A Ética Utilitarista E A Utilização De Animais Silvestres Em Zoológicos: Sofrimento X Benefícios


Série Ensaios: Ética no uso de Animais

Por Willian Almeida



A discussão sobre o bem estar animal vem ganhando cada vez maior relevância. Um marco nos estudos relacionado ao tema está no crescimento de pesquisas relacionadas à etologia desde 1970. Até então, tinha-se a visão consolidada de Descartes, considerando que os animais não sentiam dor, apenas expressavam um reflexo mecânico. Grande parte do conhecimento nestas pesquisas está relacionado a animais de produção pecuária e animais utilizados em pesquisas e estudos. O estudo sobre os sentimentos do animal constituem uma parte importante do seu bem-estar Tais estudos são expressos pelo termo senciência que é a capacidade de sofrer, sentir prazer ou felicidade. Neste sentido, não é possível estudar o bem-estar animal sem uma convicção da senciência. Pode ser considerado um fato inquestionável cientificamente de que pelo menos os animais vertebrados sofrem e são seres sencientes. Ainda, a senciência provavelmente existe em diferentes graus de complexidade nas diferentes espécies.
Considerações éticas podem ser realizadas antes e após a avaliação do bem-estar, sendo em muitos casos responsáveis pelo início da avaliação. A abordagem utilitarista de Peter Singer condena o ato de causa sofrimento aos animais não humanos, sem questionar a utilização de animais. A teoria do bem-estar animal aceita que os animais têm interesse, mas que esses interesses podem ser sacrificados em prol de alguns resultados, desde que justifique sua utilização e eventual sacrifício. O bem-estar de um indivíduo é seu estado em relação às suas tentativas de adaptar-se ao meio ambiente. De uma forma um pouco utópica mas bastante expressiva, foram criados os cinco princípios de liberdade: Livre de fome e sede; Livre de desconforto; Livre de dor, ferimento e doenças; Livre de medo e angústia; Livre para expressar seu comportamento natural. Para efetuar a avaliação do bem-estar animal deve ser realizada de maneira separada a considerações ética e deve referir-se a característica do animal individual, e não a algo proporcionado pelo homem. Esta avaliação envolve estudos fisiológicos e comportamentais, que necessitam de grande conhecimento sobre a biologia do animal.
A legislação brasileira relacionada ao bem-estar animal teve início com o Decreto n 24.645 de 1934, que estabelece as medidas de proteção animal. Além destas, existem outras legislações relacionadas direcionadas ao bem estar de animais utilizados na pecuária ou pesquisa científica. Um marco mundial relacionado ao tema está relacionado á “Declaração Universal dos Direitos dos Animais”, aprovado pela UNESCO em 1978. No seu conteúdo, a declaração define, dentre outros, o direito de animais silvestres em viver livres em seu habitat, a não utilização de animais em experiências que causem dor e a proibição quanto á utilização de animais para divertimentos dos homens.Dentro deste contexto, no Brasil em outros países existe a prática de exposição de animais silvestres por meio de zoológicos. Animal silvestre pode ser definido como “um animal de vida livre ou em cativeiro, de uma espécie que vive naturalmente no meio silvestre sem interferência humana, e cujos pais e antepassados não foram seletivamente cruzados para docilidade ou fácil manejo”.
Recentemente foi divulgado pela mídia o caso do leão Rawell, furtado de um criadouro em São Paulo. Após ser encontrado, o leão foi finalmente transferido para ficar em exposição no zoológico de Curitiba por decisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Ainda segundo o portal, Rewell foi encontrado quando filhote em uma carreta de circo em 2008 e foi encaminhado a um criadouro onde permaneceu até então. Esta cultura de manutenção de animais selvagens foi iniciada com os egípcios, que mantinham animais capturados em viagens ou batalhas como símbolo de poder. O primeiro zoológico moderno foi o Imperial Menagerie, construído em 1752 em Viena. Nos anos 80 e 90 pesquisas demonstraram que parte da população europeia era contaria ao confinamento dos animais e recusava-se a ir aos zoológicos. Atualmente, os parques zoológicos têm os objetivos de conservação da espécie, desenvolvimento e aperfeiçoamento profissional, pesquisa científica, educação ambiental e o lazer dos seres humanos. Segundo a legislação, as dimensões dos Jardins Zoológicos e das respectivas instalações devem atender aos requisitos mínimos de adaptabilidade, sanidade e segurança de cada espécie. As legislações ainda estabelecem o número máximo de exemplares em cada alojamento ou número máximo de exemplares por recinto.


O cativeiro animal é diferente do ambiente natural e leva muito animais a terem um comportamento anormal, já que os locais onde ficam confinados não proporcionam as mesmas condições que o habitat natural. Fatores que afetam o bem-estar de animais silvestres podem ser classificados amplamente como ocorrência natural (doença, predação, incêndio e outros) e antropogênico (Direta ou indiretamente causados por humanos). Pouco ainda se sabe sobre questões relacionadas à dor em animais animais silvestres.O estabelecimento de bem-estar animal envolve os estados físico (condição), mental (sentimentos) e “naturalidade” (telos). Para minimizar os efeitos prejudiciais e melhorar o bem-estar o enriquecimento ambiental é um importante aliado. Este objetiva tornar estes locais mais favoráveis á vida destes animais. O enriquecimento divide-se em físico, sensorial, cognitivo, social e alimentar. As técnicas de enriquecimento comportamental são utilizadas para reduzir o estresse causado pelo cativeiro, que pode manifestar por respostas fisiológicas inadequadas e padrões de comportamento atípicos para a espécie. Modificações estruturais, mudanças na rotina e socialização são medidas suficientes para melhorar o status psicológico e o bem-estar.
Como profissional da área ambiental, acredito que se considerarmos os grandes avanços científicos na área de bem estar-animal é de extrema importância que estes fatores sejam verificados também no manejo de animais em zoológicos. Considerando que não existam respostas claras sobre quais animais são sencientes, existe uma obrigação moral de tratá-los como seres sencientes pelo Princípio da Precaução. Ou seja, o enriquecimento ambiental é algo que deve ser utilizada obrigatoriamente, principalmente para animais vertebrados. Tendo em vista a abordagem ética utilitarista proposta por Singer, é necessário que desconforto sofrido pelo animal os benefícios que esta ação possa gerar. Desta forma, no caso de um leão que possui suas condições drasticamente alteradas quando em uma jaula, considerando também a grande área requerida por esta espécie, fica a reflexão: Os benefícios advindos de tal atividade compensam a dor ou sofrimento causado ao animal?

O presente ensaio foi elaborado para disciplina de Ética no uso de animais e bem-estar animal, tendo como base as referências:

http://www.unb.br/posgraduacao/docs/fav/BEMESTARANIMALCONCEITOQUESTOESRELACIONADAS