotas, morcegos, pássaros, sapos, ouriços, filhotes de lobos, cigarras, escorpiões, ratos, esquilos, raposas, civetas, porcos-espinhos, salamandras, tartarugas e crocodilos e coelhos. O coronavírus faz parte de um grupo de zoonoses da família da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS-CoV) e são capazes de infectar vários animais, a G1 cita um estudo realizado com genoma do vírus relacionando com cobras chinesas (Bungarus multicinctus), porém ainda incompreensível se o vírus deu um salto de um animal ectotérmico para o homem ou outras espécies intermediaram o processo. A segunda hipótese aposta que o coranavírus é originário de morcegos, que possivelmente infectaram pangolins, que estão em risco de extinção justamente por serem amplamente consumidos como zooterapêuticos na China e outros países, e parece que o vírus foi identificado nesses animais. Porém, as pesquisas conduzidas com inúmeros animais não são capazes de explicar se o vírus tem sofrido mutação em decorrência das condições de confinamento e proximidade entre as espécies, no próprio mercado.
Mais importante do que identificar exatamente a espécie agora é se conscientizar que a existência desses espaços, embora agregue um alto componente cultural, expõe um risco de dimensões imensuráveis como a situação que estamos vivendo. Em nossa pesquisa sobre o uso de animais como zooterapêuticos discutimos a questão sobre a perspectiva bioética ressaltando que a amplitude e a abrangência temporal, cultural e geográfica desta prática milenar não deve ser negligenciada por setores acadêmicos e regulatórios da sociedade. Para tal, é fundamental o estabelecimento de uma comunicação multidimensional e sem ruídos entre os agentes morais representantes dos três pilares da sustentabilidade - sociedade, ambiente e economia - envolvidos nessa questão ética global e complexa. Entendemos que o fator cultural é importante para identidade de uma nação e que conflui com questões econômicas, porém já vivemos em uma aldeia global, os interesses individuais ou locais não podem colocar em risco toda uma coletividade.
Petter Singer e Paola Calavieri apontaram, ainda, a questão do bem-estar-animal, as condições em que os animais são expostos, conclamando por uma proibição mundial desses mercados. A questão em debate deve ser a aceitação das inter-relações das espécies, dos limites praticados com relação aos animais e a conscientização de que nossas decisões nesse mundo globalizado trazem consequências inimagináveis. É um outro tempo, os problemas são novos, não dá para resolver da mesma forma. A Bioética Ambiental é a ponte e a Saúde Global (física/menta/espiritual x ambiental x global) o indicativo de que estamos restabelecendo o almejado equilíbrio com a natureza e prezando pelo outro, seja ele animal, a pessoa que vive em outro continente ou no futuro!