segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Ajustando os ponteiros: A importância da Cronobiologia para a sobrevivência dos animais.



Série Ensaios Aplicação da Etologia

Por Gabriela Lourenço Leviski
Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas

            A Cronobiologia surgiu há cerca de 250 anos com a intenção de estudar como tempo influencia no funcionamento da vida, tanto durante o dia (variações circadianas), como durante as estações do ano (variações sazonais). O primeiro cientista a estudar o relógio biológico foi o francês Jean-Jacques d’Ortous de Mairan, em 1729. Ele percebeu que uma determinada planta abria-se conforme a luz. Curioso, levou a planta até o porão e verificou que mesmo no escuro total a planta continuava a se movimentar, sincronizada com o dia e com a noite. A idéia não foi bem aceita na época, sendo a Cronobiologia reconhecida oficialmente apenas em 1960, durante o Cold Spring Harbor Symposium of Quantitative Biology – Biological Clocks, momento em que os principais conceitos e métodos dessa nova ciência foram definidos.  
Não é preciso ser nenhum renomado cientista para perceber que algumas plantas germinam em determinadas épocas, desabrocham em outras, ou ainda perdem folhas em épocas bem determinadas, bem como os animais migram em certos meses, enquanto em outros se acasalam. Porém, a maioria das pessoas não consegue compreender “como” e nem o “porque” das plantas e os animais agirem dessa forma.  Atualmente a ciência descobriu que todos os seres vivos possuem genes marcadores do tempo, responsáveis pelo controle dos relógios biológicos que marcam o tempo interno do organismo. Porém, os ritmos biológicos não são determinados apenas por fatores endógenos, eles atuam em sincronia com ambiente. Isso permite ao organismo antecipar e se preparar para mudanças físicas no ambiente que estão associadas com a noite e o dia. Os ritmos biológicos estão presentes nos vários níveis de organização e complexidade de seres vivos, desde em cianobactérias até em mamíferos, o que sugere que eles devem fornecer vantagens adaptativas para os mesmos.  Este vídeo (clique aqui para ver) mostra a importância dos ritmos biológicos para os diferentes animais. Os organismos apresentam ritmos sazonais, e desenvolveram estratégias para garantir sua sobrevivência. Essa adaptação sazonal envolve mudanças no comportamento, na alimentação, na reprodução, na coloração e, em alguns animais específicos, na preparação para hibernação. Essas mudanças permitem aos organismos melhores condições de sobrevivência durante estações não favoráveis do ano. A principal estratégia na reprodução, por exemplo, é a ovulação da fêmea e a receptividade ao macho ocorrer durante um determinado período sazonal, o que levaria a uma maior chance de sobrevivência dos filhotes, já que esses nasceriam numa época de alimento abundante no ambiente.
            O principal marcador sazonal para os organismos é a mudança no fotoperíodo, por ser um sinal mais reprodutível e previsível da mudança de estação, no entanto, variações na temperatura também podem ser utilizadas por algumas espécies como sinal sazonal. A informação de claro ou escuro é fornecida aos organismos por um hormônio chamado melatonina, produzido principalmente pela glândula pineal, que é liberado exclusivamente durante a noite, tanto em animais de atividade diurna quanto em animais de atividade noturna. A melatonina é uma molécula filogeneticamente antiga, presente na maioria das espécies, inclusive em organismos unicelulares. As plantas usam o relógio biológico circadiano para restringir algumas atividades fisiológicas em horários mais favoráveis, através de múltiplos fotorreceptores que permitem às plantas monitorar mudanças na irradiação e na qualidade da luz. Já os invertebrados possuem neurônios laterais que são sincronizados pela captação de luz por fotopigmentos, mas também pelo menos indiretamente pela entrada de luz por fotorreceptores visuais. Os vertebrados possuem um sistema nervoso central complexo, que dependente da captação de luz por fotorreceptores e da resposta ao ambiente fótico pelo sistema nervoso central. Para os seres vivos, é geralmente vantajoso permitir-se entrar em estado de dormência durante períodos em que as condições ambientais não estão favoráveis, principalmente no que se refere à falta de alimentos. Caramujos terrestres como os dos gêneros Helix e Otala tornam-se dormentes durante longos períodos de umidade baixa (RANDALL et al., 2000).Outro tipo de dormência é a hibernação e é comum em mamíferos. Um exemplo é a espécie Marmota marmota, que passa um longo período neste estado para poder estocar reservas de energia suficientes para sobreviver aos períodos em que não há alimentação.
            No Brasil, os trabalhos mais atuais sobre o tema são discutidos anualmente no Simpósio Brasileiro do Cronobiologia. O primeiro SBCrono foi realizado no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo em 1985. Na época, quatro anos após o nascimento da Cronobiologia no Brasil. Os principais estudos desenvolvidos giram em torno do ciclo vigília-sono em seres humanos. Diversos estudos analisam a influência do trabalho em trabalhadores noturnos, como por exemplo, neste trabalho desenvolvido por CAMPOS & MARTINO (2004). A Cronofarmacologia também está em alta, com o desenvolvimento de fármacos que respeitam os ritmos biológicos do organismo e da patologia, o que os torna ainda mais eficazes.  
            Como estudante de biologia, percebo que as mudanças ambientais que vem ocorrendo nos últimos anos terão impactos negativos em diversos animais. Com a falta de um limite bem estabelecido entre as estações (já que hoje se percebe verões nos meses de inverno, e invernos nos meses de verão) os relógios biológicos ficarão dessincronizados com o meio, levando a uma não reprodução, ou não hibernação nos períodos até então estabelecidos. Se isso se confirmar, é provável que fosse necessário muito tempo para uma nova adaptação, e muitos animais seriam extintos. Em relação ao ser humano, mudanças ambientais não levariam a alterações tão significativas no seu ciclo natural, porém atividades sociais que alteram o mesmo levam a uma alteração no organismo. Não é por acaso que muitas doenças modernas assolam a humanidade, como insônia, estresse e depressão.


O presente ensaio foi elaborado para a disciplina de Etologia I e baseou-se nas obras:

KOYASHIKI, R. Cronobiologia estuda a relação entre o tempo e o funcionamento da matéria viva. Jornal da UEM, Maringá. 2006. Disponível em:

MOURA, L. N.; SILVA, M. L. da. Fundamentos evolutivos da ritmicidade biológica. In: ASSIS, G.; BRITO, R.; MARTIN, W. L. (Org.). Estudos do Comportamento II. Belém: EDUFPA, 2010, p. 157-176. Disponível em:

OLIVEIRA, L. H. de. A cronobiologia e os ritmos biológicos. Super Interessante, São Paulo, mar. 1989.


RANDALL, D.; BURGGREN, W.; FRENCH, K. Fisiologia animal: mecanismos e
Adaptações. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.

SOUSA, C. E. C.; CRUZ-MACHADO, S. S; TAMURA, E. K. Os ritmos circadianos e a reprodução em mamíferos. Boletim do Centro de Biologia da Reprodução. Juiz de Fora, v. 27, n. 1/2, p. 15-20, jan/dez. 2008. Disponível em:
Acesso em 30/08/2012. 

 

Um comentário:

  1. Acredito que á pessoas muito envolvidas e dedicadas á sa vida ao estudo de cronobiologia e que merecem ela e as pesquisas serem apresentadas ao mundo,com de Carolina Virginia de Azevedo da UFRN.


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