segunda-feira, 12 de maio de 2014

Curso de Ética no Uso de Animais selvagens mantidos cativos


Durante a XV Biocec eu, a Flávia Amend, Lays Parolin e Roseli Silvério, ministramos mais um curso que visa a capacitação e aprimoramento de profissionais interessados em atuar na área ética animal contribuindo significiativamente para mudança de paradigmas no uso de animais para as diferentes finalidades pela sociedade. Desta vez, nossa preocupação foi refletir sobre as questões éticas envolvidas no confinamento de animais selvagens para pesquisa, comércio e conservação, para tal aprofundamento a temática relacionadas aos parâmetros fundamentais que devem ser considerados nos criadouros científicos, comerciais e conservacionistas.
            Quando se trata da manutenção de animais silvestres em cativeiro, sempre há uma polêmica. “Por que tirar os animais de vida livre de seu hábitat? Por que privar de sua liberdade?” As razões e justificativas são várias, entretanto, no caso de estudos científicos que visem a conservação da natureza, ou seja, pesquisas que busquem responder perguntas e traçar metas em prol da conservação de espécies da flora e fauna, a coisa muda de figura. Ou não muda? Os fins justificam os meios? Aqueles animais retirados das florestas, campos, rio e mares tiveram a escolha de sair? Eles gostariam de estar servindo em prol deste “bem maior”? Provavelmente não. Mas então o que fazer? Cessar as pesquisas? Mas e os projetos de reprodução e reintrodução de espécies ameaçadas? Iniciativas, como a bem conhecida do mico-leão-dourado, não seriam possíveis com ajuda de algumas matrizes da natureza. Tantos projetos nesta mesma linha necessitaram tirar alguns indivíduos do seu hábitat para estudar sua ecologia e comportamento, para assim poder contribuir para a conservação da espécie, conservação ou até mesmo recuperação de áreas degradadas. Nesses casos a manutenção em cativeiro pode ser considerada justificável. Entretanto, estes animais cativos devem possuir condições de bem-estar nestes recintos científicos, tendo garantidas as suas 5 liberdades. Alguns destes itens parecem um tanto óbvios e fáceis de conquistar, entretanto, alguns deles retornam em forma de perguntas: “Mas como saber se um animal silvestre está tendo seu comportamento normal, se não conheço este comportamento? Como saber se está com medo ou estresse?” Observações in situ podem sim fornecer informações valiosas, mas estas nem sempre são possíveis ou fornecem todas as informações necessárias. É um ciclo, pois para proteger e conservar, é preciso conhecer. O cativeiro não é a única forma, mas sim uma delas, trazendo uma ferramenta importante para a proteção da fauna e flora.
Os primeiros zoológicos instituídos serviam basicamente para manter uma exposição de animais e promover lazer humano. Não havia a mínima preocupação com o bem-estar dos animais mantidos ali. A partir do século XX, com o aumento do conhecimento sobre a vida dos animais na natureza foi verificada a necessidade de mudanças. Gradativamente os recintos antigos foram sendo substituídos por recintos naturalísticos, que tentavam simular o ambiente natural das espécies. Inicia a preocupação com o bem-estar dos animais. Em conjunto com as mudanças na estrutura dos recintos, os zoos passaram a ter outros objetivos: educação ambiental, pesquisa científica e conservação das espécies. Isto porque apesar de algumas espécies mantidas em zoos terem melhores condições de saúde e maior longevidade e sucesso reprodutivo do que seus co-específicos na natureza, de maneira geral os animais mantidos em zoos exibem comportamentos anormais, os quais frequentemente estão relacionados ao estresse e indicam baixo grau de bem-estar animal. O que compromete os objetivos dos zoológicos, especialmente a conservação. Daí vem a necessidade de se praticar o bem-estar animal como uma ferramenta para mensurar e minimizar os efeitos nocivos do cativeiro. O grau de bem-estar animal pode ser mensurado, basicamente, através das condições de saúde do animal; presença de comportamentos anormais e indícios de estresse. Através da observação do comportamento animal podemos estimar a respeito destes fatores e verificar a eficácia das técnicas aplicadas para melhorar as condições de bem-estar animal.          Além disso, atualmente se tem utilizado métodos não invasivos para monitoramento hormonal. Vários produtos têm sido utilizados para se obter amostras e dentre eles o uso de fezes têm se mostrado bastante eficiente devido a ausência total de estresse para sua obtenção.   Após estimar o grau de bem-estar deve-se elaborar formas para melhorar as condições do animal. O enriquecimento ambiental é uma técnica amplamente utilizada para melhorar a qualidade de vida de animais em cativeiro, pois promove alterações no recinto que aumentam as possibilidades de exploração e comportamentos naturais além da redução de estereotipias e dos níveis de hormônios relacionados ao estresse.
Dentre os três tipos de confinamento o criadouro comercial é o mais polêmico, pois comercializar animais selvagens ou exóticos como pet transcende a compreensão dos motivos que levam as pessoas a quererem ter pet não convencional como animal de estimação. Segundo os defensores dos criadouros comerciais, eles são alternativas para conter uma necessidade que é inerente à natureza humana – desde os índios a pratica de se apropriar de animais nativos é desejada e traz satisfação para o homem. Ao oferecer animais criados para essa finalidade, haveria uma coibição da aquisição de animais através do comércio ilegal e essa seria uma forma de conter o tráfico de animais. Para que a manutenção de animais de estimação possa ser considerada, ela deve estar em consonância com os princípios éticos e os interesses das partes envolvidas com mútuos benefícios e havendo respeito entre os limites e as necessidades de cada animal, bem como os limites, aspirações e recursos da pessoa que queira mantê-lo sobre sua posse. Há ainda, que se pensar a domesticação sob ponto de vista do homem. É praticamente impossível emitir um laudo de sanidade para muitos animais, em função da falta e mesmo inexistência de meios diagnósticos suficientes. Alguns animais podem, por exemplo, ser portadores de raiva em fase de incubação, não detectável pelos meios diagnósticos disponíveis. A manutenção de serpentes peçonhentas em casa, em geral exóticas, oferece o risco de picadas para as quais não existe soro específico em nosso meio, o que acarretará morte inevitável do acidentado. Aranhas caranguejeiras podem ser responsáveis por processos alérgicos graves. Um único pêlo inalado pode levar ao choque anafilático. Outro risco é o da leptospirose, já tendo sido encontrado um bugio portador desta doença. Certamente muitas outras doenças ainda pouco conhecidas podem ser transmitidas por animais silvestres. 

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