quinta-feira, 5 de março de 2015

Compartilho, Logo existo!



Por Marta Luciane Fischer
Docente do Programa de Pós-Graduação em Bioética PUCPR



Nas últimas semanas todas as redes sociais e as demais mídias têm se referido ao caso “de que cor é esse vestido?” Incluindo o telejornal de maior repercussão nacional cujos apresentadores discutiam ao vivo qual era a sua percepção. O caso começou com uma solicitação de ajuda postada por uma jovem escocesa no TumblrSwiked questionando se os amigos percebiam o vestido branco com dourado ou azul com preto. Devido ao efeito de uma ilusão de ótica a resposta não é unanime, o que gerou uma massiva participação - digna dos contemporâneos virais que atingem o milhões de internautas no mundo todo em poucas horas. Segundo especialista o Bevil Conway em entrevista à Wired, a percepção da cor do vestido varia com o horário do dia. Embora a cor original seja azul e preto, o cérebro percebe como branco e dourado, uma vez que visa descontar o viés cromático do eixo da luz, uma vez que a luz muda de cor ao longo do dia - sendo rosada ao amanhecer, azul e branco ao meio dia e avermelhada no pôr do sol.  
 Para mim o mais interessante de todo esse movimento não é a surpresa com o efeito natural, como o ser humano não tem controle de suas percepções e pode ser enganado pelo seu próprio cérebro – os quais são pontos que dariam uma ampla discussão -  mas a memética por traz da questão. Participar, opinar, compartilhar e reconhecer o assunto quando levantado na TV, na rádio, nas postagens, nas conversas...   O evolucionista Richard Dawkins introduziu a terminologia memes para fragmentos de pensamentos que são transmitidos entre as pessoas – tal como vírus – e que ao se estabelecerem em um determinado número de mentes – são perpetuados por gerações dando origem à cultura. Esse tema é estudado pela original sociobiologia e atual psicológica evolucionista. Com a consolidação e ampliação da internet e das redes sociais a propagação viral foi muito mais eficiente, transformando-se em uma verdadeira pandemia mimética: Milhões de infectados em segundos! E o que representa esse fenômeno? Quando a pessoa identifica o meme sente-se inserida socialmente e isso traz uma sensação de pertencimento – uma das sensações mais desejadas pelos animais sociais – e um norteador das buscas existenciais de um cérebro que tem uma autonomia maior do que desejávamos.  A linguagem simbólica nos diferencia dos nossos próximos irmãos animais, uma vez que nos permite conceituar objetos reais e questões subjetivas – as “ideias” formadas por junções de símbolos são como elementos que permeiam as mentes – conectando-se e desconectando-se – quando um novo conceito “entra” na mente ele procura outros similares para ver um sentido naquilo que se conceitua. Esses fragmentos de “ideias” ou memes é que nos dão a compreensão do que somos e do que os outros são. Assim ao propagar um meme cria-se uma conexão. Contudo, vejo que o fenômeno proporcionado pela impiedosa internet traz a sensação de conexão de uma forma estrondosa, mas digamos, um tanto “artificial”, parece-me que faltam outros elementos. Então, assim como a intensidade é imensa, a duração é terrivelmente curta. Obrigando ao indivíduo estar atento ao que acontece naquele momento! Pois se ele não compreende o que se diz por estar à parte do meme, é excluído ou se sente excluído do grupo e se passa a compartilhar logo após o momento do clímax, é taxado de chato e desatualizado. Uau novos softwares em hardwares antigos... e assim segue a humanidade com seu paradoxo existencial: como rodar uma mente tão moderna em um corpinho de 100.000 anos?

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